13/03/2020
Por: Cláudia Lima (Agência Fiocruz de Notícias)*
A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) lançou, nesta sexta-feira (13/3), o seu Plano de Contingência diante da pandemia do novo coronavíus (Covid-19). O documento é um conjunto de orientações, recomendações e medidas para garantir o pleno funcionamento da instituição e a proteção dos trabalhadores, estudantes, pacientes e demais frequentadores dos campi da Fundação em todo o país.
Disponível no Portal Fiocruz, o Plano traz orientações de ordem prática, que vão desde medidas de prevenção individual a proteção nos ambientes de trabalho, até recomendações sobre viagens e realização de eventos. Trata também de procedimentos nos casos de trabalhadores e estudantes com sintomas de doenças respiratórias, fluxo e comunicação entre os setores e manejo de casos suspeitos e confirmados.
O Plano será permanentemente atualizado, de acordo com o estágio da pandemia. Elaborado por um comitê dedicado de especialistas de várias unidades e áreas, sob a orientação da Coordenação de Vigilância e Laboratórios de Referência da Fundação, o documento segue os princípios de planos elaborados e colocados em prática por instituições internacionais que já passaram primeiro pela experiência.
Compromisso
“A minha saúde é a saúde do outro. O compromisso de todos é fundamental”, afirmou a presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima. “Não adianta uma norma se não houver uma cultura na instituição. A gente não está protegendo só a nossa saúde, está protegendo a saúde coletiva”, disse. A presidente destacou a recomendação de evitar concentrações de pessoas e restringir viagens. “Independentemente de eu ter boa saúde, tenho que evitar circular para não ser um agente de transmissão”.
A pandemia do novo coronavírus e o Plano de Contingência foram tema de debate na instituição durante a manhã, no programa on-line Sexta de Conversa. O programa, voltado para o público interno, foi criado pela Presidência para ampliar os canais de diálogo e participação dos trabalhadores na gestão da Fiocruz. Mensalmente, a presidente fala sobre vários temas e responde a perguntas via chat.
Como medida coletiva de prevenção e proteção diante da pandemia, a participação presencial foi suspensa nesta edição. Para a discussão (13/3), Nísia Trindade Lima convidou a chefe do laboratório de Vírus respiratório e Sarampo do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), Marilda Siqueira; a diretora do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz), Valdiléa Veloso; e o vice-diretor de Serviços Clínicos do INI/Fiocruz, Estevão Portela Nunes.
Nísia Trindade, Marilda Siqueira, Estevão Portela e Valdiléa Veloso (Foto: Peter Iliciev)
Informação confiável
Marilda Siqueira ressaltou a importância da comunicação no quadro atual. “Estamos em um momento em que a comunicação é essencial - clara, transparente e responsável”, afirmou. “Quer saber o que está acontecendo? Entre em um site confiável. Ninguém vai lucrar com a quantidade de fake news que temos por aí”, disse. A virologista ressaltou a importância da previsão de outras doenças e d os adultos manterem sua carteira de vacinação atualizada.
“Não temos uma vacina para o coronavírus, provavelmente não vamos ter em menos de um ano pelo menos. A Organização Mundial da Saúde [OMS] já identificou 20 empresas trabalhando nisso, mas até chegar à população, demora”, informou. “A vacina de Influenza não protege contra o coronavírus, mas é importante que os grupos contemplados tomem, porque é uma infecção respiratória a menos. Tem que ser tomada anualmente”, explicou. “Essa gripe é uma doença que nos debilita muito. O vírus já está circulando e os picos da doença são em abril e junho”.
Assistência
Estevão Portela Nunes reafirmou a importância da informação confiável para a população e fez um panorama da situação. “Não é a primeira vez que estamos passando por isso e certamente não será a última. Pela forma como o mundo é articulado, viroses emergentes e reemergentes surgem periodicamente. Cabe sempre reflexão para que a gente saia disso com algum legado´”, disse.
