13/06/2023
Ricardo Valverde (Agência Fiocruz de Notícias)
A Fiocruz e o Instituto Nacional de Câncer (Inca) assinaram, nesta terça-feira (13/6), no 8° Fórum Big Data em Oncologia, um acordo de cooperação técnica visando desenvolver novos produtos e incorporar tecnologias que facilitem o tratamento do câncer e diminuam os custos para o Sistema Único de Saúde (SUS). É uma parceria inédita reunindo duas instituições de ponta do sistema público de saúde. O 8° Fórum Big Data em Oncologia foi promovido pelo movimento Todos Juntos Contra o Câncer (TJCC) e pelo Observatório de Oncologia, em parceria com o Centro de Estudos Estratégicos (CEE/Fiocruz).
Também no Fórum foi divulgado o estudo Quanto custa o câncer?, desenvolvido pelo Observatório de Oncologia e pelo TJCC. Outro destaque do evento foi o lançamento, em uma parceria da Fiocruz com a empresa farmacêutica francesa Servier, da segunda edição de um prêmio internacional que visa estimular projetos para o desenvolvimento de terapias inovadoras para pacientes com câncer. O evento contou com painéis em que foram discutidos o acesso dos pacientes e os custos para o SUS.
O vice-presidente de Produção e Inovação da Fiocruz, Marco Aurélio Krieger, lembra que, enquanto produtora de insumos, a Fiocruz procura atender algumas demandas importantes do SUS que estão relacionadas às doenças crônico-degenerativas, notadamente o câncer, que cada vez causam mais impactos ao sistema de saúde, função que impulsionou o acordo com o Inca. “A parceria com o Inca favorece uma interação importante entre os pesquisadores das duas instituições. O acordo prevê desdobramentos do ponto de vista do diagnóstico, da saúde pública de precisão, do uso das ferramentas de sequenciamento genômico para identificar as melhores alternativas terapêuticas e ainda o desenvolvimento de novas terapias, quer seja por produtos biológicos ou sintéticos ou ainda as mais avançadas tecnologias, que têm grande potencial de uso contra o câncer e estão chegando ao Brasil”, afirma Krieger.
“A parceria com o Inca favorece uma interação importante entre os pesquisadores das duas instituições", destaca Krieger (foto: Peter Ilicciev)
Entre as terapias avançadas, Krieger destaca como mais promissoras aquelas baseadas no conceito da imuno-oncologia, quer seja na utilização de anticorpos monoclonais, que possam potencializar a resposta imunológica para reconhecer células malignas, ou em metodologias que programam o sistema imunológico para reconhecer os marcadores associados ao câncer e assim destruir essas células. Isso pode ser feito pela indução da expressão dos receptores que vão reconhecer os marcadores cancerígenos nas células de defesa.
Para o coordenador de Pesquisa e Inovação do Inca, João Viola, a cooperação entre a Fiocruz e o Inca tem como objetivo principal estreitar as relações entre as duas instituições no ensino, pesquisa e inovação na área do câncer. “Estamos juntando esforços para resolução de problemas relacionados à área de oncologia, assim como no desenvolvimento de conhecimentos acerca de pontos considerados estratégicos”.
Krieger observa que a cooperação Fiocruz-Inca poderá render mais frutos para a saúde pública de precisão (foto: Peter Ilicciev)
Na prática a parceria vai funcionar por meio de grupos de pesquisa específicos, com pesquisadores da Fiocruz e do Inca, que vão trabalhar na validação e desenvolvimento de novas ferramentas, para a área de medicamentos, de diagnóstico e de biológicos e terapias avançadas. O vice-presidente ressalta que o Ministério da Saúde apoia fortemente a parceria. “Vamos atuar em várias frentes, desde a produção de formulações para o público infantil, que hoje é uma área carente, já que nos hospitais esses medicamentos têm que ser fracionados, acarretando perdas, até a fronteira das novas tecnologias internacionais”.
Para Krieger, o 8° Fórum Big Data em Oncologia é um divisor de águas. “Vamos solidificar um movimento da Fiocruz de dar maior atenção às doenças crônico-degenerativas, estabelecendo um novo patamar na área ao associar diferentes grupos de pesquisa da instituição com atores externos”. O Fórum teve por objetivo organizar informações, dar visibilidade aos achados e fomentar a discussão sobre a aplicação dos dados no planejamento, elaboração e monitoramento das políticas de atenção oncológica. Dois pesquisadores-associados do Centro de Estudos Estratégicos (CEE) da Fiocruz, o ex-ministro da Saúde José Temporão, e o ex-diretor do Inca Luiz Antonio Santini, participaram do Fórum e fizeram parte de painéis.
