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Políticas para mulheres deverão passar por fortalecimento do SUS


11/09/2015

Por: Luiza Gomes (Cooperação Social da Fiocruz)

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A Pré-Conferência Livre das Mulheres de Manguinhos reuniu cerca de 40 participantes na última quarta-feira (2/09), a maior parte de lideranças comunitárias da região. O debate foi orientado pelos mesmos quatro eixos estruturais da conferência que será promovida pela Prefeitura hoje e amanhã (11 e 12/09), pelo Estado do Rio de Janeiro, e pela Conferência Nacional, prevista para março de 2016. A Cooperação Social da Presidência da Fiocruz foi uma das apoiadoras na organização do evento.

O encontro acontece de quatro em quatro anos por força mobilização da sociedade civil organizada pelos direitos das mulheres, ONGs, movimentos sociais e lideranças dos territórios. “Essas conferências acontecem nos municípios, depois nos estados até chegar à grande Conferência Nacional de Políticas Para as Mulheres: debate norteador do que depois se tornará o novo documento de planejamento da Secretaria de Políticas Para as Mulheres da Presidência da República”, explicou Elizabeth Maria Fleury Teixeira, Coordenadora do Comitê Nacional Pró-Equidade de Gênero e Raça da Fiocruz, em nota de apoio ao evento.

Em torno das temáticas da “Contribuição dos conselhos de direitos da mulher e dos movimentos feministas para efetivação de direitos” (eixo 1), das “Estruturas institucionais e políticas públicas” (eixo 2), do “Sistema político com participação das mulheres” (eixo 3), e da criação do Sistema Nacional de Políticas para as mulheres (eixo 4), foram discutidas propostas e desafios de cada uma dessas grandes áreas em grupos organizados segundo o interesse das participantes. Em comum, a preocupação com o fortalecimento do Sistema Único de Saúde, e sua importância para efetivação de uma rede eficiência de assistência à mulher.

Pesquisadora dos impactos da violência institucional na vida das mulheres pela ONG Fase, Anelise Gutterres, que participou da conferência no grupo do Eixo 4, criticou a desarticulação entre as políticas públicas de assistência social, direitos humanos, educação e saúde, e apontou essa desconexão como uma das maiores causas da ineficiência dos serviços prestados à mulher.

 “Nós devemos nos perguntar por que os mecanismos que já são ofertados pelo Estado não dão conta. A Subsecretaria de Políticas para Mulher tem recurso para combater a questão da violência doméstica, mas o acesso a creche – que está diretamente relacionado à independência financeira da mulher em relação ao marido -, e todas as outras questões de empregabilidade, documentação e acesso a atendimento médico dependem de outras secretarias e ministérios”, analisou.

Uma das organizadoras do evento pela Organização Mulheres de Atitude (OMA), Rejany Ferreira, da Cooperação Social da Presidência da Fiocruz confirmou que a intersetorialidade é um dos maiores desafios para o pleno funcionamento de uma rede ativa de atendimento ao público feminino. “Junto à assistência muitas vezes negligente e até vexatória nas Delegacias Especiais de Atendimento à Mulher, ameaças de morte pelos parceiros, a falta de amparo psicológico e material são fatores que se configuram como determinantes sociais da saúde e redundam em forte sofrimento psíquico”, afirmou.

Outro ponto em debate foi a diversidade de perfis de mulheres e a relevância de se considerar todos eles na construção de políticas públicas. “Não é possível que a gente pense em um Sistema Nacional de Políticas para mulheres, por exemplo, pensando na mulher como uma só. Existem especificidades e diversas questões que atingem a mulheres, desde questão financeira até as questões locais. As mulheres são de vários ‘tipos’, e impactadas de muitas e muitas formas diferentes”, destacou Monique Cruz, da Casa da Mulher de Manguinhos.

Segundo Adriana Motta, da Sub-secretaria de Políticas para Mulheres da Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos, a idéia das conferências livres é justamente a de regionalizar a discussões sobre gênero, assimilando as problemáticas, desafios e horizontes segundo o ponto de vista de cada território. “O município do Rio de Janeiro é muito grande, daí a importância de acontecerem encontros por bairros, como esse em Manguinhos”, assinalou.

 “O Governo Federal está se movimentando para que a política oferecida em qualquer canto do Brasil seja regida pelos mesmos padrões, serviços e equipamentos fundamentais. E que funcionem bem”, concluiu Adriana Motta.