“A Fiocruz tem um histórico de enfrentamento. Dentro do INI, temos um trabalho nas linhas de pesquisa, mas também um trabalho de fortalecimento do SUS”, destacou. “Quando chegam ameaças assim, a nossa preocupação é com as pessoas mais vulneráveis, seja pela questão social, seja pela da idade. É nosso trabalho ajudar e fortalecer a atuação nesse segmento”, afirmou Estevão.
A diretora do INI alertou para que se evite o pânico. “Nós temos trabalhado reunindo informações e conhecimento, a partir dos casos ocorridos na China, para montar protocolos e planejar como vamos atender nossos pacientes e como trabalhar com a rede para gerar conhecimento”, contou Valdilea Veloso.
O INI é hospital referenciado para internações no caso de coronavírus, onde são atendidos pacientes encaminhados pela rede de postos de saúde. “Temos uma interação com os hospitais que trabalharam com a gente no surto da febre amarela. Com eles nós estamos estruturando uma colaboração para que nós possamos gerar rapidamente informações sobre manejo e tratamento de pacientes do coronavírus”, afirmou Valdilea.
Recomendações
De acordo com o médico infectologista Estevão Portela Nunes, as pessoas com sintomas de gripe que estejam bem - não tenham outras patologias que tragam risco para uma evolução grave da doença – devem ficar em casa. “Não há tratamento específico, ele é apenas sintomático. O melhor tratamento, como a presidente Nísia falou, é não se locomover”, disse.
Máscaras devem ser usadas apenas por pacientes que estão com sintomas respiratórios e precisam sair de casa. “Se não tiverem máscara, assim que chegarem ao serviço de saúde, devem se identificar como sintomáticos de doenças respiratórias para então receberem uma máscara”, explicou Estevão. Ele alertou para que as pessoas sem sintomas não usarem máscaras. “Os assintomáticos vão utilizar a máscara de forma inadequada e vão acabar desabastecendo os estoques para quem de fato precisa. Isso precisa ser falado. Não temos estoques infinitos de todos esses insumos”, destacou.
O médico reiterou o papel da Fiocruz na assistência. “O INI é referência para internação. O acesso inicial, a porta de entrada, é a rede básica. É assim que foi estruturado o atendimento e é importante para que possa funcionar adequadamente. Atendemos pacientes imunodeprimidos, pacientes graves”, afirmou. “A gente está fortalecendo a nossa articulação com a rede. Assim é a filosofia do SUS, trabalhamos de forma articulada”.
Valor do serviço público
A presidente fechou sua participação no programa destacando o papel das instituições públicas. “É um momento muito importante para que os servidores públicos mostrem o seu valor para a sociedade”, afirmou a Nísia Trindade Lima. “Temos que mostrar à sociedade como somos imprescindíveis. Sem a Fiocruz, não haveria diagnóstico. Sem a Fiocruz e a rede que trabalha pesquisa clínica no Brasil, não haveria uma resposta adequada a esse momento que vivemos”, disse.
O trabalho das duas cientistas brasileiras que lideraram o sequenciamento do novo coronavírus, divulgando sequência completa do genoma viral apenas 48 horas após a confirmação do primeiro caso da doença no Brasil, foi destacado pela presidente. O estudo foi conduzido por Ester Sabino, diretora do Instituto de Medicina Tropical da Universidade de São Paulo (USP), e Jaqueline Goes de Jesus, pós-doutoranda na USP, ao lado de outros pesquisadores do Instituto Adolfo Lutz (IAL), da Universidade de Oxford e do Instituto de Medicina Tropical da Universidade de São Paulo (IMT/USP).
“A epidemia nos traz ensinamentos. É o momento de reforçar o papel das instituições públicas”, concluiu Nísia Trindade Lima.
*Colaboraram Erika Farias e Leonardo Azevedo.
Mais em outros sítios da Fiocruz