Estudo avalia os custos
Coordenadora de Pesquisa da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale), Nina Melo apresentou o estudo Quanto custa o câncer?. Tendo como base os gastos federais, não incluindo números estaduais, municipais, filantrópicos e privados, a pesquisa mostra que as despesas executadas na área de saúde, em 2022, passaram de R$ 136 bilhões. Deste total, mais de R$ 62 bilhões foram gastos em assistência hospitalar e ambulatorial e quase R$ 4 bilhões em tratamento oncológico. Estes R$ 4 bilhões se dividem em tratamento ambulatorial (77%), cirurgias (13%) e internações (10%).
De acordo com Nina, houve um aumento de 402%, de 2018 a 2022, no custo médio dos procedimentos de tratamento do câncer (quimioterapia, radioterapia e imunoterapia). Um procedimento que em 2018 custava R$ 151,33 subiu passou para R$ 758,93 em 2022. O custo médio com internação chegou a R$ 1.082,22 e o gasto com cirurgia alcançou R$ 3.406,07.
Essas são médias gerais para o quadro nacional. Por isso mesmo, há regiões em que esses números aparecerem maiores. No Norte, os procedimentos ambulatoriais chegam a custar R$ 967,06. E no Nordeste estão os maiores valores no que diz respeito à internação (R$ 1.211,83) e à cirurgia (R$ 3.805,70).
Nina Melo, apresentou o estudo 'Quanto custa o câncer?' (foto: Peter Ilicciev)
“O estadiamento, o processo para determinar a localização e a extensão do câncer presente no corpo de uma pessoa, quando se dá em período avançado, pode ser um motivos que justificam o aumento do custo do tratamento, já que diagnósticos precoces estão relacionados a uma maior chance de cura e a um tratamento menos agressivo”, pondera Nina.
Um tratamento ambulatorial com quimioterapia em um caso de câncer de mama, por exemplo, que custa R$ 134,17 em um período inicial do cuidado, quando se percebe o início do tumor sem comprometimento linfático, sobe para R$ 223,84 quando se espalha no tecido inicial ou em mais de um tecido com comprometimento do sistema linfático. Em outro nível, quando já é considerado “localmente avançado”, o tumor é ligeiramente maior e/ou se espalhou para áreas próximas ou para mais gânglios linfáticos, esse valor com a quimioterapia chega a R$ 401,54. E alcança os R$ R$ 809,56 quando considerado “avançado” com o câncer se espalhando para outros órgãos ou todo o corpo (metástase). No caso do câncer colorretal, no tratamento hospitalar o custo com internação fica em R$ 924,33. O de UTI, a R$ 3.079,41 e a cirurgia a R$ 6.533,25.
Além dos dois tipos de câncer citados, Nina apresentou ainda custos em relação a tumores na próstata e no pulmão. Segundo ela, “o aumento nos custos no tratamento também pode estar relacionado aos medicamentos que foram incorporados no SUS, como alguns imunoterápicos e ao uso cada vez maior de novas tecnologias disponíveis”.
“Saber quanto custa todo o tratamento oncológico é crucial para entendermos como melhor aplicar os recursos públicos com maior eficiência e como melhor direcionar as políticas de prevenção e controle da doença”, observa a CEO da Abrale e conselheira estratégica do TJCC, a médica sanitarista Catherine Moura.
“A importância de apresentar os gastos realizados pelo SUS para o tratamento de alguns tipos mais frequentes de câncer é não somente mostrar o impacto econômico do problema, como, sobretudo, identificar oportunidades e rotas de pesquisa para garantir acesso a diagnóstico, tratamento e prevenção”, avalia o médico e pesquisador Luiz Santini, do CEE/Fiocruz, que coordena, junto com o pesquisador José Gomes Temporão, o projeto de pesquisa Doenças Crônicas e Tecnologias de Saúde,.
Prêmio Internacional Fiocruz/Servier
O Prêmio Internacional Fiocruz/Servier vai destinar 150 mil euros (cerca de R$ 840 mil) para três projetos de pesquisa para o tratamento do câncer. O valor será destinado aos projetos selecionados para colaborar com o seu desenvolvimento ao longo de dois anos. A Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC) e o Inca farão parte do processo de seleção dos vencedores.
O presidente da Servier do Brasil, Mathieu Fitoussi, destaca a importância de ampliar e aprofundar os projetos. “A cooperação entre a Fiocruz e a Servier é especial. Há vários pontos de conexão entre as instituições. São duas fundações comprometidas com a melhoria da assistência médica e com a excelência em pesquisa”.
“É uma parceria histórica que envolve transferência de tecnologia bem sucedida de medicamento com Farmanguinhos. Também estamos discutindo um conjunto de iniciativas de inovação aberta e temos ainda projetos em câncer com a Servier”, adianta o vice-presidente da Fiocruz Marco Aurélio Krieger.
A chamada e o regulamento estarão disponíveis a partir desta quarta-feira (14/6), nos sites da Fiocruz, da Servier e da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica.
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