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Fioantar retoma expedições científicas com novo embarque

13/10/2021

Cristina Azevedo (Agência Fiocruz de Notícias)

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Depois de um ano de intervalo devido às restrições provocadas pela pandemia de Covid-19, o projeto Fiocruz na Antártica (Fioantar) retomou as expedições científicas ao continente com um novo embarque na manhã desta quarta-feira (13/10). Após uma semana em quarentena com ações para enfrentamento à Covid-19, incluindo execução de testes diagnósticos antes e durante o período, o navio de apoio oceanográfico Ary Rongel partiu rumo à Estação Antártica Comandante Ferraz com o pesquisador Lucas Moreira. Em novembro, mais três pesquisadores do Fioantar - Maria Ogrzewalska, Harrison Magdinier Gomes e Maithê Magalhães - zarparão no navio Almirante Maximiliano, também chamado de “Max”, completando a primeira parte da missão. 


O navio de apoio oceanográfico Ary Rongel partiu rumo à Estação Antártica Comandante Ferraz com o pesquisador Lucas Moreira da Fiocruz (foto: Lucas Moreira)

 

Os testes e a quarentena são algumas das mudanças que veteranos e novatos enfrentam. A pandemia aumentou também o tempo da viagem. Se as duas expedições anteriores duraram apenas um mês, já que parte do trajeto era coberto de avião, agora são necessários três meses, porque a viagem inteira é feita de navio - sem que os tripulantes e pesquisadores desçam em qualquer parada até a Antártica para não haver risco de contaminação.  

Terceira expedição e Fiolab 

As medidas extras de segurança não diminuíram o entusiasmo de Maria Ogrzewalska, Lucas Machado Moreira, Harrison Magdinier Gomes e Maithê Magalhães, que vão nesta Terceira Expedição, nem de Martha Lima Brandão e Roberto do Val Vilela, que vão na Quarta, em janeiro. Até o “Max” chegar à Antártica, Lucas estará trabalhando na estação. A reunião do grupo será breve: Lucas passa o bastão para Harrison e Maithê, deixa a estação e sobe no Max para seguir viagem com Maria, realizando coletas em diferentes pontos do continente.  

Enquanto Maria e Lucas ficarão baseados no navio, muitas vezes sem conexão com o mundo exterior, Harrison e Maithê estarão na estação, desta vez com uma novidade a mais: o Fiolab - laboratório de biossegurança montado e instalado pela Fiocruz na Estação Antártica. Inaugurado em janeiro de 2020, o laboratório permitirá que as amostras coletadas perto da estação sejam analisadas imediatamente, sem ter que esperar a chegada do navio no Rio de Janeiro, prevista apenas para abril do próximo ano. 


Os pesquisadores Maithê Magalhães, Lucas Machado Moreira, Maria Ogrzewalska e Harrison Magdinier Gomes, que vão participar da Terceira Expedição (foto: Paulo Lara)

 

“Temos amostras coletadas em 2019 e 2020, e agora vamos poder coletar e analisar as novas sem que fiquem muito tempo estocadas. Esperamos ver se o resultado é mais eficiente e como se comportam”, contou Harrison, pesquisador do Laboratório de Biologia Molecular Aplicada a Micobactérias (IOC/Fiocruz). 

Harrison e Maithê farão coletas de bactérias e micobactérias na Península Kelly, onde fica a estação, em fontes de água naturais e artificiais (como sistemas de refrigeração), solo, degelo, líquens, carcaças e fezes. A ideia é extrair o DNA e depois continuar os estudos no Brasil. Entre as micobactérias, que sobrevivem em baixas temperaturas, está a Mycobacterium tuberculosis, capaz de causar infecção em humanos, e a Bovis, usada na fabricação da vacina BCG. “Com a pesquisa podemos ver [com o tempo] como as mudanças climáticas podem impactar não só a Antártica como a América Latina e o Brasil. Ver se podem definir padrões de distribuição de microorganismos”, explicou Harrison, que faz a sua segunda viagem. 

