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Agenda 2030: Fiocruz e ONU realizam consulta sobre inovação

Nisia Trindade

09/11/2017

Por: André Costa (Agência Fiocruz de Notícias)

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Em parceria com diversas agências e programas da ONU, a Fiocruz promoveu, de segunda a quarta-feira desta semana (6 a 8/11), uma consulta internacional sobre como a Ciência, a Tecnologia e a Inovação (CT&I) podem auxiliar o cumprimento dos objetivos e metas da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. As conferências e painéis reuniram dezenas de pesquisadores, dirigentes de organismos multinacionais e representantes de movimentos sociais e da sociedade civil, oferecendo um panorama diverso de oportunidades, desafios e limitações do documento das Nações Unidas.

Em seu primeiro dia, a consulta contou com o lançamento da Estratégia Fiocruz para a Agenda 2030, uma conferências sobre o conceito de desenvolvimento sustentável, outra sobre a economia política da América Latina, um painel sobre a integração da inovação para auxiliar o desenvolvimento sustentável e, finalmente, a apresentação de experiências de plataformas tecnológicas inovadoras na área da saúde.

As discussões envolveram pontos como: quais políticas e mecanismos de implementação devem ser priorizados para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs), considerando a interação entre eles? Como potencializar a saúde como uma referêncai de monitoramento da Agenda 230 e os ODSs? Quais são as características específicas da inovação em saúde que devem ser consideradas na construção de uma plataforma de CT&I em saúde? Como engajar a governança da saúde e CT& nos níveis global e nacional para a participação em uma plataforma?

Dado o grau de complexidade das questões, as respostas foram diversas e, por vezes, contraditórias. Em algumas apresentações, o debate girou em torno da governança internacional para a Agenda 2030 e de questões como os meios para financiá-la. Em outros momentos, os participantes concentraram sua atenção na interdependência entre os diversos objetivos. Por fim, foram feitas reflexões sobre a desigualdade social e em como ela aparece em todos os ODSs, que não serão atingidos sem ações diretamente a este respeito.

Ao fim do encontro, o coordenador da Fiocruz para a Agenda 2030, Paulo Gadelha, avaliou o resultado do seminário: “este encontro foi o embrião para a constituição de redes. Há uma série de parcerias bilaterais que serão feitas a partir dos encontros aqui realizados. A consulta rendeu frutos muito significativos para o que constituímos como a Estratégia Fiocruz para a Agenda 2030. Devemos agora agir de maneira comum e sistêmica, com capacidade para gerar efeitos concretos para cumprimento dos ODSs”, afirmou. 

Paulo Gadelha é o coordenador da Estratéga Fiocruz para Agenda 2030 (Foto: Peter Iliciev)

Este encontro é mais um resultado de uma colaboração entre a Fiocruz e a ONU: na ONU-92, no Rio de Janeiro, a Fundação teve participação ativa e relevante, participando e conduzindo discussões sobre saúde e sustentabilidade. O mesmo aconteceu 20 anos depois, na Rio+20. As agências e programas das Nações Unidas que ajudaram a organizar esta consulta foram: o Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais; o Mecanismo de Facilitação Tecnológica; o Centro Mundial para o Desenvolvimento Sustentável (Centro RIO+); o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).

Fiocruz na Agenda 2030

A primeira palestra da Consulta foi uma apresentação da Estratégia Fiocruz para a Agenda 2030, a encargo de seu coordenador, Paulo Gadelha. O ex-presidente da Fundação ressaltou particularidades da Fundação, que a aproximam do documento internacional e conferem capacidade de ação privilegiada: “Esse referencial tem grande ressonância com a matriz histórica da Fiocruz, que foi constituída por uma visão conjugando conhecimento, inovação e desenvolvimento econômico e social”, afirmou.

Gadelha citou iniciativas da Fiocruz ligadas a Agenda 2030, como a Plataforma Ágora, o Observartório de Territórios Sustentáveis da Bocaína, o papel de observador do Ministério da Saúde e a própria área de pesquisa, entre outros. logo após, a presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima, fez uma reflexão acadêmica, relacionando o conceito de desenvolvimento sustentável com o próprio conceito de desenvolvimento. Lima afirmou que não se pode acreditar que o desenvolvimento surja naturalmente das relações humanas, sendo necessário lembra que ele é resultado de processos históricos e decisões políticas. “Não é possível deixar o desenvolvimento a mercê das forças de mercado. Isso pode fazer com que a pobreza se torna mais pobreza”, afirmou, 

Segundo Lima, “não é possível pensar em desenvolvimento sustentável sem se focar no grande no tema das desigualdades. Esse foco não é uma novidade que nos traz Agenda 2030, mas, em todos os ODSs, é possível identificar pobreza como um desafio a ser superado” disse. 

Para o cumprimento dos ODSs, a primeira mulher a presidir a Fundação afirmou que o tema dos determinantes sociais da saúde é fundamental. “Os determinantes sociais estão na base da saúde, desde a incidência de infecções à relação entre desastres naturais e estrutura social desigual. Somente atentando para eles poderemos cumprir as metas da Agenda 2030”, afirmou.

Ciência, tecnologia, inovação e desenvolvimento sustentável

O primeiro painel do evento foi sobre a integração da CT&U na era do desenvovlimento sustentável. Três questões-chave o orientaram: a) quais são os pontos fortes e os progressos derivados do Mecanismo de Facilitação Tecnológica (TFM, na sigla em inglês) da ONU? b) Considerando as interações dos ODSs, quais políticas e mecanismos de implementação devem ser priorizados para superar a área da saúde e a inovação? c) Como potencializar a saúde como uma referência de monitoramento da Agenda 2030 e seus ODSs?

