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Pesquisadores elaboram política de cuidado para jovens e adolescentes

Pesquisadores sentados em roda diante de uma tela, com auxílio da qual uma pesquisadora faz sua apresentação. Sala grande, paredes brancas, janelas amplas.

08/08/2023

Eric Veiga Andriolo (Agenda Jovem Fiocruz)

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Resultado de uma parceria entre a Agenda Jovem Fiocruz e o Centro de Saúde Escola Samuel Barnsley Pessoa (CSEB) da Universidade de São Paulo (USP), oficina reuniu (31/7 e 1º/8) pesquisadores e gestores da saúde e de políticas de juventude de Recife, Rio Grande do Norte e Ceará, bem como da Secretaria de Promoção de Igualdade Racial da Bahia, para elaborar políticas de Linha de Cuidado para a Saúde na Adolescência e Juventude (LCA&J) para o Sistema Único de Saúde (SUS). O encontro teve como base a implementação da Linha de Cuidado para Jovens e Adolescentes no estado de São Paulo, com objetivo de expandir esse tipo de política pública para outros estados.

“A tarefa principal da oficina é pensar uma metodologia de prospecção, reconhecendo as particularidades locais das redes de atenção, estimulando a adaptação e a criatividade no desenho dessa proposta, que só pode ser realizada reunindo os esforços de diferentes atores: pesquisadores, gestores de políticas públicas de saúde e de juventude e os próprios jovens”, afirmou André Sobrinho, coordenador da Agenda Jovem Fiocruz.

Linha de Cuidado é uma metodologia de planejamento em saúde desenvolvida como uma estratégia do SUS para estabelecer um “percurso assistencial” ideal dos pacientes em todos os níveis de atenção. Para isso, é preciso padronizar e organizar a oferta de ações de saúde para um segmento, criando orientações, descrevendo as rotinas do paciente e criando canais de comunicação entre diferentes serviços e equipes. Essa metodologia, quando voltada para a adolescência e juventude inclui diretrizes e estratégias de operação, recomendações práticas, e indicadores de avaliação dos resultados. O objetivo é garantir o cuidado integral à saúde de adolescentes e jovens em serviços ambulatoriais do SUS, a partir de uma visão que os considera como sujeitos participantes do cuidado.

A Agenda Jovem articula a prospecção e fornece dados e subsídios para que a linha de cuidado atenda às necessidades do público jovem, composto de pessoas com entre 15 e 29 anos. Esse público é contemplado pelo Estatuto da Juventude (Lei 12.852/2013), legislação de 2013 que ainda é pouco implementada pelas políticas de saúde. Isso porque muitas dessas políticas acabam deixando de atentar para as diferenças entre adolescentes (entre 12 e 18 anos) e jovens com idades mais elevadas.

“Não é incomum uma visão homogênea do setor, que acaba por formular respostas que não se adequam a um dos públicos”, explica Sobrinho. “Em particular o setor de jovens da faixa de 20 anos em diante, uma vez que para os adolescentes já existe bastante formulação e práticas bem-sucedidas. O que não quer dizer universalizadas e no escopo de uma política integral”.

Para os jovens em faixas etárias mais elevadas, diz Sobrinho, é preciso levar em conta questões relacionadas à autonomia no exercício da sexualidade, a reprodução familiar, a inserção e as condições no mundo do trabalho e a circulação na cidade. “Em ambos os públicos, a escuta e a participação são fundamentais”, completa.

Experiências nos estados

A Linha de Cuidado para Jovens e Adolescentes (LCA&J) no estado de São Paulo foi montada pela equipe do CSEB/USP, liderada pela pesquisadora Mariana Nasser. De acordo com ela, a LCA&J foi sendo construída por etapas de pesquisa de modo participativo, através de uma metodologia que buscou pesquisadores, gestores e profissionais da saúde para entender as demandas do público jovem e adolescente. "Queríamos fazer algo que fosse útil para essas pessoas. Uma política que de fato atendesse às necessidades dos próprios adolescentes e jovens, mas também que fosse exequível pelos profissionais. Que tivesse a ver com o que o coordenador do serviço pudesse justificar, e algo compatível com a realidade dos gestores", afirmou a pesquisadora.

Um dos desafios, segundo a pesquisadora, foi romper a descrença sobre o desejo dos jovens e adolescentes de procurar serviços de saúde. Em geral, os equipamentos têm pouca presença desse público. "O jovem nao procura porque não tem uma política pública, ou um programa e atividades instaladas. Esse é o motivo", afirma Nasser. Segundo ela, foi necessário atentar a várias especificidades do público adolescente e jovem, como a preservação do sigilo entre pacientes e profissionais, e adoção de uma linguagem menos “sisuda” no atendimento.