Maithê, do Laboratório de Genômica Funcional e Bioinformática (IOC/Fiocruz), vai pela primeira vez. Ela está mais focada em metagenômica - a análise do genoma de todo microorganismo que tiver a amostra coletada. Junto com Harrison, ela ressalta que os resultados “não atendem só aos seus laboratórios, mas a todos os grupos do Fioantar”. 

Três meses no navio 

Enquanto os dois estiverem na estação, Maria e Lucas seguirão embarcados. Essa é a segunda vez de Maria e ela espera aproveitar mais, já que na primeira, em dezembro de 2019, a queda de um avião chileno desviou o navio brasileiro para as buscas, encurtando o tempo de coleta. “A gente já aprendeu que tudo pode acontecer”, diz. Pesquisadora do Laboratório de Vírus Respiratório e Sarampo (IOC/Fiocruz), ela vai procurar o vírus Influenza (causador da gripe) nas fezes de aves e mamíferos marinhos. Na expedição anterior, encontrou o H11N2 na Ilha Pinguim. Agora pretende comparar os resultados. 

Lucas trabalha no Laboratório de Micologia (INI/Fiocruz) e vai em busca de fungos e bioprospecção para aplicações terapêuticas e industriais. O grupo já identificou fungos patogênicos pela primeira vez na região e tem resultados inéditos. Ele também modera as expectativas e observa que na Antártica “quem manda é a condição climática”. O pesquisador espera que o tempo ajude e possa ir nas Aspas (Áreas Antárticas Especialmente Protegidas), que têm menor influência do homem. 

Permanecer tanto tempo num navio traz também um desafio psicológico. São meses sem ver a família e longos períodos sem comunicação. “É um espaço muito fechado, com pessoas que você não conhece. Você precisa sair da cama de lado, sem levantar o corpo. Mas é todo mundo muito profissional”, conta Maria. “Eu adoro a pesquisa de campo, então não me incomodo.” Maria deve retornar ao Brasil no final de dezembro, com Lucas possivelmente voltando à estação e regressando com o restante do grupo em meados de fevereiro. 

Pesquisador alpinista vai na 4ª expedição 

Em janeiro será a vez de Martha e Roberto, dois veteranos de Antártica. Ela já foi duas vezes, e, embora Roberto vá pela primeira vez como pesquisador, ele já esteve no continente outras seis vezes como alpinista, contratado pela Marinha. 


Os pesquisadores da Fiocruz Martha Lima Brandão e Roberto do Val Vilela, dois veteranos de Antártica, embarcarão em janeiro (foto: Paulo Lara)

“Um alpinista antártico cuida da segurança nos deslocamentos, principalmente em gelo. Uma geleira esconde fendas cobertas por neve. É preciso andar ‘encordado’. Muita gente já desapareceu na Antártica por conta disso”, conta Roberto, que trabalha no Laboratório de Biologia e Parasitologia de Mamíferos Silvestres Reservatórios. 

Martha, do Laboratório de Paleoparasitologia da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), e Roberto buscam identificar a biodiversidade da helmintofauna, vermes também presentes aves, focas e leões marinhos, dos quais pouco se sabe. Os helmintos teriam se desenvolvido na América do Sul e na África e migrado para a Antártica. Então, é possível encontrar “parentes” em outros lugares.  

“Através do verme eu sei que tipo de peixe o pinguim está comendo, eu posso falar da saúde ambiental”, observou Martha. “Nosso grupo tem uma visão integrada, esse é o nosso diferencial. Quem vai à Antártica estudar pinípedes (ordem de mamíferos aquáticos como focas, leões-marinhos e morsas), vai estudar só isso. Nós temos o diferencial de ver vírus, helmintos, fungos, como é a circulação de todos esses patógenos. É um olhar mais integrado”, conclui.

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