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XIII Encontro do Fio-Chagas (Pidc) discutiu políticas de assistência e avanços nas pesquisas

Mesa de abertura do evento Fio-chagas com a presença do vice-presidente da Fiocruz, Rodrigo Stabeli

07/06/2016

Por Flávia Rianelli

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O XIII Encontro Anual do Programa de Pesquisa Translacional de Doença de Chagas – Fio-Chagas (Pidc) aconteceu entre os dias 23 e 25 de maio de 2016, no auditório térreo da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), em Manguinhos, no Rio de Janeiro.

O evento contou com a participação de pesquisadores da Fiocruz e de outras instituições nacionais e internacionais, que apresentaram as novas ferramentas para o manejo e cuidado de pacientes com doença de Chagas.

 A proposta do encontro foi promover a discussão de políticas de assistência e qualidade de vida do paciente, buscando estreitar a interação da comunidade científica com os portadores da doença. Também foram discutidos e divulgados os avanços obtidos nas pesquisas realizadas e as propostas de novos projetos em cada rede temática.

O Programa de Pesquisa Translacional em Doenças de Chagas – Fio-Chagas (Pidc) tem o suporte da Vice-Presidência de Pesquisa e Laboratórios de Referência (VPPLR) e estimula a composição de equipes inter-laboratoriais, inter-unidades e inter-institucionais. Sua proposta é promover a articulação de grupos de pesquisa nas áreas biomédica, clínica, desenvolvimento tecnológico e saúde coletiva em torno de projetos que atendam a questões críticas para o controle da doença de Chagas e a melhora da qualidade de vida dos pacientes. ?

Mesa de abertura

A abertura do evento contou com as boas vindas do vice-presidente de Pesquisa e Laboratórios de Referência da Fiocruz, Rodrigo Stabeli, que explicou a reformulação do programa e a sua inserção no Sistema Único de Saúde:

 “A reformulação do programa não faria sentido se a gente não tivesse inserção desta comunidade no Sistema Único de Saúde. Estas respostas estão vindo muito rápidas do ponto de vista dos programas já instalados como o Fio-Chagas e Fio-Schisto. A Rede Câncer também começa a formular propostas na atual conjuntura nacional. Não adianta querer fazer o programa mais bonito do mundo sem olhar a situação política e econômica que estamos passando no país. Vamos brigar para ter a nossa saúde pública como direito e dever do estado”, afirmou Stabeli.

Coordenadora do Programa Fio-Chagas e pesquisadora titular do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), Marli Lima declarou que o encontro seria bastante produtivo pelo fato de o evento acontecer na Fiocruz, podendo agregar mais os estudantes da Instituição, ligados a doenças de Chagas e outras áreas. Coordenador do Fio-Chagas e tecnologista em Saúde Pública do Instituto Nacional de Infectologia (INI/Fiocruz) disse esperar que o encontro viabilizasse novas alternativas para facilitar a vida do paciente com Chagas, unindo esforços num momento tão complicado que o país atravessa.

Coordenador do Fio-Chagas e pesquisador do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), Rubem Barreto apresentou os temas e a composição de cada mesa da programação do evento e afirmou que a ideia do encontro deste ano estaria voltada para discussão, aliando as políticas institucionais da Fiocruz com as políticas junto ao SUS.

Coordenador dos Programas de Pesquisa Translacionais da VPPLR, Wim Degrave destacou a importância de se fazer uma reflexão da doença de Chagas no país, com vistas aos planos e atividades da Rede. O coordenador da VPPLR também falou sobre o financiamento dos onze Programas Translacionais, esclarecendo que, após o primeiro semestre, precisaria reunir o grupo de pesquisas dessas áreas para planejar as ações integradas e ressaltou a importância do grupo se debruçar nas prioridades mais importantes onde se contemplasse recursos imediatos, verificando as áreas de maior possibilidade em alavancar com outras fontes.