Além disso, a ideia é pensar a saúde de forma ampliada, ou seja, como algo que vai além da cura de doenças. “a primeira coisa que o adolescente traz é a dúvida”, afirma a pesquisadora. Muitas vezes essas dúvidas têm a ver com questões como trabalho, raça, religião e vida sexual. “Esse é o primeiro momento, que seria a promoção da saúde. No segundo momento, tem a prevenção de questões como DSTs, Aids, gravidez indesejada e abuso de substâncias como álcool e drogas”.

No Recife, já existem políticas para coletar as demandas da juventude. Desde 2018 há consultas com jovens e a sociedade civil. Nesta semana ocorrerá a Conferência Municipal da Juventude, que ocorre após um processo que ouviu 300 jovens. Segundo Mariana Lyra, Gestora de Políticas Públicas de Juventude da prefeitura de Recife, um desafio importante é a penetração da política pública na sociedade civil organizada e na academia. “Já estávamos refletindo sobre como garantir o direito de saúde de forma efetiva a partir do Plano Municipal de Juventude, que foi construído de forma participativa com os jovens. Como trabalhar academia, a gestão e órgãos estratégicos da Sociedade Civil de maneira efetiva, e não apenas pro forma”, afirmou. Ela afirma que os jovens consultados surpreenderam em algumas das demandas levantadas.

O Secretário da Juventude do Recife, Marcone Ribeiro esteve presente na oficina. “Essa é a possibilidade de construção de uma política intersetorial em nível municipal, o que é algo inédito no Brasil. Recife é a primeira cidade do país que tem consolidado a construção de uma metodologia para pensar a juventude”, afirmou Marcone.

“É preciso pensar a própria juventude na diversidade do que é ser jovem, o que é uma complexidade muito grande”, afirma Gilmara Silva de Oliveira, pesquisadora que participará da prospecção da LCA&J na Bahia. “Há questões de saúde específicas para transexuais, travestis e não-binários. É preciso capacitar os profissionais para entenderem que esses são corpos que demandam cuidado. Dentro da instituição todo mundo tem que saber como atender essas pessoas. Não só o médico, mas o porteiro, recepcionista. Na unidade de saúde, todo mundo atende. Essa é uma demanda que vem dos jovens”. Na Bahia, a Secretaria de Saúde participa do projeto em parceria com a Secretaria de Promoção à Igualdade Racial.

O secretário de Juventude do Rio Grande do Norte, Gabriel Medeiros, foi um dos participantes da oficina, estando presente e ativo nos dois dias de atividades. “Esse projeto tem uma importância fundamental para o amadurecimento das políticas de Juventude no país. É uma tentativa de construção de um SUS mais acolhedor com as demandas da Juventude. No Rio Grande do Norte, vemos essa experiência com muito entusiasmo”, afirmou.

A pesquisadora Pryscylla Fideles de Miranda, que fará a prospecção no Rio Grande do Norte, destacou a importância de obter um perfil das vulnerabilidades dos jovens nos municípios. “Temos muitos jovens, mas eles não são o foco. Os próprios estudos, quando os profissionais vão fazer a territorialização, não estão preocupados com os jovens. Eles pensam se ali é vulnerável para crianças, idosos e mulheres. Mas pouco se fala das vulnerabilidades dos jovens. É como se não existissem”, explica.

O Ceará possui uma Secretaria de Juventude, que realizou alguns levantamentos de demandas. Segundo Gabriela Silva Gomes, assessora de Políticas Públicas da secretaria, esses diálogos revelaram que muitos jovens não conhecem os serviços públicos dos quais poderiam se beneficiar. “Eles não têm conhecimento do que o estado promove para eles em todas as áreas. Eles não sabem onde podem procurar um atendimento psicológico, onde podem buscar o primeiro emprego, onde acessar vagas escolares após terem evadido a escola. Tudo isso foi colocado nas conversas com esses jovens”, relatou Gabriela.
 
Agenda Jovem Fiocruz

A Agenda Jovem Fiocruz (AJF) é uma plataforma colaborativa que articula temas do SUS para uma Política Nacional da Juventude. O projeto desenvolve iniciativas nas áreas de pesquisa, educação, informação, serviços em saúde e ações territorializadas voltadas para as juventudes.

É uma iniciativa vinculada à Presidência da Fiocruz, com suporte da Coordenação de Cooperação Social. A AJF organiza grupos de trabalho compostos de profissionais de várias Unidades Técnico-Científicas da Fiocruz e firma parcerias com entidades governamentais, organizações de cooperação internacional e organizações da sociedade civil para a defesa do direito à saúde da juventude brasileira.

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