23/08/2021
Por Everton Lima / IFF Fiocruz
“É tempo de transformar conhecimento em ação” é o tema deste ano da Semana Nacional da Pessoa com Deficiência Intelectual e Múltipla. A campanha anual é desenvolvida, desde 1963, pela Federação Nacional das Apaes (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais), no período de 21 a 28 de agosto. A data foi instituída pela Lei nº 13.585/2.017 e busca conscientizar a sociedade acerca da luta pelos direitos das pessoas com deficiência, além de divulgar conhecimento sobre as condições sociais dessa população, como meio de transformação da realidade e superação das barreiras que as impedem de participar coletivamente em igualdade de condições com as demais pessoas.
Segundo o Ministério da Saúde, as pessoas com deficiência intelectual ou cognitiva costumam apresentar dificuldades para resolver problemas, compreender ideias abstratas, estabelecer relações sociais, compreender e obedecer regras, e realizar atividades cotidianas, como as ações de autocuidado. Já as pessoas portadoras de deficiência múltipla, são aquelas afetadas em duas ou mais áreas, caracterizando uma associação entre diferentes deficiências, com possibilidades bastante amplas de combinações, como as pessoas que têm deficiência mental e física.
De acordo com o Censo 2010, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quase 46 milhões de brasileiros, cerca de 24% da população, declarou ter algum grau de dificuldade em pelo menos uma das habilidades investigadas (enxergar, ouvir, caminhar ou subir degraus), ou possuir deficiência mental/intelectual. Seguindo orientações internacionais, considerou-se “pessoa com deficiência” os indivíduos que responderam ter pelo menos muita dificuldade em uma ou mais questões.
Em 2010, a deficiência visual estava presente em 3,4% da população brasileira;
a deficiência motora em 2,3%; deficiência auditiva em 1,1%;
e a deficiência mental/intelectual em 1,4% | Fonte: IBGE
O IBGE reforça que o governo e a sociedade devem pensar em ações para incluir os brasileiros,
independente de possuírem algum tipo de deficiência, em todos os lugares da sociedade
para que tenham direito à educação, ao emprego, à saúde e ao bem-estar
Deficiência e Covid-19
O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) lançou, em março de 2020, um material informativo sobre os cuidados que devem ser tomados pelas pessoas com deficiência e doenças raras durante a pandemia de Covid-19. Na cartilha, o MMFDH informa que apenas por possuir alguma deficiência não significa que a pessoa tenha maior vulnerabilidade ao Coronavírus. A pessoa só é enquadrada no grupo de risco se tiver restrições respiratórias; dificuldades nos cuidados pessoais; condições autoimunes; idade acima de 60 anos; doenças associadas, como obesidade, diabetes, hipertensão arterial, doenças do coração, pulmão e rim; doenças neurológicas; e se estiver em tratamento de câncer.
As pessoas com deficiência podem ser afetadas pela Covid-19 por conta de possíveis comorbidades e outros fatores, como obstáculos à implementação de medidas básicas de higiene e a necessidade de encostar nos objetos para obter informações sobre o ambiente ou para se apoiar fisicamente. Através do documento Considerações sobre pessoas com deficiência durante o surto de Covid-19, atualizado em junho de 2020, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) ressalta que esse impacto pode ser mitigado se os principais atores envolvidos tomarem ações e medidas de proteção simples. Nele, além de orientações para os interessados diretos, constam medidas para os governos, para os profissionais da saúde, para os prestadores de serviços para pessoas com deficiência e para a comunidade.
Vacinação contra a Covid-19
Como uma das estratégias para a vacinação contra a Covid-19, o Ministério da Saúde definiu que as pessoas com deficiência permanente e pessoas com comorbidades, incluindo algumas doenças raras, seriam vacinadas em duas etapas, priorizando a população de acordo com a idade e o maior risco de gravidade e óbito. O Ministério da Saúde lembra “que deve se respeitar o intervalo mínimo de 14 dias entre a aplicação da dose da vacina Covid-19 e a administração da vacina contra a influenza ou qualquer outra do calendário nacional de vacinação. Ressalta-se, também, que deve ser priorizada a administração da vacina Covid-19, com agendamento das demais”.