 

Mesas de discussão

A metodologia do XIII Encontro Anual de Fio-Chagas contou com a formação de mesas consideradas relevantes para discussão dos seguintes temas: A situação da doença de Chagas; Estado da arte da pesquisa clínica em Chagas; Biomarcadores e vacinas: perspectivas e limitações; Novas perspectivas da parceria público-privada; Controle de vetores e parasitos; Discussão sobre a inserção do Fio-Chagas nas políticas do SUS; Atenção integral ao paciente com doença de Chagas e qualidade de vida.

Após as apresentações e debates das mesas aconteceu a formulação de propostas de interação entre as redes e a proposição de novos projetos. A Assembleia Geral precedeu o evento de encerramento. Confira abaixo os principais pontos em discussão durante o encontro:

Mesa 1: A situação da doença de Chagas

Pesquisador da Fiocruz Minas, João Carlos Pinto Dias falou sobre a situação da Doença de Chagas, listando os temas sugeridos para discussão, entre eles: a situação da doença de Chagas no Brasil e na América do Sul e suas particularidades. Pesquisador do IOC/Fiocruz, José Rodrigues Coura afirmou ser muito difícil erradicar a Doença de Chagas no país e informou que a doença é um problema mundial.

Pesquisadora do IOC/Fiocruz, Ana Maria Jansen expôs as principais descobertas feitas na instituição. “O novo quebra-cabeças que se configura na epidemiologia da doença de Chagas, deve ser resolvido, principalmente, com o apoio desta casa, integralmente em colaboração entre todas as instâncias da federação. Isso, é um trabalho multidisciplinar, de colaboração e de parceria. Defino isso como translacional”, disse.

Pesquisador da Universidade Central da Venezuela, Oscar Noya trouxe sua visão demográfica, epidemiológica e ecológica da doença. “Penso que neste momento nós estamos sendo testemunhas de uma grande mudança na epidemiologia da doença de Chagas. Essas grandes mudanças são principalmente por causa demográfica”. Oscar Noya mencionou que a Venezuela teve o maior programa de controle de doença de Chagas por notificações no mundo, sendo a área rural da Venezuela muito beneficiada.

Coordenador de Vigilância das Doenças Transmitidas por Vetores Antropozoonoses do Ministério da Saúde, Renato Vieira Alves afirmou que esses espaços de discussão são fundamentais para compartilhar dados e as diversas posições a respeito dos temas apresentados. Renato Vieira Alves acredita não haver muita mudança no cenário, sendo necessária uma vigilância bem organizada de informações, com vistas à obtenção de um diagnóstico correto da situação.

Mesa 2: Estado da arte da pesquisa clínica em Chagas

Pesquisador do Instituto Nacional de Infectologia (INI/Fiocruz), Pedro Brasil iniciou os debates indagando aos colegas qual seria a fronteira atual para aperfeiçoar ou melhorar o acesso e qual seria a experiência obtida de cada um em relação ao diagnóstico da doença de Chagas. Pesquisadora do Drugs for Neglected Diseases initiative (DNDi), Bethânia Blum afirmou que o grande desafio seria encontrar um desfecho, num período de uma pesquisa, que fosse realmente preditivo de melhoria clínica.

Representando o Médico sem Fronteiras (MSF), Juan Cubides afirmou que o MSF não é uma instituição de pesquisa, mas sim de prestação de serviços de saúde. No caso de Chagas, a instituição trabalha há 17 anos em 4 linhas de investigação sobre a doença. Na parte de diagnóstico fizeram parceria com o Instituto Pasteur e com a Organização Mundial da Saúde (OMS) num estudo onde se avaliou a sensibilidade, especificidade e reprodução de onze testes de diagnóstico. Pesquisador do INI/Fiocruz, Roberto Saraiva afirmou ter feito um trabalho junto com o MSF referente a diagnóstico, dizendo ser muito importante para pesquisa clínica o conhecimento sobre a população.

Mesa 3: Biomarcadores e vacinas: perspectivas e limitações

Pesquisador do IOC/Fiocruz, Otacílio Moreira solicitou aos participantes da mesa a discussão de tópicos relacionados a avanços diagnósticos, situações de diagnósticos sorológicos, kits comerciais, aplicações e avanços de diagnóstico molecular, carga parasitária, avanços em vacinas, avanços em biomarcadores e os primeiros resultados que estão obtendo de carga parasitária em pacientes crônicos em diferentes localidades.

