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Crianças com Síndrome Congênita do Zika têm riscos maiores de hospitalizações


22/01/2025

Victória Alvineiro (Cidacs/Fiocruz Bahia)

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A primeira geração de crianças afetada com o surto de microcefalia, em 2015, hoje tem cerca de dez anos de idade. Apenas uma minoria dessas crianças sobreviveu ao primeiro ano de vida. Por trás da condição que determina a vida de tantas crianças brasileiras está o conjunto de sequelas da Síndrome Congênita do Zika (SCZ), doença que compromete o tamanho da cabeça e a formação de neurônios. São eles que estão mais vulneráveis a complicações graves, doenças combinadas e períodos de internação longos, segundo pesquisa do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia), publicada no International Journal of Infectious Disease.

Por se manifestar de maneira mais expressiva em países pobres e em populações desiguais, a síndrome do zika recebe baixa atenção a nível mundial. Somente no Brasil, a doença acumula 20 mil casos suspeitos. Uma parte deles tem identidade comum: são filhos de mães que moram em regiões quentes e com alta circulação de mosquitos. Já que a infecção ocorre durante a gravidez pelo vírus zika, transmitido às mulheres grávidas pelo mesmo vetor da dengue, o Aedes aegypti

Médico e líder do estudo, João Guilherme Tedde afirma que a pesquisa é uma das primeiras a avaliar os riscos de hospitalização em pacientes com SCZ ao longo da primeira infância. “Analisamos as principais causas e a frequência das internações, assim como a duração dos períodos hospitalares, para orientar decisões mais eficazes no tratamento das crianças afetadas pela síndrome”, explica.

O estudo comparou 2 mil casos de crianças com SCZ com quase 2,6 milhões de casos de crianças sem a síndrome. A equipe de pesquisadores avaliou as taxas de admissões, seus principais motivos e a duração das hospitalizações durante os primeiros quatro anos de vida. Investigação que foi possível graças a utilização dos dados da Coorte de 100 Milhões de Brasileiros.

Síndrome agrava hospitalização

A principal conclusão do estudo indica que crianças com SCZ apresentaram taxas de hospitalização entre 3 e 7 vezes maiores do que crianças sem a síndrome. E, além de irem muito mais ao hospital, os pequenos com a síndrome ficaram internados por períodos extensivamente mais longos em comparação às crianças sem a síndrome nos primeiros quatro anos de vida. No grupo com SCZ, as hospitalizações ocorreram em razão de malformações congênitas, doenças neurológicas e causas respiratórias e infecciosas.

“Esses pacientes enfrentam uma carga de morbidade mais alta do que aqueles sem SCZ”, conta Tedde. Isso quer dizer que as crianças portadoras da síndrome são hospitalizadas com maior frequência, enfrentando períodos de internação demorados e correndo risco de doenças combinadas. “Além das condições típicas da idade, como infecções e doenças respiratórias, essas crianças apresentam complicações diretamente relacionadas à SCZ” afirma Tedde, concluindo que cada condição pode atuar como um fator de risco para a outra, em uma espécie de círculo vicioso.

Outro achado importante demonstra que enquanto as crianças sem SCZ diminuíram suas taxas de hospitalização de forma progressiva ao longo do tempo, crianças que têm a síndrome mantiveram altas taxas durante todo o período avaliado. Isso significa que portadores da SCZ estão sob risco prolongado de adoecerem e serem hospitalizados, agravando condições de saúde já existentes, elevando custos e gerando sofrimento adicional às crianças e à sua rede de apoio.

País desigual, saúde desigual

O Nordeste é a região do país que concentra o maior número de casos de crianças com SCZ. A síndrome tem endereço nas famílias com baixa renda, muitas vezes dependentes do Sistema Único de Saúde (SUS) e de programas de transferência de renda condicionada. Mas, quanto custa cuidar de um filho com SCZ?

“Cerca de 30% das famílias de crianças com SCZ relataram despesas com cuidados que ultrapassaram 40% de sua renda anual”, afirma Tedde, autor da pesquisa. Além do custo financeiro ser desproporcional à renda de muitas casas, a síndrome traz um custo emocional imensurável às famílias.

“Nossos achados apontam para a urgência de elaborar planos de cuidado estruturados, com foco no manejo ambulatorial das crianças com SCZ. O objetivo deve ser otimizar as condições de saúde de base e minimizar os riscos de intercorrências que levem a novas internações.”, reforça Tedde.

Além desse estudo, resultados preliminares de outra pesquisa da mesma equipe apontaram que, para as crianças com a Síndrome, o risco de morte é 30 vezes maior para doenças do sistema respiratório, 28 vezes maior para doenças infecciosas, e 57 vezes maior para doenças do sistema nervoso.

Entre os desafios próximos, os autores percebem a urgência do desenvolvimento de uma vacina que ofereça imunidade duradoura contra o vírus zika. Objetivo que só será alcançado se a sociedade permanecer de olhos abertos para esta questão.

A pesquisa contou com pesquisadores da London School of Hygiene & Tropical Medicine (LSHTM), do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (ISC/UFBA) e de demais universidades parceiras do Cidacs/Fiocruz Bahia.

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