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Curso no IFF aborda a violência contra crianças e adolescentes

Rachel Niskier

21/05/2019

Por: Everton Lima (IFF/Fiocruz)

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O 19º curso de violência contra crianças e adolescentes - A intersetorialidade na prevenção e no atendimento, teve a sua abertura na segunda-feira (6/5), no Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz). Coordenado pela pediatra e coordenadora do Núcleo de Apoio aos Profissionais que atendem crianças e adolescentes vítimas de maus-tratos (NAP-IFF), Rachel Niskier, o curso tem como objetivo informar profissionais de saúde e áreas afins na identificação de situações de vulnerabilidade e seus encaminhamentos. “São 19 anos de muita luta e esperança. Precisamos de multiplicadores!”, declarou.

Saudando os presentes, o gestor da área de Atenção Clínica à Criança e ao Adolescente do IFF/Fiocruz e diretor do Centro de Estudos Olinto de Oliveira (CEOO), Antônio Flávio Meirelles, falou que o tema abordado está infelizmente cada vez mais cotidiano e banalizado. “Esse curso nos orgulha muito, é uma tradição que se construiu em prol da qualificação dos profissionais de saúde. O respeito aos direitos das pessoas tem diminuído e, com isso, a questão da violência nunca esteve tão em alta. Fazer esse curso faz parte da missão do Instituto de fortalecer o Sistema Único de Saúde (SUS)”. 

A seguir, o diretor do IFF/Fiocruz, Fábio Russomano, registrou o desafio de transformar o curso em uma modalidade que possa alcançar públicos de outros estados e países. "O Ensino a Distância (EaD) é uma modalidade que permite a participação de profissionais de todos os países de língua portuguesa. Como referência, temos que contribuir para a formação e capacitação das equipes, para a disseminação de uma cultura de reconhecimento e de ação preventiva de situações de violência. De qualquer forma, estamos sempre de portas abertas e preocupados em aperfeiçoar a nossa contribuição à sociedade na promoção da saúde da mulher, da criança e do adolescente", alegou ele.

Na sequência, a professora e pesquisadora do IFF/Fiocruz, Suely Ferreira Deslandes, apresentou o tema Violências: Uma análise crítico-reflexiva, considerando como um assunto necessário e essencial para a formação de qualquer profissional de saúde, principalmente os da assistência social e educação. “É um dever e prazer contribuir com os profissionais da rede, que atuam diretamente com as famílias e pessoas em situações de violência. Acreditamos que essa formação vai desde uma esfera de reflexão teórica sobre o que é violência, que tipos de violências temos que lidar, saber identificar e atuar, contando com a rede. É um grande desafio!”.

Suely explicou que do ponto de vista sociológico, a violência é um fenômeno, uma consequência de um modo de agir e de construir uma sociedade, e não pode ser tratada isoladamente. Antigamente, muitas práticas não eram enxergadas como violência, mas, hoje, olhamos aquelas mesmas práticas e as consideramos como inaceitáveis e violentas. Essa mudança de sensibilidade social é diretamente fruto de um processo histórico de reconhecimento dos direitos das pessoas e da cidadania. “Precisamos respeitar os direitos das pessoas e as diferenças, saber conviver com pessoas diversas”, afirmou.

A professora analisou que ao mesmo tempo em que há um avanço da permissão da violência, a sociedade também produz as resistências, os mecanismos de enfrentamento dessas posturas, e a decisão de aceitar ou não atos violentos vai dizer que sociedade nós temos. “Violência é uma intenção proposital de dominar, ferir e humilhar. No caso de crianças e adolescentes, temos a violência provocada por omissão, pois, por exemplo, uma criança de dois anos não tem autonomia para ficar sozinha em casa. Uma violência contra um menor afeta o crescimento, desenvolvimento e o potencial da criança, então precisamos identificar e fazer um trabalho de negociação, didático, mas devemos analisar o limite entre a violência e a falta absoluta de recursos”, ponderou ela

Apresentando as estatísticas, Suely comentou que somos um país muito violento e expôs os dados do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (Datasus). Em 2016, foram 98.599 notificações de violências contra crianças e adolescentes feitas pelos serviços de saúde, sendo 36.155 (36%) contra crianças de 0 a 9 anos. “Todas essas pessoas chegaram ao serviço de saúde e tiveram a sua situação notificada. Imagina quantas milhares não chegaram ou tiveram sua situação identificada e registrada”, lamentou. A professora complementou com o Atlas da Violência, também de 2016, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em que mostra a assustadora taxa de homicídios de jovens, assassinados, em média, a partir dos 14 anos, principalmente nos estados de Sergipe, Rio Grande do Norte e Alagoas.

Encerrando sua palestra, Suely acredita que a solução é atuar na prevenção de violências, na promoção de uma cultura de paz, na educação e no enfrentamento das desigualdades sociais, com respeito e inclusão. “Se não trabalharmos no enfrentamento das causas, como racismo e desigualdade de gênero, as consequências, que são as manifestações de violência, vão continuar existindo”, concluiu.

Histórico resumido da violência na agenda da saúde

Até a década de 1980, a violência era vista como um problema social e não da área da saúde. A mudança veio em 1987 quando, pela primeira vez, as causas externas (acidentes e violência) passaram da sexta para a segunda maior causa de morte no Brasil, levando o tema para a agenda da saúde. Somente na década de 1990 que a Organização Mundial da Saúde (OMS), através da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), reconheceu a violência como uma questão de saúde pública e promoveu a criação de serviços, ações e campanhas para o seu enfrentamento.

Após muitas iniciativas e projetos, os anos 2000 marcaram o início de um conjunto de políticas públicas de saúde. Como o atendimento à violência requer alto custo, a estratégia, desde então, foi investir na capacitação dos profissionais, no enfrentamento e, sobretudo, no cuidado das pessoas em situação de violência, especialmente crianças, mulheres e idosos. “Todavia, ainda falta investir em programas e projetos voltados para os adolescentes, que são os mais vulneráveis das violências letais”, ressaltou a professora.

Confira a programação do 19º curso de violência contra crianças e adolescentes - A intersetorialidade na prevenção e no atendimento, que acontece até o final de maio no IFF/Fiocruz.

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