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Biodiversidade é destaque na última plenária do G-Stic 2023


16/02/2023

Flávia Ribeiro (G-Stic)

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A sessão plenária Biodiversidade - Somos todos natureza encerrou o último dia (15/2) da 6ª Conferência Global de Ciência, Tecnologia e Inovação (G-Stic 2023). A atividade apresentou importantes discussões sobre o olhar sistêmico da saúde sobre a preservação da biodiversidade como um todo, e o futuro da humanidade em especial.

atividade apresentou importantes discussões sobre o olhar sistêmico da saúde sobre a preservação da biodiversidade como um todo (foto: Eduardo Napoli / Gopala Filmes)

 

Coordenadora da Plataforma Institucional Biodiversidade e Saúde Silvestre e pesquisadora da Fiocruz, Márcia Chame trouxe exemplos práticos de como a saúde vem utilizando a tecnologia de gestão de dados da biodiversidade como importante instrumento de vigilância ambiental. “Existem muitas formas de se usar a biodiversidade sem que ela seja destruída”, explica. “A pandemia nos ensinou que precisamos de dados de qualidade, georreferenciados - e aqui temos um primeiro gargalo porque as informações demoram muito. Muitas vezes, as pessoas precisam morrer primeiro para que, a partir da análise do patógeno, possamos chegar à origem que nos leva a identificação do que precisa ser feito para proteger os demais. Mas uma vez que tenhamos condições de interpretar essa biodiversidade, também conseguimos rastrear os sinais de alerta”.

A pesquisadora se refere ao Sistema de Informação em Saúde Silvestre (Siss-Geo), sob sua responsabilidade, que recentemente tem ajudado o país a fazer o controle efetivo do surto de febre amarela identificado inicialmente em primatas. “A febre amarela chegou ao Brasil em 1685 e se adaptou a pelo menos 108 espécies de primatas, evoluindo para se comportar de forma inteiramente diferente de como ela se comporta na África. Aprendemos que os primatas são os primeiros a sofrer, antes dos humanos, os efeitos dessa doença. Então passamos a monitorar esse indicador como um alerta importante, que nos ajudou a criar modelos projetando as hipóteses de proliferação e, com isso, temos conseguido subsidiar importantes decisões sobre o processo de vacinação”, disse.

Márcia relatou que “infelizmente, ainda continuamos identificando alguns primatas mortos, mas já não registramos mais infecções importantes em humanos, o que nos leva a crer que fomos capazes de antecipar a epidemia. E isso nos fez reconhecer que quanto mais preservada é a biodiversidade, melhores meios temos de acompanhar esse tipo de marcador”. A pesquisadora monitora diversas outras manifestações da biodiversidade como a morte anormal de tartarugas no litoral ou a circulação de patógenos a partir do programa BioAntar possibilitando antecipar o risco de pandemias.

Anne Larigauderie, secretária executiva da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos do IPBES, alertou para a interrelação entre a forma como escolhemos viver hoje seus efeitos sobre a biodiversidade. "A agricultura depende em grande parte dos agentes polinizadores, então se perdemos determinados insetos já sentimos imediatamente os efeitos disso. As florestas respondem pela captura de aproximadamente um terço do que produzimos em carbono, e na medida em que desmatamos, esse impacto recai sobre o clima de forma cíclica. E, finalmente, a forma desordenada com que ocupamos o solo introduz novos patógenos que afetam a fauna e a nossa capacidade de controlar novas mutações de antigas doenças”, explicou.

Samela Sateré Mawé, observou que esse movimento ocorre no Brasil desde o descobrimento, mas que estamos começando a perceber agora importantes ações ansiados há muito tempo pelos povos originários. "Precisamos desconstruir o que as pessoas pensam sobre os indígenas. Muitas pessoas acham que não estamos inseridos nas universidades, nos congressos, nos lugares de fala. Estamos sim, mas com muita luta. Eu pessoalmente estive em todos os grandes fóruns de discussão sobre questões climáticas, mas reconheço como é difícil conquistar esses espaços e participar deste debate. Precisamos de mais jovens indígenas ocupando esses espaços, discutindo o racismo ambiental, não para acirrar a disputa, mas para que os nossos saberes sejam reconhecidos. Afinal, ficamos restritos a 13% do território original e os biomas que ocupamos efetivamente são os mais preservados”, argumenta Samela.

Jornalista e ativista reconhecida por sua atuação em defesa da causa ambiental, a princesa Marie-Esmeralda da Bélgica complementou o discurso da representante Sateré Mawé: “Como bem frisou a Samela, parece que nós nos esquecemos que sem um ecossistema sustentável todos nós morreremos. A biodiversidade é o nosso sistema de suporte a vida. E os indígenas já sabiam disso há tanto tempo. Os povos indígenas entendem melhor porque eles vivem na terra, então, finalmente agora as pessoas estão entendendo o quão grave é a situação atual. Chegamos a perder 69% da biodiversidade global nos últimos anos. Agora precisamos reverter essa tendência. Conhecer e respeitar outros saberes. E literalmente descolonizar nossas mentes. Precisamos entender que, se nós estamos diante de um grande problema agora, é por tudo de errado que fizemos no passado. Precisamos enxergar a biodiversidade como um ativo de toda a humanidade”.

O painel, moderado pelo professor Carlos Eduardo Young, da UFRJ, contou com a participação especial da liderança jovem e ativista indígena Samela Sateré Mawé; da princesa Esmeralda da Bélgica; e de Erie Tamale, chefe da Unidade de Capacitação e Gestão do Conhecimento (SCBD). A atividade teve a presença de Anne Larigauderie, secretária executiva da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos do IPBES; Sechaba Bareetseng, gerente do Programa para Gestão de Conhecimentos Indígenas do CSIR; Benjamin Roche, diretor de pesquisa do Research Institute for Development (IRD); e a pesquisadora Márcia Chame, coordenadora da Plataforma Institucional Biodiversidade e Saúde Silvestre da Fiocruz, que desenvolve o Sistema de Informação em Saúde Silvestre (Siss-Geo) e o Centro de Informação em Saúde Silvestre (Ciss). 

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