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Pacientes recebem visita musical no Centro Hospitalar para a Pandemia de Covid-19


01/10/2021

Por: Antonio Fuchs (INI/Fiocruz)*

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Recentemente os corredores do Centro Hospitalar para a Pandemia de Covid-19 do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas foram invadidos por um som diferente dos aparelhos eletrônicos e das conversas dos profissionais de saúde que por lá circulam. A música passou a fazer parte da rotina dos pacientes internados nas alas da enfermaria graças à iniciativa de Luiz Felipe Miranda Rosa, técnico em radiologia que integra o grupo Doutores da Alegria. Observando todos os cuidados necessários, o músico toca seu violino, com um repertório diversificado, que vai do clássico ao popular, trazendo alegria e esperança para todos aqueles que contam os minutos para receberem alta e seguirem com suas vidas. “É emocionante poder expressar minha arte aqui dentro, ver o brilho nos olhos dos nossos pacientes e saber que, de alguma maneira, estou fazendo uma pequena diferença na vida deles”, afirmou Luiz.

Desde o mês de agosto que o violinista está tocando dentro do Centro Hospitalar. “Conversei muito com a Direção e com os profissionais da Comissões de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH) do Instituto para viabilizarmos a entrada do instrumento dentro da unidade, respeitando todos os protocolos estabelecidos contra a Covid-19, fazendo a higienização correta do violino tanto na entrada, quanto na saída”, informou Luiz, lembrando ainda que a música faz parte da humanização do cuidado e contribui na recuperação dos pacientes.

Para Mariana Machay, chefe do Serviço de Enfermagem do INI, todas as estratégias de humanização são de extrema relevância, não só para os pacientes, mas para os trabalhadores, principalmente em virtude do isolamento e do sofrimento causado pela pandemia de Covid-19. “Foram inúmeras perdas, inúmeras histórias dentro da nossa unidade e a música sensibiliza, toca a alma. E ao fazer isso, a gente se identifica e se emociona de uma forma muito positiva. O violino, em especial, traz a sensação de paz, independente do ritmo da música. Essa iniciativa do Luiz foi de extrema relevância não só por trazer um instrumento para dentro do hospital, mas por ser um próprio trabalhador que dedica parte da sua hora de folga para alegrar pacientes e funcionários”, destacou Mariana, informando também que existem diversos estudos que citam a musicoterapia como estratégia de promoção de bem no ambiente hospitalar. Ela compõe uma das ações dos profissionais do INI dentro do Centro Hospitalar, tendo como base a Política Nacional de Humanização do SUS.

Pablo Quesado, assessor de Gestão Hospitalar do INI, lembrou que os efeitos positivos da música na ativação de áreas do cérebro responsáveis pelas emoções liberam substâncias relacionadas à felicidade e ao prazer, e já são conhecidos pela ciência há tempos. E esses mesmos benefícios se aplicam na recuperação de pacientes hospitalizados. “Para a nossa sorte Luiz se voluntariou a empregar seu talento musical para ajudar os pacientes, indo além das contribuições da sua função original. Enquanto ele toca um repertório variado para aqueles que estão internados, toda a equipe envolvida no cuidado também sente a energia e o calor da música, recarregando as baterias para continuar a missão de cuidar. Sorte do INI em ter o Luiz no time e, como ele, muitos outros que estão fazendo a diferença na vida do próximo”, salientou.

A enfermeira de rotina da enfermaria L do Centro Hospitalar, Ana Claudia da Silva Vieira, considera muito válida a iniciativa do músico nos corredores da unidade. “O isolamento traz um diferencial na vida dos pacientes, principalmente com relação ao Covid-19. Como nós mantemos aqueles que estão internados longe da família, uma música que traga uma lembrança para eles se torna um conforto e é uma forma de mudar o ambiente e promover alegria para todos em um momento tão delicado”, disse.

Confira, abaixo, uma entrevista com Luiz Miranda Rosa, o violinista do INI.

Fale um pouco de você.

Luiz: Meu nome é Luiz Felipe Miranda Rosa, tenho 36 anos e sou técnico em radiologia aqui no Instituto. A radiologia é uma área vasta demais e aqui no INI trabalhamos com a radiologia normal, que é a radiografia, e na tomografia computadorizada, que vem sendo bastante utilizada para o diagnóstico de pacientes com Covid-19. Existem também a ressonância magnética, a mamografia, a densitometria, a medicina nuclear, a radioterapia, a radiologia industrial, a radiologia odontológica, a veterinária e a hemodinâmica. Eu já tenho 17 anos de profissão.

Há quanto tempo toca violino e como o instrumento entrou em sua vida?

Luiz: Comecei no violino há cinco anos, mas isso veio de outro instrumento porque já tocava violão. Me apaixonei pelo violino quando estava compondo uma música e precisava do som desse instrumento para ela. Aprendi a tocar aqui na Fiocruz. Estudava no descanso dos meus plantões noturnos. Comecei a tocar por paixão, mas faço alguns eventos quando me pedem.

Então é um autodidata?

Luiz: É, sou meio autodidata sim, mas foi a pior coisa que fiz, porque chegou o momento em que não conseguia mais evoluir no instrumento e tive que ir para uma escola de música onde aprendi as técnicas certas. Eu tocava instintivamente e na escola comecei a ter a formação clássica de violino. Tenho três anos de estudo na escola de música da Fundação de Apoio à Escola Técnica (Faetec) de Quintino.

