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'Não há equidade vacinal sem equidade de gênero', afirma pós-doutoranda da ENSP em artigo internacional


06/06/2022

Tatiane Vargas (Ensp)

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É indiscutível que as vacinas são formas essenciais para responder a uma doença infecciosa letal e emergente. No entanto, as gestantes continuam sendo excluídas de forma persistente e categórica dos testes vacinais. Durante a pandemia de Covid-19, por exemplo, as gestantes não foram inicialmente incluídas em ensaios clínicos. Isso gerou atraso significativo no acesso à imunização contra o coronavírus. “Não há equidade vacinal sem equidade de gênero”, reforça Ilana Ambrogi, pós-doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Bioética, Ética Aplicada e Saúde Coletiva (PPGBIOS), em artigo publicado na página do grupo de pesquisa internacional Epidemic Ethics, comunidade global de bioeticistas que fornece suporte contextual, confiável e em tempo real em relação às questões éticas decorrentes de emergências globais de saúde.

Segundo Ambrogi, nem mesmo a comprovação científica de que a Covid-19 agravaria os riscos durante a gravidez foram suficientes para a inclusão de gestantes em ensaios clínicos de vacinas. “Mesmo após os primeiros alertas dos desfechos negativos e mortais da Covid-19 durante a gravidez, as gestantes continuaram sendo excluídas dos ensaios vacinais em andamento. Somente quase um ano após as vacinas estarem disponível para a população em geral, que as gestantes passaram a ter acesso à vacinação”, advertiu. 

A vacinação durante a gravidez não é uma novidade, pelo contrário, é uma prática conhecida e recomendada, ligada diretamente à melhoria dos desfechos em saúde. Para Ilana, isso levanta a questão do por que intervenções não comprovadas - com eficácia improvável e riscos conhecidos -, foram consideradas para uso compassivo, mas a inclusão de gestantes em ensaios vacinais é uma barreira intransponível mesmo diante dos resultados mais trágicos de uma doença emergente.

“Quando a pandemia de Covid-19 foi anunciada oficialmente no início de 2020, existiam evidências extensas demonstrando que as gestantes são desproporcionalmente afetadas durante emergências de saúde pública. A Zika, o Ebola, e a influenza H1N1 são surtos recentes de doenças infecciosas que impactaram significativamente as gestantes. A exclusão dos ensaios clínicos levou à falta de evidências e criou novas barreiras ao cuidado e proteção daquelas que estavam ou poderiam engravidar, colocando-as ainda mais em risco”, explicou.

Gestantes e a vacinação

No artigo There is no vaccine equity without gender equity, a pós-doutoranda destaca que o argumento de que as gestantes devem ser excluídas dos ensaios para protegê-las é insuficiente por pelo menos duas razões principais. Primeiro por se tratar de uma prática discriminatória que limita o acesso das mulheres aos benefícios das pesquisas de vacinas contra a Covid-19. Segundo porque excluí-las dos ensaios clínicos as coloca em uma situação ainda mais vulnerável. “Elas são um grupo de alto risco no qual intervenções baseadas em evidências são historicamente muito limitadas. Isso é uma consequência crítica e conhecida que só amplia as lacunas de conhecimento em relação ao cuidado na gravidez”, lamentou.

Para Ambrogi, devido a previsível e conhecida potencialização das vulnerabilidades e riscos, as gestantes devem ser prioridade na condução de pesquisas sobre medidas preventivas, como vacinas, e nunca excluídas categoricamente como foram no caso das vacinas contra a Covid-19. Segundo ela, os ensaios vacinais e a vacinação de gestantes durante a pandemia são evidências de que a equidade vacinal, como aspecto essencial da equidade em saúde, só pode acontecer se a desigualdade de gênero na pesquisa e implantação de vacinas for tratada.

De acordo com Ilana, que é médica de Família e Comunidade, a exclusão categórica de gestantes de ensaios vacinais de uma doença letal emergente culmina em torná-las ainda mais vulneráveis e prioriza a gravidez (ou feto), ao invés das gestantes. Além disso, em tempos de intensa retórica antivacina, as exclusões também ampliam as lacunas de conhecimento que alimentam narrativas perigosas criando mais barreiras à saúde. 

“Neste caso, como em todos os casos de ensaios clínicos e vacinais, a equidade de gênero requer a Inclusão Presuntiva de Gestantes. Isso é fundamental para garantir a autonomia das gestantes, no sentido de fundamentar sua autoridade em relação às decisões sobre seus próprios corpos. É um componente essencial da equidade de gênero, um direito humano e princípio ético, e um passo urgente para a equidade vacinal de fato”, enfatizou Ilana. 

+ Acesse o artigo na íntegra

Crédito foto de capa: Câmara dos Deputados

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