10/02/2020
Fundação Oswaldo Cruz
Em função dos acontecimentos recentes que vêm atingindo o consumo da água produzida pelo Sistema Guandu e distribuída para parte expressiva da população da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) tem se envolvido em diversas ações, incluindo inspeções no sistema e discussões com a Vigilância em Saúde estadual e municipais, Ministério Público Estadual, órgãos ambientais e universidades, bem como desenvolvido internamente análises de cenários. Nesse contexto, cumprindo seu dever institucional como instituição de Estado, integrante do Sistema Único de Saúde, expressa seu posicionamento frente à situação.
A Fiocruz entende que os agentes públicos de saneamento e de saúde pública possuem responsabilidades intransferíveis na condução dos procedimentos necessários para minimizar o impacto sobre a população. Nesse sentido, não se pode minimizar a dimensão do problema e nem criar um sentimento de pânico que não condiz com os riscos reais apontados para a saúde humana. A solução do problema deve estar baseada em transparência e evidências científicas.
Particularmente, o recente surgimento de detergentes na água do manancial, associado à prévia ocorrência de geosmina, confirma que as pressões sobre a qualidade da água do Rio Guandu não são momentâneas ou pontuais. Uma das lições desta crise é que se pode esperar a recorrência futura de eventos similares aos atuais, que serão exacerbados pela dinâmica das mudanças climáticas. É absolutamente necessário e urgente o planejamento de longo prazo da gestão das águas do Rio Guandu e de medidas de contingência e segurança da água, orientadas pela proteção da saúde da população, incluindo o sério enfrentamento da ocupação territorial na bacia do manancial e do controle da poluição das várias fontes existentes.
As obrigações do Brasil relativas aos direitos humanos à água e ao esgotamento sanitário requerem das autoridades envolvidas uma série de medidas de gerenciamento da atual crise, incluindo:
1. Assumir que a solução para a crise é de responsabilidade do poder público e não deve ser transferida para a população, sobretudo a mais pobre, que já se encontra em situação de ainda maior vulnerabilidade, pelos problemas com a qualidade da água;
2. Disponibilizar informações claras, reais e não ambíguas para os consumidores da água;
3. Incluir a participação popular na gestão da crise, de forma livre, ativa e significativa, em coerência com os princípios do SUS;
4. Fortalecer as ações de vigilância da qualidade da água e sua articulação com a vigilância epidemiológica dos agravos relacionados à água;
5. Incrementar as ações de controle da qualidade da água pela CEDAE, com intensificação da frequência de amostragem e a inclusão de parâmetros que possam contribuir com a explicação e a mitigação da crise, bem como com a antecipação de possíveis cenários futuros;
6. Implementar ações urgentes para impedir a continuidade da contaminação por esgotos sanitários, efluentes industriais e resíduos sólidos dos rios Poços, Queimados e Ipiranga, que desembocam próximo ao ponto de captação no rio Guandu; e
7. Desenvolver medidas emergenciais efetivas para a remoção da geosmina, detergentes e outros eventuais poluentes encontrados, considerando que o comprometimento das características estéticas da água tem levado a população a se abastecer de outras fontes de água, muitas vezes inseguras e financeiramente inacessíveis.
Por fim, cabe às autoridades de saúde pública e de saneamento orientar e dar assistência no início do ano letivo para o uso seguro da água.
A Fiocruz continuará à disposição e colaborando com os órgãos públicos responsáveis pelo controle e vigilância da qualidade de água.
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