Pesquisador da University of Texas (EUA), Igor de Almeida agradeceu a coordenação do Programa Fio-Chagas pelo convite afirmando que a universidade tem dado contribuição em relação aos biomarcadores nos últimos anos. Igor de Almeida esclareceu que não havia falta de antígenos bons para diagnóstico para Chagas, vendo como real problema a falta de uso destes antígenos na clínica.

Pesquisadora do IOC/Fiocruz, Joseli Lannes afirmou que o grande problema seria trabalhar com um cenário de pesquisas de vinte anos atrás. Atualmente não se considera a diversidade de cepas, nem a diversidade geográfica. Com relação aos biomarcadores, Joseli Lannes afirmou ser necessário foco nos desfechos para a doença cardíaca. Otacílio Moreira esclareceu as questões levantadas e afirmou a necessidade de padronização da PCR para a popularização ainda maior da técnica. Segundo ele, seria preciso uma mudança em Bio-Manguinhos, a fim de produzir um kit molecular para PCR quantitativo de fácil utilização.

Mesa 4: Novas perspectivas de parceria público-privada

Assessor da Vice-Presidência de Produção e Inovação em Saúde (VPPIS/Fiocruz), Jorge Costa expôs que hoje o Brasil possui um parque farmacêutico bastante consolidado, mas que carece da produção de insumos farmacêuticos ativos. Disse ainda que o Brasil produz cerca de 15% dos fármacos que são utilizados nos medicamentos que circulam no país. Através desse quadro, Farmanguinhos começou em 2006, aproximadamente, a desenvolver e produzir medicamentos. A partir dessa iniciativa o Ministério da Saúde aprimorou e criou as parcerias para o desenvolvimento produtivo. Jorge Costa frisou a importância dessas parcerias, permitindo que os laboratórios oficiais incorporassem tecnologias que eles são capazes de desenvolver, mas que provavelmente se levaria muito tempo.

Integrante do Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde (CDTS), Renata Curi esclareceu seu papel na unidade de trabalhar especialmente com parcerias. Afirmou que procura fazer uma aproximação com outros entes públicos, entes privados, organizações nacionais e internacionais com ou sem fins lucrativos no sentido de alavancar inovação, o desenvolvimento de produtos e serviços que atendam da melhor forma a determinada demanda, especialmente do SUS, mas não restrito ao SUS. Renata Curi disse entender que esse é o momento da Fiocruz de enfrentar a necessidade de criar uma política, detalhando quais os critérios para se estabelecer parcerias com uma empresa privada e que tipo de inovação se pretende e quais são os processos e etapas, além da regulamentação desse assunto.

Assessor da VPPLR, Wim Degrave declarou que a Fiocruz precisa fazer um debate aberto com todos os atores envolvidos, sobre o que se quer de inovação, onde se quer chegar e quais os modelos. “Por causa de ideologias perdemos muito mais e tempo e possibilidades de desenvolver coisas interessantes para pacientes”. Wim Degrave afirmou que a iniciativa privada tem objetivos e estruturas diferentes dos entes públicos. “É importante a gente criar um fluxo recomendado de operação para esse tipo de coisa”, finalizou o Coordenador dos Programas de Pesquisa Translacionais da Fiocruz.

Mesa 5: Controle de vetores e parasitos

Pesquisador da Fiocruz Bahia, Marcos André Vannier foi o mediador dos trabalhos. Pesquisadora do IOC/Fiocruz, Maria de Nazaré Soeiro apresentou alguns pontos relacionados às discussões entre a relação público-privada e a questão do atendimento ao paciente. Falou sobre os recentes avanços que tiveram, gerados para os ensaios clínicos. “Os ensaios clínicos trouxeram uma reflexão para reavaliar o que se tem hoje de modelos experimentais. ”

Maria de Nazaré Soeiro também afirmou que os estudos clínicos não só favoreceram a discussão e a revalidação das novas metodologias, mas também causaram questionamento do próprio uso da droga de referência, de que forma ela poderia ser administrada, permitindo uma maior adesão dos portadores na medida em que houvesse uma menor reatividade de efeitos tóxicos ou até mesmo efeitos colaterais. A pesquisadora finalizou dizendo ser fundamental o apoio institucional para inclusão de sistema de gestão da qualidade que garantisse rastreabilidade, não bastando somente a identificação.

