19/11/2024
Ariene Rodrigues (Observatório de Clima e Saúde, Icict/ Fiocruz)
Em estudo sobre mortes relacionadas ao calor em áreas urbanas do Brasil, pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), do Observatório de Clima e Saúde da Fiocruz e da Universidade de Lisboa mostraram que o aumento da mortalidade é maior entre pessoas pretas e pardas do que entre brancas. “Ainda há alguns pesquisadores que questionam o racismo ambiental, mas nós já temos evidências de que, sim, as populações mais vulneráveis são as mais impactadas pelas mudanças climáticas”, relata a coordenadora do Observatório de Clima e Saúde e colaboradora do estudo, Renata Gracie.
Publicada no início deste ano revista PLoS ONe, a pesquisa Twenty-first-century demographic and social inequalities of heat-related deaths in Brazilian urban areas (Desigualdades demográficas e sociais das mortes relacionadas ao calor em áreas urbanas brasileiras no século 21, em tradução livre) analisou dados entre 2000 e 2018 e identificou que esse padrão se manteve em todas as 14 Regiões Metropolitanas estudadas, área que concentra 35% da população atual do país. Nas regiões de Belém, Recife, Brasília, e São Paulo, o índice de mortalidade para pessoas pretas e pardas com 65 anos ou mais (1,33 - 2,30) foi estatisticamente superior ao das pessoas brancas (1,16 -1,44).
As ondas de calor é um tipo de evento resultante das mudanças climáticas. Difíceis de detectar, especialmente no Brasil e na América Latina, uma vez que não há tradição nesse tipo de estudo, elas podem causar grandes estragos. Europa e Japão registraram muitas mortes em 2003, período de intensas ondas de calor. Desde então, esses países realizam esse tipo de monitoramento. “A importância desse estudo é que, pela primeira vez, nós conseguimos fazer a delimitação dos períodos de ondas de calor nas regiões metropolitanas brasileiras”, menciona a pesquisadora. Além do contexto racial, foi observado o aumento das mortes relacionadas ao calor para pessoas com baixo nível educacional, idosos e mulheres.
Esse conhecimento é essencial, principalmente para a população negra. Em um país onde negros e pardos são os que mais frequentemente vivem sem acesso adequado a serviços essenciais, como saneamento, segurança e moradia digna, as mudanças climáticas, somadas à injustiça social e ao racismo ambiental, aumentam ainda mais a vulnerabilidade dessa população aos riscos ambientais.
Para os pesquisadores, diante da intensificação das ondas de calor, é necessário articular o fortalecimento da atenção primária à saúde com a redução das desigualdades socioeconômicas, raciais e de gênero para mudar esse cenário de mortalidade.