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Fiocruz debate direito à alimentação adequada, agroecologia e saúde


03/04/2023

Angélica Almeida (Agenda de Agroecologia/VPAAPS)

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Diálogo sobre políticas públicas reuniu cerca de 130 representantes da sociedade civil, da Fiocruz e governo na última terça (28)

O  seminário “Direito Humano à Alimentação Adequada, Agroecologia e Saúde: políticas públicas de futuro” foi realizado na última terça-feira (28) na Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, em uma parceria da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) com a Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) e a Associação Brasileira de Agroecologia (ABA).


Foto:  Virgínia Damas (CCI/Ensp/Fiocruz)

A atividade envolveu cerca de 130 pessoas, entre elas representantes dos grupos da Fiocruz que atuam com agroecologia; membros de uma pluralidade de redes e movimentos nacionais da sociedade civil; e de conselhos: Conselho Nacional de Saúde (CNS), Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA) e Conselho Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (CNAPO).

Também compareceram representantes de diferentes pastas do governo federal: Ministério da Saúde (MS); Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDAAF); Ministério do Meio Ambiente (MMA); Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS); Ministério de Povos Indígenas (MPI); Ministério de Igualdade Racial (MIR); Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB); Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES); e Fundação Banco do Brasil (FBB).

Um dos objetivos do seminário foi debater a construção de políticas públicas de superação da fome, da desnutrição e da má alimentação, assim como de enfrentamento das desigualdades sociais e das mudanças climáticas, em um esforço articulado de diferentes setores do Estado e com intensa participação popular.

Na mesa de abertura do evento, Mario Moreira reafirmou a alegria de este ser o seu primeiro compromisso enquanto presidente da Fiocruz e a centralidade que a agroecologia vai assumir na agenda científica da instituição: “É tempo de reconstrução do país. Qualquer que seja o indicador social que a gente saque do cardápio de indicadores sociais, o país regrediu anos, talvez décadas. A questão da fome é algo inaceitável e que tem que ser prioridade absolutamente zero”, disse. 

Para Mario, todos os movimentos sociais e segmentos da sociedade têm que estar engajados no esforço de construção de outro padrão de desenvolvimento: “inclusivo, que reconheça a profunda desigualdade do país. Sem um combate incisivo que elimine essa desigualdade, a gente não vai ter um projeto de país justo. A Fiocruz vai assumir, junto com o governo e com a sociedade, o seu papel não só de desenvolver atividades no campo da agroecologia, mas sobretudo na nossa capacidade de articulação”, afirmou. 


Foto: Dione Torquato

A agroecologia no coração das políticas públicas 

O encontro sinaliza a possibilidade de reabertura de um diálogo sistemático com o governo federal. “Retomada”, “reconstrução” e “reencontro” foram termos que perpassaram a fala de diferentes gestoras e gestores, que também citaram vários desafios que estão colocados no atual cenário.

Lilian Rahal, secretária de segurança alimentar e nutricional do MDS, reforçou a necessidade de se recolocar a segurança alimentar e a sustentabilidade como centrais, a partir da recomposição de programas exitosos como o Bolsa Família, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), o Programa de Cisternas e o Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), bem como de avançar na “elaboração de novas geração de políticas que promovam sistemas alimentares mais saudáveis, mais sustentáveis e mais inclusivos, considerando a diversidade da nossa população”.

Rahal também avaliou que é preciso um olhar inovador e holístico para o combate à fome na rede urbana e maior articulação entre os sistemas, a exemplo do Sistema Único de Saúde (SUS), do Sistema Único de Assistência Social (Suas) e do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN), para identificar e intervir, de forma eficaz, nos casos de desnutrição ou risco de desnutrição.


Foto: Dione Torquato

A secretária-executiva do MDAAF, Fernanda Machiavelli, afirmou que a agroecologia vai pautar o desenho das políticas de futuro do governo, já que consegue confluir o combate à fome, o incentivo à produção de alimentos saudáveis, o reconhecimento da força das mulheres rurais, a construção de sistemas alimentares sustentáveis e saudáveis e a produção do conhecimento.

