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A resistência do Quilombo do Cumbe frente a apropriação territorial


02/02/2023

VPAAPS/Fiocruz

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Em 28 de janeiro de 2023, o Quilombo do Cumbe, localizado no município de Aracati, que fica a cerca de 130 quilômetros de Fortaleza, no Ceará, recebeu a presença de estudantes e professores do curso internacional “A Saúde Coletiva em Diálogos com Epistemologias do Sul”. A vivência marcou o encerramento do curso que contou com a participação de integrantes da Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde da Fiocruz e estudantes de pós-graduação de vários estados.

João do Cumbe, liderança quilombola, doutorando em História e professor do curso, explica que a palavra Cumbe tem origem africana e significa quilombo. Já Aracati significa bons ventos. Nascido no quilombo do Cumbe, João tem uma história de resistência e luta pela preservação do território. Durante a visita, João contou a história da sua comunidade. São relatos que podem ser comprovados por documentos expostos em museus de Portugal.

Cerca de 170 famílias, com 800 pessoas, sobrevivem no Quilombo do Cumbe por meio da pesca, agricultura, criação de animais, artesanato e turismo comunitário. Diariamente a comunidade luta contra os impactos negativos ao meio ambiente, causados, segundo João, a partir da extração de água potável pela companhia estatal; do parque de energia eólica, da carcinicultura e das contaminações químicas, que têm gerado o desaparecimento de espécies nativas de peixes, a destruição do mangue e o comprometimento da permanência dos modo de vida da comunidade. 

De acordo com relatos, de tempos em tempos, a água dos reservatórios da carcinicultura, na qual se utiliza a água do rio da comunidade, precisa ser esvaziada. Essa água é lançada com resíduos químicos no mangue que fica ao lado dos tanques, causando enormes prejuízos ecológicos.

Já o parque eólico, composto por 67 torres, ocupa os campos de dunas, onde já foram encontrados 41 peças arqueológicas. Para a instalação das torres, a comunidade exigiu a construção do museu comunitário, na perspectiva da museologia social, para exposição dos artefatos.

No percurso pelas dunas que dão acesso à praia é possível ver diferentes sinalizações visuais com o aviso de “propriedade privada” e cercas que impedem a livre circulação da população. A comunidade precisa de permissão para entrar em seu próprio território.

A energia eólica considerada como “renovável e limpa”, pois provocaria menos danos ambientais, segundo a comunidade, gera impactos negativos para o meio ambiente como por exemplo os ruídos no ambiente, a colisão de aves nas hélices das turbinas, além do impacto na reprodução das tartarugas devido a luz emitida pelas torres na praia. O descarte incorreto de materiais que compõem esse sistema também provoca danos ambientais.

A interação com à realidade do Quilombo do Cumbe e as aulas do curso proporcionaram a ampliação do conhecimento sobre as disputas pelo território que agravam os conflitos e criminalizam lideranças. Além disso, enfatizaram a importância das lutas sociais das populações tradicionais em defesa de direitos e proteção socioambiental, o desrespeito ao seu modo de vida ancestral e a força econômica que exclui as populações. 

A vivência mostra que há necessidade de se conectar os conhecimentos da academia com os saberes populares e a preservação da natureza. A saúde, práticas agroecológicas, o cuidado e a espiritualidade são fundamentais para essa aproximação.

Sobre o curso - O curso do Programa de Saúde Pública da Escola Nacional de Saúde Pública é fruto da parceria entre Fiocruz Ceará, por meio do Programa de Pós-Graduação em Saúde da Família da Rede Nordeste de Saúde da Família (RENASF), Núcleo de Epistemologias, Ecologias e Promoção Emancipatória da Saúde da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP), Fiocruz Pernambuco e do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. Também conta com o apoio da Vice-Presidência de Educação, Informação e Comunicação (VPEIC) da Fiocruz. As aulas foram ministradas pelos professores Fernando Carneiro, Marcelo Firpo Porto, Marina Fasanello, Vanira Pessoa, Diogo Rocha, Juliano Palm, Vera Dantas, João Arriscado Nunes e Bruno Sena Martins, Eliete Paraguassú, João do Cumbe e Paulo Anacé.       

Fotos: VPAAPS e Fiocruz Ceará
 

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