Pesquisador do INI/Fiocruz, Luiz Sangenis assinalou que transmissão vetorial ainda existe no Brasil, embora tenha diminuído bastante. Afirmou que o grande problema estaria na vigilância dos municípios, totalmente à parte do que está acontecendo em termos epidemiológicos. Atualmente a demanda epidemiológica nos municípios está voltada para Aedes aegypti.

Pesquisadora da Fiocruz Minas, Liléia Diotaiuti afirmou valer a pena rever o histórico do controle de vetores, principalmente a partir do processo da descentralização do sistema de saúde. “Seria preciso fazer uma reflexão profunda para o SUS funcionar, não existindo informação, a epidemiologia ficaria comprometida”, completou.

Mesa 6: Atenção integral ao paciente com doenças de Chagas e qualidade de vida

Pesquisadora da Universidade de Pernambuco, Cristina Carrazone abriu a discussão afirmando que a riqueza da mesa estaria nos vários olhares sobre o mesmo contexto e que seria preciso ouvir do paciente o que ele entende que melhoraria a sua qualidade de vida. Representante da Findechagas, Ana Maria de Arruda Camargo falou sobre algumas palavras chaves: integralidade, qualidade de vida, doença e o sujeito. Destacou o sujeito que interfere na avaliação mais objetiva e qualitativa afirmando que o sujeito busca um atendimento competente, respeitoso, com qualidade e acolhimento. Ana Maria de Arruda Camargo finalizou sua fala apresentando três recortes da doença de Chagas: a questão sócia econômica, gênero e idade.

Representante do Rio Chagas, Marcelo de Oliveira Mendes falou sobre sua experiência esclarecendo que realiza um trabalho de artes com os pacientes portadores de doenças de Chagas. Afirmou que, com esse trabalho, acaba aprendendo mais com eles do que ensinando: “Eles me ensinam a vida e eu ensino a arte”, disse Marcelo.

Pesquisadora do INI/Fiocruz, Andrea Silvestre falou sobre o trabalho que é realizado na sua unidade e as experiências com os pacientes com doenças de Chagas, explicando que é necessário pensar em promover qualidade de vida do paciente. Andrea Silvestre terminou sua apresentação fazendo um diálogo entre a assistência e a pesquisa.

Pesquisador do INI/Fiocruz, Mauro Mediano debateu a abordagem desafiadora do tema pelo fato de se colocar o paciente em foco, através da discussão da qualidade de vida do paciente, o seu contexto social e a atenção integral. Acrescentou que “não adianta apenas a gente dar anos de vida para esses pacientes. Temos que dar vida a esses anos que esses indivíduos estão ganhando”. Mauro Mediano finalizou esclarecendo que “atenção integral é muito mais do que você simplesmente ofertar diagnóstico e tratamento para todos esses indivíduos. Atenção integral é você entender esse indivíduo que tem uma doença, entender ele como um todo, entender ele dentro de um contexto. ”

Pacientes portadores da doença de Chagas, Nancy Domingas e Oswaldo Silva falaram da doença e a expectativa que eles têm em relação à vida. “Cada um tem a maneira de sofrer a doença. Tive coragem de seguir a minha vida”, afirmou Nancy Domingas. Pesquisadora do IOC/Fiocruz, Tânia Araújo encerrou os trabalhos colocando que a esperança deste processo está na educação. “O componente da educação é um componente que tem condições de revolucionar esse processo. A atitude de escuta é fundamental. Mais do que ouvir é preciso escutar com um terceiro ouvido, escutar também o subjacente à fala” concluiu Tânia Araújo.

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