Hoje me arrependo de não ter aprendido antes. Demorei a encontrar o violino como instrumento principal. Toco violão desde cedo, meu pai me ensinou e acabei me tornando autodidata no violão também. Com o violino isso não deu certo porque há muitos detalhes que, quando eu comecei, não faziam sentido, como a posição do arco, por exemplo. O som estava saindo e eu achava que estava no caminho certo. Com as aulas eu fui entendendo que a técnica e ter uma postura correta para segurar o instrumento eram coisas extremamente relevantes para tocar diversos repertórios musicais. A falta disso impediu a minha evolução quando estudava sozinho. Ficava tentando tocar alguma música e não conseguia.

É comum atribuir o violino à música clássica, mas seu repertório é bastante diversificado, correto?

Luiz: Fiz o caminho inverso com o violino. Comecei na música popular e somente depois estudei o repertório clássico. Gosto demais da música clássica, mas a minha ideia era outra. Queria tocar música popular com o violino e fazer com que as pessoas se envolvessem de forma mais direta, cantando junto. Claro que existem músicas clássicas que as pessoas conhecem porque são emblemáticas, mas eu realmente abracei o popular.

Tem algum gênero preferido?

Luiz: Não tenho um gênero preferido porque fico muito dividido entre o clássico e o popular. Eu tenho uma tatuagem de Paganini no braço [Niccolò Paganini – Gênova, 27 de outubro de 1782 / Nice, 27 de maio de 1840 – considerado o violinista mais famoso da história], que representa meu amor pelo clássico, mas o popular caminha lado a lado. Fico muito dividido, até porque atualmente a música clássica está um pouco esquecida e temos que mantê-la viva.

Toca violino em todos os locais em que trabalha? Como surgiu essa ideia?

Luiz: A ideia ocorreu justamente porque estava aprendendo a tocar e os pacientes falavam que era muito bom ouvir o violino enquanto faziam exames. Foi assim que surgiu a ideia de que poderia fazer isso para aqueles que não podiam vir até mim, pois trabalho em um setor muito específico que é só para aqueles que vão fazer uma radiografia ou tomografia. Além disso ingressei em um grupo de palhaçaria, o Doutores da Alegria, e seguia com eles pelas alas dos hospitais onde atuavam. Começaram a me chamar de Dr. Violino. Ninguém me conhecia ainda, mas ganhei esse apelido por conta do instrumento e acabou virando o meu nome no Instagram (@dr_violino_lf), onde apresento um pouco do meu trabalho.

Além de tocar no INI, também me apresentei no Hemorio e no Hospital Municipal Miguel Couto, mas veio a pandemia e os Doutores da Alegria não puderam mais entrar nos hospitais. Como eu já trabalhava dentro de um hospital fiquei pensando em como dar continuidade a essa ação. Aqui no INI os protocolos implementados contra a Covid-19 são muito rígidos, então conversei diversas vezes com a equipe das Comissões de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH) para chegar num consenso de como levar essa arte até os pacientes, e a Direção do Instituto abraçou a iniciativa desde o começo. Preparamos tudo com muito cuidado, sempre preocupados com a segurança dos pacientes, dos profissionais e a minha. Conversamos sobre normas e protocolos a serem adotados.

Há quanto tempo você está tocando no nosso Centro?

Luiz: Comecei em agosto deste ano, mas trabalho no INI desde 2011 como técnico de radiologia. Falo para meus amigos e familiares que posso sair de qualquer outro hospital, mas daqui do Instituto não. Eu digo que tenho minha vida pré-Fiocruz e pós-Fiocruz.

E como é a receptividade dos pacientes?

Luiz: É extremamente positiva. Dá pra ver a emoção no olhar daqueles pacientes que estão entubados, imóveis. Uma vez um paciente se virou e a enfermeira perguntou se ele estava bem. Ela estava preocupada e ele se moveu para conseguir bater palmas para mim. É indescritível essa sensação. Não tem nada melhor do que esse reconhecimento.

O violino é um instrumento pouco comum no cotidiano e levar ele até as pessoas, sair um pouco da rotina pesada e cansativa de um hospital me dá muito ânimo. Sempre que possível pergunto ao paciente que música gostaria de ouvir e a preparo. Para mim é muito gratificante ver o paciente pedindo algo para se sentir especial.

Em uma ocasião toquei para um paciente dentro da tomografia. Ele ia ficar um bom tempo na sala para fazer o exame e estava muito agitado e com dor. Peguei o violino e comecei a tocar. Ele foi se acalmando e conseguimos fazer o exame. Era um paciente que não estava verbalizando e eu acredito muito que a música consegue falar de outra forma com as pessoas, trazendo alguma memória.

E, claro, converso bastante com a equipe da Enfermagem, que me ajuda muito a descobrir que tipo de música o paciente gosta. Eu já vou direcionando cada música especificamente para o paciente, sabendo que ela representa alguma coisa para ele.

Você vai do clássico ao popular, mas tem alguma música favorita para tocar em suas apresentações?

Luiz: Algumas músicas eu amo ouvir e outras eu amo tocar. Para tocar, Love of my life (Queen) e Hallelujah (Leonard Cohen) estão sempre no meu repertório, junto com Black (Pearl Jam). Então posso dizer que essas três são as minhas favoritas.

Assista, na tela abaixo, um pot-pourri das músicas tocadas por Luiz Miranda Rosa, no dia 21 de setembro, na ala de pacientes não-covid do Centro Hospitalar para a Pandemia de Covid-19 do INI.

* Edição: Juana Portugal (INI/Fiocruz)

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