Já a partir de 29 de julho deste ano, a Lei Nº 14.190 determinou a inclusão de crianças e adolescentes com deficiência permanente, com comorbidade ou privados de liberdade, no grupo prioritário do Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19, “conforme se obtenha registro ou autorização de uso emergencial de vacinas no Brasil para pessoas com menos de 18 (dezoito) anos de idade".
Sobre a vacinação, o coordenador do Centro de Genética Médica do IFF/Fiocruz, Juan Llerena Jr, foi consultado e informou que não há nenhuma restrição para as pessoas com deficiência intelectual e múltipla serem vacinadas contra a Covid-19, e reforçou que, assim como toda a sociedade, as medidas de prevenção devem ser seguidas para evitar a propagação do vírus.
Entrevista com a assistente social do IFF/Fiocruz, Aline Rodrigues Almeida
1. Quais os direitos que as pessoas com deficiência e seus cuidadores precisam saber e devem colocar em prática?
Aline: O Estatuto da Pessoa com Deficiência (lei n° 13.146), de 2015, ampliou os direitos das pessoas com deficiência, alterando o modo de assegurar e garantir à essas pessoas a inclusão social e a cidadania na sociedade.
Destaca-se que o Estatuto e o Sistema Único de Saúde (SUS) estabelecem que os serviços de saúde devem oferecer uma rede de serviços especializados para habilitação e reabilitação, além de garantir o acesso a hospitais e outros estabelecimentos. Além disso, precisam disponibilizar equipamentos como as próteses, órteses, meios auxiliares de locomoção e os medicamentos que sejam necessários.
Cabe ressaltar que a isenção ou redução de impostos é garantida aos deficientes que dispõem de doenças que provocam limitações. Entre eles, o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e o Imposto Sobre Operações Financeiras (IOF), que são benefícios relacionados à Receita Federal. Além do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS), relacionado à Secretaria da Fazenda.
A pessoa com deficiência possui uma gama de direitos arduamente conquistados através de mobilizações e associações da sociedade civil, como a Associação Nacional de Osteogênese Imperfeita (Anoi) e a Anjos da Guarda, associações parceiras do IFF/Fiocruz, embora muitos desses direitos ainda não tenham sido efetivados conforme previsto na legislação. Dando como exemplo, o direito à educação, que se mostra incipiente em relação à disponibilidade de materiais e recursos fundamentais para o acesso ao aprendizado. Por isso, é necessário que a pessoa com deficiência conheça e lute pela garantia dos direitos para o exercício pleno de sua cidadania.
2. Como a família, amigos e a comunidade podem contribuir com a inclusão social?
Aline: A família possui papel fundamental no processo de inclusão da pessoa com deficiência. Entende-se que a família participa ativamente do cotidiano de incertezas e adversidades do qual as pessoas com deficiência são submetidas. Neste sentido, é importante reconhecer que quanto maior conhecimento sobre os direitos, maior capacidade de reivindicação aos recursos e fortalecimento da família.
Cabe destacar que as mudanças estruturais não são realizadas de forma independente. A integração da família, amigos e da comunidade promove o apoio mútuo às mobilizações coletivas, viabilizando o engajamento na perspectiva da cidadania.
3. O tema da Semana Nacional de 2020 focou no protagonismo e no empoderamento, qual a importância desses dois conceitos?
Aline: Promover práticas inclusivas que eliminem situações de resignação e impotência para ampliar ações que valorizem as potencialidades e autonomia das pessoas com deficiência, na contramão do movimento histórico que evidenciava suas limitações.
4. Falando sobre o tema deste ano, qual a importância de transformar conhecimento em ação?
Aline: O tema norteador da campanha buscou divulgar conhecimento sobre os direitos sociais, entre eles, o transporte, moradia, acesso à educação, saúde e assistência social, para dar visibilidade aos recursos públicos disponíveis e para constituir caminhos para fortalecer a participação popular na legitimação das políticas sociais. Desse modo, é imprescindível a necessidade de acesso às políticas públicas, permitindo cada vez mais e de forma progressiva a inclusão social e a emancipação das pessoas com deficiência intelectual e múltipla.