A secretária-executiva  também mencionou que abril será um mês marcado por anúncio de políticas para reforma agrária e que em maio o Plano Safra vai vir com a marca do alimento saudável, trazendo “uma marca não só da reconstrução, mas também dessas políticas de nova geração que a gente está desafiada a construir”, disse. 

Machiavelli se comprometeu com uma postura de permanente diálogo às agendas e provocações da sociedade civil, e de construção conjunta para que servidores públicos traduzam as demandas dos territórios em desenhos técnicos, que respondam às necessidades sociais.


Foto: Dione Torquato

Já o diretor-presidente da Conab, Silvio Porto, enfatizou o enorme desafio de reconstrução dos sistemas agroalimentares nos territórios, uma vez que “estamos em um processo de redução de alimentos cruciais como arroz, feijão, mandioca -que são importantíssimos na nossa base alimentar-, sem falar nos produtos regionais -frutas, verduras, raízes, legumes-, tão presentes e relevantes na nossa alimentação e que estão se perdendo, fruto de um processo hegemônico da indústria de alimentos e do crescimento avassalador das grandes redes de supermercados”.

Porto também dialogou sobre a importância de mudanças em políticas como o PAA a fim de atender povos indígenas e outros povos e comunidades tradicionais, a exemplo da flexibilização e regulamentação de novos documentos compatíveis com a realidade desses sujeitos, bem como de uma política de Assistência Técnica e Extensão Rural
(ATER) voltada às organizações que vão acessar o programa. A perspectiva de formação de preços mínimos dos produtos da sociobiodiversidade e a retomada de estoques reguladores, sem impactar a inflação de alimentos, foram outros pontos destacados na fala do diretor.

Em uma interação mais provocativa, Tereza Campello, da diretoria do BNDES, avaliou que, quando se fala em agroecologia, as primeiras associações feitas são com “produção”, “campo”, “produção de comida”, e que é urgente se olhar para a dimensão do consumo. 

Campello disse que os sistemas alimentares são grandes responsáveis pelo desmatamento, em uma agenda de produção não sustentável e que conduz o Brasil a taxas crescentes de obesidade. Neste sentido, defendeu que o Estado seja indutor do processo de transição agroecológica para enfrentar a emergência climática, superar a fome e garantir que o Brasil volte a produzir comida de verdade em quantidade suficiente.

"Quem promoveu o modelo atual foi o Estado brasileiro. Quando a gente olha cada grão de soja, está lá embarcado um subsídio gigantesco de investimento da Embrapa, das nossas instituições de pesquisa federais, da garantia de preço mínimo, isenção fiscal, crédito subsidiado… Cabe ao Estado ser promotor desta transição. Transição segura, responsável, para produzir de forma sustentável, não agressiva ao meio ambiente, que respeite a biodiversidade, que promova emprego verde”, afirmou. 

Já o membro da CNAPO Silvio Brasil considerou que o seminário é uma demonstração de como se constrói uma política pública de verdade, a partir da organização social: “Este trabalho que a gente vê exposto mostra a pujança e vitalidade da sociedade civil na construção do tema”, afirmou. Silvio espera que desta mesma forma se concretize a construção da Política Nacional de Agroecologia e do processo de construção de políticas de futuro, em permanente participação popular na formulação, acompanhamento e cobrança diária da efetivação de ações.

Mapeamentos de políticas e práticas de agroecologia e saúde

Parte do seminário foi dedicada ao lançamento de uma série de publicações que versam sobre políticas públicas de agroecologia implementadas nas esferas federal, estadual e municipal, bem como de experiências que expressam a convergência entre agroecologia e saúde e que podem inspirar aprimoramentos futuros. 

Um destes estudos apresentados foi o “Tecendo Redes de Experiências em Saúde e Agroecologia: resultados e reflexões a partir da sistematização de iniciativas construídas pela Fundação Oswaldo Cruz”. A publicação partilha resultados, reflexões e aprendizados de um processo de mapeamento e sistematização de experiências em saúde e agroecologia realizado entre 2020 e 2021, na plataforma do Agroecologia em Rede (AeR), fruto de uma ação conjunta entre a Agenda de Saúde e Agroecologia da VPAAPS, a Associação Brasileira de Agroecologia e a Articulação Nacional de Agroecologia.


Foto: Dione Torquato

 

 

 

 

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