20/07/2022
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca - Informe ENSP Fiocruz
Um evento participativo, popular, inclusivo e que enalteceu a defesa da vida, da democracia e do SUS. Esses elementos deram o tom da I Conferência Livre, Democrática e Popular da Saúde da Grande Leopoldina, realizada no sábado, 16/7, e que serviu de etapa preparatória para a Conferência Estadual Livre Democrática e Popular de Saúde do Rio de Janeiro, que acontece em 23/7, e a Conferência Nacional, marcada para o dia 5 de agosto. Lideranças comunitárias, moradoras e moradores, militantes de movimentos sociais, trabalhadoras(es), professoras(es), acadêmicos(as), gestoras(es), estudantes e representantes de segmentos identificados com a luta pela saúde uniram-se em uma só voz para discutir e propor um projeto de reconstrução do país que considere a importância da participação popular num amplo redesenho civilizatório de nação e de um Sistema Único de Saúde 100% público, e de direito universal. A Carta da Conferência da grande Leopoldina será divulgada em breve.
O evento, que é parte da construção da 17ª Conferência Nacional de Saúde, aconteceu na UNISUAM, em Bonsucesso, e configurou-se como um espaço de luta pela democracia, conforme destacou Lucia Cabral, representante do Espaço Democrático de União, Convivência, Aprendizagem e Prevenção (Educap). “O poder emana do povo. Todos têm direito de lutar por um SUS de qualidade, e este é um espaço de luta pela democracia em que a participação faz diferença. Temos que nos sentir parte dessa história, pois o SUS foi construído com várias mãos. O povo tem que se colocar para construir um caminho democrático e participativo”, afirmou a moradora do Complexo do Alemão na mesa de abertura.
O diretor da ENSP/Fiocruz, Marco Menezes, lamentou o contexto de perdas e retrocessos e citou o retorno ao mapa da fome e a situação de insegurança alimentar como tristes exemplos dessa conjuntura. Recordou que o país ainda vive uma pandemia, mas celebrou a vitória da ciência no enfrentamento à Covid-19, ao negacionismo e citou a realização da I Conferência Livre, Democrática e Popular da Saúde da Grande Leopoldina como um ato de resistência aos ataques sofridos. “Esse evento aqui é uma resposta. Nos organizarmos também é uma forma de defender o SUS!”.
Marco afirmou que o enfrentamento da conjuntura adversa deve partir de um olhar ampliado da saúde, com ações e políticas que considerem a determinação socioambiental e intensificação da intersetorialidade. Ele também defendeu a revisão da Política Nacional de Segurança Alimentar e ações de fomento à agroecologia e à economia solidária. “Precisamos construir juntos, construir com... estamos a dois meses de definir o futuro do país e os compromissos debatidos aqui neste evento devem ser prioridade. Destaco a importância do lema da 17ª CNS ‘Garantir Direitos e Defender o SUS, a Vida e a Democracia – Amanhã vai ser outro dia’. Viva o SUS, viva os movimentos populares, viva a saúde coletiva e todos que estão aqui”.
Fotos da matéria: Patrick Marinho (Redes da Maré)
O vice-presidente da Asfoc-SN, Paulo Garrido, relembrou o sanitarista Sergio Arouca ao citar que a saúde não é simplesmente a ausência de doenças, mas, sim, um conceito ampliado que incorpora o direito à casa, ao trabalho, ao salário condigno, à água, à vestimenta, à educação, às informações sobre como dominar o mundo e transformá-lo. “A Asfoc trabalha nessa perspectiva. Trabalhamos em um projeto de reconstrução do país que tem a vida como ponto central”.
Representante do Movimento Frente pela Vida, Carlos Fidelis destacou que movimentos como o da Conferência da Leopoldina estão ocorrendo em todo o país e ressaltou o trabalho de estímulo para realização dessas atividades. Ele citou os contrastes existentes no Brasil, como o alcance de recordes de produção na safra de grãos e o retorno ao mapa da fome, por exemplo. “Hoje, a vida serve à economia; quando deveria ser o contrário. Não temos emprego no país, mas temos patrões. Precisamos reconstruir e construir o país em outras bases, pois somos uma nação rica habitada por pobres”.
Também estiveram presentes na mesa de abertura Valéria Gomes Pereira, representante do Conselho Distrital de Saúde, e Thiago Silva, representante da CAP 3.1. Ambos destacaram a importância da participação popular e dos movimentos, bem como a construção de políticas públicas de qualidade para a população.
Democracia e participação
Já na mesa redonda, o professor Tulio Franco, coordenador da Rede Unida, afirmou que a construção do SUS se deu pela participação popular. Ao comentar sobre a pandemia de Covid-19, admitiu que a grande batalha contra o coronavírus aconteceu nos territórios, onde está a atenção básica, e por meio do trabalho dos agentes comunitários de saúde. “A atenção básica é uma das coisas mais preciosas do sistema de saúde. Ela entende a comunidade, os territórios e move às pessoas a lutarem pelas suas vidas”. O professor da UFF também defendeu uma estrutura intermediária de serviços, localizada entre a atenção básica e o hospital, e que funcione como uma estrutura intermediária de cuidados. “Não podemos sair da pandemia da mesma forma como entramos nela. A Covid colocou a saúde no centro do mundo e a defesa da vida deve ser uma política central”.
“Não há democracia sem participação da população”. Foi com essa afirmativa que o ex-diretor da ENSP, Hermano Castro, abriu sua palestra durante a I Conferência Livre. Ele, que traçou um panorama da atual conjuntura de saúde, enfatizou a importância de o povo lutar por um Brasil com justiça para todos e todas, e reforçou a importância da saúde nesse processo. O pesquisador também lamentou o número de trabalhadores informais, a situação de insegurança alimentar e a violência que afeta a vida de brasileiros e brasileiras. “Há um extermínio da juventude negra. A violência tem cor, gênero, raça e classe social”.
Apesar de a Constituição Federal garantir direito ao acesso, Hermano lamentou que isso não ocorra no dia a dia. Ele defendeu a necessidade de rediscutir um plano de carreira para os profissionais da saúde e a valorização dos agentes comunitários. “Desejamos um SUS 100% público, fortalecido, com profissionais de carreira, que os territórios sejam sujeitos da ação e a população seja protagonista. Necessitamos de um projeto popular que altere a correlação de forças para um Brasil justo”, finalizou.
O encontro da Leopoldina teve debate estruturado a partir de dois eixos apontados pela Frente Pela Vida: 1) SUS participativo, descentralizado e gerido com base técnica e soberania popular; 2) Políticas de Saúde para Grupos populacionais vulnerabilizados.
A Conferência envolveu uma série de movimentos populares, instituições e organizações comunitárias: Conselho Comunitário de Manguinhos (CCM), Organização Mulheres de Atitude (OMA-Manguinhos), Conselho Gestor Intersetorial Teias Manguinhos (CGI-Manguinhos), a Redes da Maré, o Espaço Democrático de União, Convivência, Aprendizagem e Prevenção (Educap), o Portal Favelas, o Sindicato dos Servidores de Ciência, Tecnologia, Produção e Inovação em Saúde Pública (Asfoc-SN), a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), o Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes), o Centro de Estudos e Ações Solidárias da Maré (CEASM), a Comissão dos Agentes Comunitários de Manguinhos (Comacs), o Instituto de Educação e Pesquisa Social João Calvino (IEPS), o Ballet Manguinhos, o Instituto Raízes em Movimento, a Abrasco, o Cebes, a Cooperação Social da Fiocruz e a ENSP, dentre outros.