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Pesquisadora fala sobre a resistência causada pelo uso indiscriminado de antibióticos


17/11/2015

Por: Lucas Rocha (IOC/Fiocruz)

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Uma das maiores ameaças à saúde global atualmente, a resistência aos antibióticos pode afetar pessoas de qualquer idade, em qualquer lugar do mundo. O alerta é da Organização Mundial da Saúde (OMS), que promove, entre os dias 16 e 22 de novembro, a Semana Mundial do Uso Consciente de Antibióticos (World Antibiotic Awareness Week). O objetivo é conscientizar a população, os profissionais de saúde e gestores públicos sobre a resistência causada pelo uso indiscriminado de antibióticos.

Pesquisadora do Laboratório de Pesquisa em Infecção Hospitalar do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), a bacteriologista Ana Paula Assef discute sobre o uso indiscriminado destes medicamentos, que pode ser uma das causas desse fenômeno, e fala sobre os desafios para o controle deste cenário. É no Laboratório do IOC, que atua como Centro Colaborador da Rede de Monitoramento da Resistência Microbiana Hospitalar (Rede RM), da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, que são processadas amostras de diversos estados do país para o esclarecimento de possíveis casos de surto e dos principais mecanismos de resistência circulantes no país. O espaço é responsável, ainda, pela curadoria da Coleção de Culturas de Bactérias de Origem Hospitalar do IOC (CCBH). Confira a entrevista.

O que são e como devem ser utilizados os antibióticos?

Os antibióticos são medicamentos capazes de matar ou inibir o crescimento de bactérias. Eles devem ser usados apenas no tratamento de infecções bacterianas, de acordo com prescrição médica, e sua eficácia está diretamente relacionada ao agente causador da infecção. Nem todos os antibióticos são adequados para uma mesma infecção.

O que define a resistência antibiótica?

A resistência aos antibióticos acontece quando determinada bactéria se modifica em resposta ao uso desses medicamentos – são as bactérias que se tornam resistentes e não os seres humanos. Com o uso inadequado de antibiótico, pode ocorrer um processo de ‘seleção’: enquanto as bactérias ‘sensíveis’ são eliminadas a partir desse contato, as ‘resistentes’ permanecem e se multiplicam.

Por que a resistência tem aumentado?

O uso indiscriminado desses fármacos por instituições de saúde, pela população e em práticas agropecuárias tem contribuído para o aumento da resistência aos antibióticos. A rotina hospitalar, por exemplo, conta com uma série de procedimentos invasivos que são portas de entrada para as bactérias – como a utilização de ventilação mecânica e de cateteres venosos. Em consequência ao aumento das infecções hospitalares associadas a estes instrumentos, o uso de antibióticos é intensificado, o que promove a seleção de bactérias resistentes neste ambiente. Outro quadro alarmante que favorece este aumento de resistência é a falta de sistemas de saneamento eficazes, que permite o lançamento de esgoto de hospitais e domicílios, sem o tratamento adequado, no meio ambiente. Na natureza, estas bactérias entram em contato com outros micro-organismos e antibióticos, fomentando um novo processo de seleção que potencializa a resistência. Águas poluídas ou alimentos contaminados podem colocar os indivíduos em contato com a bactéria que retorna ao hospital criando um ciclo. Já as práticas da agricultura e da pecuária também contam com o uso dessas substâncias em grandes quantidades. Um exemplo é o emprego do antibiótico como agente promotor de crescimento em porcos e galinhas.

Quais são os impactos desse fenômeno?

A resistência eleva os custos de tratamentos, prolonga a permanência dos pacientes nos hospitais e pode aumentar índices de mortalidade. Conforme os antibióticos vão se tornando ineficazes, o número de infecções que se tornam mais difíceis de tratar tende a aumentar. Com o esgotamento das ações terapêuticas, infecções que hoje são conhecidas por ter um tratamento simples, poderão, no futuro, causar danos maiores ao organismo, na medida em que teremos menos recursos para combatê-las.

Quais são as alternativas para contornar este cenário?

O desenvolvimento de políticas públicas que abordem o tema e incentivem mudanças de comportamento da população é extremamente necessário. A lavagem correta das mãos e dos alimentos, por exemplo, são práticas eficazes que devem ser estimuladas para a prevenção da transmissão de bactérias. Além disso, é importante cumprir as recomendações médicas sobre os antibióticos, evitando o uso por conta própria e a interrupção da duração do tratamento recomendado pelo médico. Já nas instituições de saúde, ambientes que apresentam altas taxas de contaminação por bactérias multirresistentes, é preciso ampliar o controle de infecção e agilizar a identificação da bactéria e do seu mecanismo de resistência. Estas iniciativas aceleram as ações de isolamento do paciente e evitam que o micro-organismo contamine outros indivíduos. É fundamental ainda que os profissionais de saúde estejam atentos ao uso de luvas e de equipamentos de proteção na manipulação de pacientes, e a higiene adequada de todos os espaços. Também é imprescindível estimular o desenvolvimento de novas drogas, visto que temos um número restrito de antibióticos no mercado que apresentam eficácia no combate às bactérias multirresistentes.

Quais são os riscos da utilização incorreta de antibióticos para os pacientes?

O indivíduo que utiliza um antibiótico inadequado, em dosagens diferentes da prescrição, ou que interrompem o tratamento sem recomendação médica se coloca em risco, uma vez que estas ações podem agravar a infecção e ocasionar o processo de seleção de bactérias resistentes, podendo tornar o uso do antibiótico ineficaz no caso de uma nova infecção.

Qual é a importância do investimento em pesquisa na área?

A limitação das drogas disponíveis para o tratamento de infecções bacterianas chama a atenção para investimentos em pesquisa que ampliem o estudo de novas formas de eliminação desses micro-organismos. Por mais que sejam formulados novos medicamentos, as bactérias continuam desenvolvendo mecanismos para se tornarem resistentes, o que mostra que o modelo de antibiótico que temos hoje não é mais tão eficaz. Para pensar em novas formas de combate, é importante estudar a estrutura da bactéria, conhecer os mecanismos de resistência e investigar novos alvos de antibióticos.

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