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Amazonas: Fiocruz detecta nova linhagem da Sars-CoV-2 e estado sofre com falta de oxigênio


18/01/2021

Por: Flávia Lobato (Portal de Periódicos Fiocruz)*

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Brasil, Amazonas, janeiro de 2021: falta oxigênio nos hospitais. É o pico de uma grave crise sanitária e humanitária que configura a pandemia de Covid-19: a taxa de ocupação de unidades de terapia intensiva (UTI) e de leitos clínicos supera os 90%. São muitos os problemas, uma espécie de bola de neve durante o período conhecido como "Inverno Amazônico", que potencializa a proliferação de doenças respiratórias. Pacientes são transferidos para outros Estados; os profissionais de saúde vivenciam pressões extremas para salvar vidas; funerárias e cemitérios estão superlotados. O Estado conta 3.816 novos casos de Covid-19, chegando à marca de 223.360 casos, no total. Em meio ao colapso, a Fiocruz detecta uma nova variante da linhagem Sars-CoV-2 e também confirma o primeiro caso de reinfecção pelo novo coronavírus no Amazonas. Um cenário que seria distópico, se não fosse verídico.
Pesquisadores soaram o alerta em meados de 2020

Mas este alarme já tinha soado muito antes do toque de recolher – determinado pelo governador Wilson Lima como uma das novas medidas para tentar conter a disseminação do vírus e evitar o aumento do número de casos. Segundo a Secretaria Estadual de Saúde do Amazonas, a taxa de transmissão está em 1,3. Isso significa que, para cada cem pessoas infectadas, em um intervalo de sete dias, 130 serão contaminadas. A velocidade é a mesma observada em abril e maio do ano passado, de acordo com a presidente da Comissão Estadual de Controle de Infecção em Serviços de Saúde da Fundação de Vigilância em Saúde (FVS-AM). “Estamos vivenciando novamente um tsunami, ou seja, um crescimento acelerado de casos”, alerta Tatyana Amorim.

Ela se refere à situação aguda descrita em Explosão da mortalidade no epicentro amazônico da epidemia de Covid-19 (Cadernos de Saúde Pública, vol. 36, n. 7, jul/2020). A Comunicação Breve trata da gravidade da crise em Manaus no ínicio de 2020 e chama a atenção para o papel das autoridades sanitárias:

“Há mais de quatro semanas, Manaus apresenta sinais de esgotamento na rede pública hospitalar, devido ao rápido aumento do número de casos de Covid-19. Só na primeira quinzena de maio, foram quase sete mil novos casos, o dobro do número até então identificado. Ademais, de 19 a 28 de abril, a média diária de sepultamentos foi de 123, valor quatro vezes maior do que a média diária de 2019 (6). Chama atenção que a média diária de mortes por COVID-19, reconhecida pelos serviços de saúde no mesmo período, tenha sido de apenas 14 óbitos, sugerindo ampla subnotificação, um problema mundialmente reconhecido, sobretudo em regiões de precária testagem e serviços de saúde deficitários (7,8)”.

Para os pesquisadores, a mortalidade geral em Manaus e a elevada proporção de óbitos em domicílio e em via pública sinalizavam que as ações governamentais não estavam sendo efetivas, principalmente no que diz respeito ao enfrentamento das desigualdades sociais, acesso Sistema Único de Saúde (SUS) e coordenação de esforços (acesse artigo relacionado ao tema). “Nesse cenário, reforços devem ser envidados rapidamente por gestores das três esferas de governo, de modo a conter ou minorar o efeito deletério da Covid-19, sobretudo em áreas mais precárias, onde o impacto da pandemia sobre a mortalidade tende a ser mais acentuado”, alertaram os autores ainda em julho de 2020.

Sequenciamento genético e variantes do coronavírus: o pioneirismo da Fiocruz Amazônia

No último dia 12, foi confirmada a identificação da origem da nova variante da linhagem Sars-CoV-2 B.1.1.28 no Amazonas — designada provisoriamente de B.1.1.28 (K417N / E484K / N501Y). O estudo, liderado pelo virologista Felipe Naveca, sugere que as cepas, detectadas em viajantes japoneses que tinham passado pela região amazônica, evoluíram de uma linhagem viral no Brasil, que circula no Amazonas. A Fiocruz publicou uma Nota Técnica sobre essa nova variante (saiba mais).

Pesquisador do Instituto Leônidas & Maria Deane (ILMD/Fiocruz Amazônia), Naveca também esteve à frente do primeiro sequenciamento do genoma completo do SARS-CoV-2 na região Norte do Brasil. O mapeamento foi concluído dez dias após a confirmação do primeiro caso de Covid-19 na cidade de Manaus. Esse trabalho foi publicado na revista científica Memórias do Instituto Oswaldo Cruz (vol. 115, set/2020).

Já no que tange às novas variantes, ele destaca que o vírus acumulou muitas mutações, evoluindo rapidamente em pouco tempo. Mas pontua que é necessário realizar e aprofundar estudos para determinar quando a variante surgiu e o quanto está presente no Amazonas. Ele lembra que não se pode dizer que a variante seja a única responsável pela transmissão acelerada na região e que múltiplos fatores contribuem para piorar esse quadro. “Temos o início da temporada de vírus respiratórios, que historicamente acontece de meados de novembro em diante. É o que a gente chama de ‘Inverno Amazônico’, em que aumenta a circulação de outros vírus, como influenza. Então temos a variante somada à situação sazonal, junto com a diminuição do distanciamento social”.

Diante do agravamento da crise no Amazonas e em diversos estados no Brasil, o virologista deixa um recado importante: “Vírus mutantes ou originais não atravessam a máscara, não resistem à lavagem das mãos com água e sabão ou com álcool gel, e a transmissão também é evitada com o distanciamento social. Fazemos um apelo neste momento tão difícil para que a população nos ajude a frear a evolução do vírus – tanto o original quanto o mutante. Entendam que a gente só faz isso se diminuir o contato entre as pessoas”.

Leia mais: Atenção básica no Amazonas: provimento, fixação e perfil profissional em contextos de difícil acesso (Trabalho, Educação e Saúde, vol. 18, n. 3, ago/2020)

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