Além da representante da pasta, na mesa de abertura estiveram presentes Patrícia Evangelista, da Organização Mulheres de Atitude (OMA), Suellen Araujo, representante da Casa da Mulher Trabalhadora (Camtra) e Ariana Kelly, responsável pela Casa da Mulher de Manguinhos.

Críticas, propostas e sugestões por eixo temático

Eixo 1 –Contribuição dos conselhos de direitos das mulheres e movimentos feministas para efetivação da igualdade de direitos e oportunidades

Desafios

- Falta de divulgação das ações do Conselho de Direitos da Mulher (Cedim) e das entidades que fazem parte dele;

- Falta de informação e estruturação do Cedim;

- Falta de transparência acerca dos recursos utilizados pelo Conselho;

Avanços

- Criação dos conselhos estadual e municipal do Rio de Janeiro;

- Implantação de políticas públicas para enfrentamento da violência contra a mulher, implementadas a partir da luta do movimento feminista, como por exemplo, a Lei do Parto Humanizado - contra violência obstétrica – (Portaria nº11 de 07/01/15) e a Lei do Feminicídio (Lei nº 13.104/2015).

Eixo 2 – Estruturas institucionais e políticas públicas desenvolvidas para as mulheres no âmbito municipal, estadual e federal: avanços e desafios

Avanços

- Lei Estadual do Rio de Janeiro que prioriza a titularidade de imóveis doados pelo estado para fins de habitação popular à mulher integrante da família (Lei Complementar nº 144/2012);

- Estrutura de assistência e saúde melhorada;

- Multiplicação dos espaços institucionais de discussão de direitos da mulher;

Desafios

- Garantir com prioridade de atendimento o acesso à saúde para mães de pessoas com deficiência ou necessidades especiais;

- Fortalecimento das redes de serviços de atendimento à mulher para que os encaminhamentos para vagas de emprego e serviços públicos em geral, feitos por assistentes sociais, sejam realmente efetivados;

- Criação de creches noturnas ou 24h nos municípios;

- Criação de política de responsabilização do homem como pai;

- Aumentar fluxo de denúncias de violação de direitos das mulheres nas áreas de favelas;

Eixo 3 – Sistema político com participação das mulheres e igualdade

Recomendações

- Encorajar mulheres a disputar esses espaços de decisão (vizinhas que queiram ser candidatas, amigas, e familiares);

- Inserir nos espaços educacionais materiais acerca dos direitos das mulheres à semelhança do que se conquistou em termos do ensino da história dos povos do continente africano, e dos debates sobre diversidade de gênero e orientação sexual;

- Ampliar o percentual de mulheres na cota de gênero nos partidos políticos, garantindo ampla diversidade de origem: mulheres do campo, indígenas, da floresta, das periferias. Sugestão de ampliação para pelo menos 30% das legendas;

Eixo 4 - Sistema Nacional de Políticas para as Mulheres

Subsídios e recomendações

- Mapeamento de políticas de gênero em vigor em nível municipal e estadual, contrastá-las e verificar sua efetividade, identificar as razões pelas quais atendem ou não o público alvo, para só então, se decidir por criar novos mecanismos. Em síntese, produzir dados com maior qualidade sobre os serviços e o público atendido para gerar maior reconhecimento sobre especificidades locais, contribuindo assim, para um sistema com alcance nacional;

- Estudar as eventuais conexões entre as políticas públicas de âmbito geral (saúde, educação, trabalho, lazer, cultura,...), e os problemas estruturais contidas nelas. Os pontos cegos dessas políticas impactam diretamente as políticas específicas para mulheres;

- Desenvolver mecanismos de responsabilização dos executores da lei, inspirando maior compromisso por parte desses agentes. Exemplo: mulheres que recebem tratamento inadequado por delegados e policiais das Delegacias Especiais de Atendimento à Mulher;

- Identificação dos diversos perfis de mulher no âmbito nacional, não só na mulher urbana de renda mensal fixa, moradora de bairros do eixo centro-zona sul. Para constituir um sistema nacional de políticas para mulheres é preciso caracterizar esse público em toda a sua diversidade, analisando como cada uma é impactada pelas conjunturas econômicas, políticas, e geográficas de sua região.

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