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Evento discute desafios do acesso aberto para a ética em pesquisa


10/11/2023

Anne Clinio (VPEIC)

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Fórum de Comitês de Ética em Pesquisa envolvendo seres humanos (CEP) da Fiocruz e a Comissão de Integridade em Pesquisa (CIP) promoveram no dia 27 de outubro, a mesa de debates "Desafios do Acesso Aberto para a Integridade e Ética em Pesquisa” como parte da programação da Semana Internacional do Acesso Aberto, que é celebrada anualmente na última semana de outubro.  

O bate-papo, realizado no auditório Sérgio Arouca do Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS), foi iniciado por Ximena Illarramendi, coordenadora do CEP IOC, coordenadora adjunta da CIP e representante do Fórum de CEPs no Fórum de Ciência Aberta.

Mulher sentada em frente a armárioDescrição gerada automaticamente com confiança média A moderadora fez uma breve retrospectiva de ações da Fiocruz em prol da abertura do conhecimento, reconhecendo que promover o acesso aberto à literatura científica traz contribuições importantes tanto para a difusão do conhecimento científico para a sociedade quanto para a questão da reprodutibilidade em pesquisa.

No entanto, Ximena destacou que ainda existem muitos desafios. Ela reconhece que, durante a pandemia de Covid-19, a pronta adesão da comunidade científica ao Acesso Aberto possibilitou o rápido compartilhamento de informação que era fundamental para o enfrentamento da crise sanitária. A rápida aderência a inovações como o fast track e os preprints trouxeram muitos ganhos, mas ainda é necessário orientar pesquisadores, jornalistas e sociedade para um uso mais adequado de informações que são compartilhadas publicamente antes de passarem pela revisão pelos pares.  

"Por um lado, essas inovações nos possibilitaram avançar mais rapidamente em pesquisa, por outro lado, tivemos usos maliciosos e veículos de comunicação despreparados para lidar com esses novos formatos e dinâmicas. O caráter emergencial da pandemia reforçou a necessidade de transparência sobre protocolos adotados. Se as revistas científicas não fossem tão resistentes à publicação de resultados que não respondem a hipótese ou não são os esperados, teríamos avanços mais rápidos". destacou.  

Acesso Aberto deve ser uma estratégia de devolutiva para os participantes de pesquisa 

Jennifer Braathen, da Plataforma de Pesquisa Clínica do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI), que também atua como Coordenadora adjunta do Fórum de CEPs e membro da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa envolvendo Seres Humanos (Conep), concorda que a capacitação de pesquisadores, especialmente aqueles que atuam nos Comitês de Ética, é essencial.  

"A qualificação dos integrantes dos comitês de ética deve incluir diversas estratégias para dar retorno para os participantes sobre as pesquisas em que eles estão envolvidos, incluindo também temas relativos ao Acesso Aberto", ressaltou. "Nosso trabalho é defender os interesses dos participantes da pesquisa em sua integridade e dignidade, buscando contribuir para o desenvolvimento de pesquisa dentro de padrões éticos. Garantir devolutivas como o acesso à informação é parte da nossa atuação."  

Plataformas de preprint como ferramentas para escrutínio da ciência 

Em sua fala, Carmen Penido, do Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde (CDTS), fez um panorama sobre diversas  inovações no campo do Acesso Aberto e suas contribuições para a ética e integridade em pesquisa. Segundo a profissional, que também atua como coordenadora da CIP e é membro do Comitê Consultivo Internacional da Conferência Mundial sobre Integridade em Pesquisa (WCRI), ainda que a divulgação do conhecimento científico veiculado por preprints   tenha a fragilidade de não ser avaliado por pares antes da sua publicação, este formato de comunicação científica imprime mais transparência a todo o processo. Por estarem depositadas em plataformas abertas, preprints podem ser avaliadas em amplo espectro, por qualquer leitor ou expert da área, permitindo uma revisão aberta e ampla. 

 "Não tenho dúvidas que preprints contribuam para a integridade em pesquisa. A avaliação por pares de maneira aberta, seja de preprints ou de periódicos científicos, promove mais visibilidade e transparência ao processo, pois todos têm acesso aos comentários e críticas sobre o trabalho", afirmou. "Além disso, a avaliação por pares aberta pode fomentar mais qualidade dos pareceres.  Ainda, quando as identidades dos avaliadores são reveladas publicamente, pode haver mais responsabilidade no processo de revisão por pares". 

Ainda dialogando com temas do campo da integridade, Carmen, que também atua como representante da Fiocruz na Rede Brasileira de Reprodutibilidade em Pesquisa, destacou o papel que as plataformas de preprint podem ter na ampla divulgação e no escrutínio da ciência - uma atividade que considera essencial para o avanço de todos os campos de conhecimento.  

"Nessas plataformas, você pode acompanhar o desenvolvimento de um trabalho, acessar as suas diferentes versões até a sua eventual publicação como artigo científico em um periódico", lembrou. "A disseminação rápida, eficaz e transparente do conhecimento científico pode aumentar o seu escrutínio e viabilizar mecanismos de correção da literatura. Quanto mais fechada é a comunicação, mais difícil é encontrar erros e aprimorar a qualidade do conhecimento científico."  

Dentro do movimento pelo Acesso Aberto, este tipo de inovação é considerado por Carmen mais viável do que as publicações em periódicos que cobram taxas de processamento de artigos (Article Processing Charges, APC, em inglês), especialmente para grupos de pesquisa de países com restrições orçamentárias, com alta representatividade no Sul Global, levantando preocupações sobre a equidade no processo de publicação científica. “Este modelo impacta substancialmente no orçamento das instituições de pesquisa, tirando recursos já escassos para aquisição de insumos e bolsas. Além disso, não há transparência por parte das editoras sobre destino dos recursos obtidos pelas APCs.”, comentou Carmen.  

Retratação e memória institucional: como lidar? 

Finalizando o debate, a moderadora Ximena Illarramendi propôs uma reflexão sobre os possíveis procedimentos para os casos em que um artigo científico é retratado e está disponível no repositório institucional Arca. Atualmente, as revistas científicas registram publicamente uma nota de retratação, que sinaliza que um artigo apresenta problemas em sua metodologia, resultados ou integridade (retratação parcial) ou comunica o seu cancelamento enquanto referência confiável na literatura científica (retratação total). Qual seria o procedimento do Arca? 

“A retratação de artigos é vista como um estigma pela maioria dos pesquisadores, mas ela não deve ser entendida como uma punição, mas sim como um processo de correção da literatura. Para além dos casos de má conduta, acontecem os “erros honestos” que podem ser identificados por autores ou terceiros, comunicados ao corpo editorial e corrigidos. É possível compreender o motivo da retratação por meio das notas de retratação, que explicam ao leitor as causas desse procedimento. Além disso, os pré-registros de projetos e a submissão de protocolos contribuem substancialmente para a transparência, ética e integridade em pesquisa”, respondeu Carmen Penido.  

Durante o debate, as convidadas concordaram que o tema da retratação precisa ser melhor compreendido e vai além dos CEP e da CIP, envolvendo outros atores e demandando a elaboração de guidelines sobre como proceder nesses casos.  Como proposta inicial, foi sugerido o registro a retratação de artigos no repositório institucional Arca com a inclusão de uma nota em seus metadados. Dessa forma, de maneira análoga aos periódicos, o repositório estaria mantendo a transparência.   

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