O primeiro participante a falar foi o médico americano William Colglazier, membro do 10-member Group que aconselha o painel, do qual também faz parte Paulo Gadelha. Colglazier afirmou que, “se tivermos que pegar dois objetivos que têm mais impacto, seriam saúde e educação. E, se quisermos apontar qual objetivo pode ser mais prejudicado pelos outros, este é o da saúde”.

O chefe do setor de análise de políticas da divisão para o desenvolvimento sustentável das Nações Unidas, Shantanu Mukherjee, foi o orador seguinte, enfocando-se especificamente no TFM. Para o dirigente, o Mecanismo busca “promover cooperação entre o setor privado, a academia, a sociedade civil e aqueles que criam os políticas, o setor mais importante de todos, que determina onde a tecnologia se assenta. Muitas vezes não sabemos como traduzir o conhecimento em políticas públicas”.

Paulo Gadelha voltou a falar em seguida, enfocando-se na importância da CT&I no setor saúde à luz da Agenda 2030. Ele começou por observar que “o lugar da saúde na Agenda 2030 parece natural, mas não é.  No rascunho inicial, nada constava sobre saúde. Hoje o tema está presente de forma significativa, mas como isso se traduz está em disputa”.

Gadelha afirmou que “há um grande fosso entre a governança em saúde e a governança em ciência, tecnologia e inovação”. Reduzir essa separação, disse, exige uma série de mecanismos, como por exemplo um aprimoramento do mecanismo de avaliação de tecnologias, para avaliar os impactos de cada um e uma governança intersetorial sobre o setor. O modo como os dados disponíveis e processados também é dispensável, porque “sem indicadores apropriados não podemos saber se conseguimos aquilo que queremos”.

A assessora do Centro de Relações Internacionais em Saúde Cristiane Quental fez a apresentação seguinte, sobre o projeto “Instituições de Pesquisa em Políticas Públicas e os ODSs da Saúde na América Latina”. A iniciativa, que realiza reuniões nos dias 8 e 9 de novembro no Rio de Janeiro, objetiva realizar um estudo que descreva e compare os vários arranjos institucionais a nível nacional para implementação dos ODSs na América Latina.

O pesquisador chileno Alex Alarcon encerrou a mesa, com exposição sobre a importância dos think tanks na implementação da Agenda 2030 em seu país. Alarcon afirmou que sua pesquisa identificou que “não existe um segmento em atividade contínua de participação fora da rede governamental. Ainda que se tenham identificado atores privados, sua participação é descontínua e com pouca participação”.

“Atual modelo de desenvolvimento é insustentável”, diz diretora da Cepal

A Cepal considera que o atual modelo de desenvolvimento é insustentável. Fala-se muito em insustentabilidade ambiental; nós acreditamos que exista também uma insustentabilidade social”. Com essas palavras a diretora da Divisão de Desenvolvimento Social da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (Cepal), Laís Abramo, começou as atividades da parte da tarde, com conferência sobre o cenário econômico do continente. 

Para a diretora, o continente vive cenário de insustentabilidade econômica, devido à desaceleração do comércio, ao pouco investimento em infraestrutura social e a um vazio entre a inovação e a produtividade. A isto se soma “uma estrutura produtiva pouco diversificada, ainda muito dependente das commodities”. Ainda de acordo com a pesquisadora, para reverter esse cenário, nesse contexto “político, econômico e social, o papel do estado volta a ter importância fundamental”.

Abramo afirmou que o continente latino-americano observou redução expressiva das desigualdades entre 2006 e 2014, quando políticas sociais em diversos países priorizaram o combate à pobreza. Para que isso volte a acontecer e a desigualdade torne a cair, de acordo com a pesquisadora, “temos que entender os eixos que a estruturam e reproduzem”. Estes incluem “uma cultura de privilégios (como a naturalização da desigualdade e a exclusão do outro”) e a afirmação de um “conceito de igualdade, que inclui igualdade de meios, ingressos e recursos produtivos”.

Aplicativos mobilizam sociedade civil para Agenda 2030

A apresentação de quatro plataformas online para a facilitação de tecnologia encerrou as atividades do dia. Jorge Martinez Navarrete apresentou a UniteIdeas, plataforma colaborativa das Nações Unidas para “transformar a sociedade e possibilitar contatos pessoais com os líderes”. A proposta do site é “mobilizar uma comunidade global de solucionadores de problemas para desenvolver e aplicar tecnologia que produza impacto social”. O princípio de desenvolvimento foi o de uma evolução gradual: “construir o menor produto viável” e evoluir a partir dali.

A pesquisadora da Fiocruz Márcia Chame apresentou o Siss-Geo, aplicativo que transforma cidadãos comuns em agentes ativos para prevenir febre amarela e outras doenças de origem animal. Segundo a bióloga, o principal trunfo do Siss-GEo é estimular a participação da sociedade no monitoramento de epizootias (termo usado para definir eventos de doenças em animais não humanos, análogo ao conceito de epidemia em pessoas). 

Depois de Márcia, foi apresentada plataforma Ágora, lançada pela Fiocruz nesta semana, que tem como objetivo estimular o desenvolvimento da inteligência cooperativa em prol do alcance dos ODSs.

Encerrando o dia, Cláudio Muniz apresentou dados da saúde presentes no portal de Dados Abertos, riqueza, segundo ele, ainda pouco explorada. Nas palavras de Muniz, “talvez precisemos instrumentalizar o SUS, que tem um processo muito rico, Mas talvez esse processo não tenho se apropriado das ferramentas que ele próprio criou”.

Leia também: Consulta Agenda 2030: C&T devem promover inclusão social

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