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Debate na Ensp sobre a poluição nas praias cariocas apresentou soluções possíveis


05/05/2015

Fonte: Informe Ensp

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Em poucos lugares do mundo as praias ocupam um papel tão central no imaginário e na vida da população quanto no Rio de Janeiro. Da moça que passa a caminho do mar à luz que fez o pintor Paul Gauguin se encantar pela Baia de Guanabara, as águas que banham a cidade são fonte de inspiração, lazer e subsistência de boa parte dos 12 milhões de habitantes que hoje vivem no Grande Rio. A despeito de tanta importância, nossos mares, lagoas, rios e lagos não têm sido muito bem tratados ao longo da história. Para falar sobre o tema e tentar contribuir com possíveis soluções para a poluição das praias, o 2° DSSA Debate, evento organizado pelo Departamento de Saneamento e Saúde Ambiental da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), promoveu um encontro que discutiu os métodos de detecção da poluição das águas e os emissários submarinos. 

Ao introduzir o assunto, Paulo Barrocas, pesquisador da Escola, citou alguns números que mostraram o que se vive hoje, no mundo, quando o assunto é água e esgoto. Em 2012, a meta do milênio, conjunto de objetivos definidos pela ONU, foi atingido no que diz respeito ao acesso das populações à água potável. Entre 1990 e 2012, caiu de 24% para 11% o número de pessoas sem acesso a água. Mas quando se fala de esgoto, a meta de se ter 75% de pessoas com acesso não foi atingida. 

“Nesses doze anos, subiu de 49% para 64% o acesso a esgoto tratado, mas é um número ainda baixo. Nós temos que lembrar também que em alguns lugares você encontra uma situação em que, antes, 1% da população tinha acesso a esgoto e hoje esse número chega a 2%. Se for olhar friamente os números, isso significa um aumento de 100% no acesso, mas continuam sendo apenas 2% de pessoas com esgoto tratado, o que é muito baixo”, ponderou Barrocas.

A professora Marize Pereira Miagostovich, do Laboratório de Virologia Comparada e Ambiental do Instituto Oswaldo Cruz, deu sua contribuição ao debate falando sobre os métodos que têm sido desenvolvidos para medir a degradação da água a partir da quantidade de vírus encontrada nela. “Diferentemente de outros métodos, como a colimetria - detecção de bactérias -  a virologia em águas recreacionais ainda não foi padronizada. O momento que se vive é justamente esse, da padronização dos métodos de recuperação viral e extração para controle”.

Para dar a medida da importância do tema, Marize lembrou que as doenças diarreicas matam, diariamente, no mundo, duas mil crianças. O benefício que a virologia poderia trazer para a prevenção dessas doenças esbarra, ainda, em outro obstáculo. “É um método extremamente caro. O preço de se coletar água do mar é altíssimo. Custa uma média de 100 reais por amostra”, disse Marize.

Igualmente cara é a proposta do professor da UFF Júlio César Wasserman. Em sua fala durante o seminário, Wasserman defendeu adoção de métodos como a modelagem hidrodinâmica em tempo real, em conjunto com a colimetria e outras formas de se medir a qualidade da água. A hidrodinâmica permite, por meio de um monitoramento em tempo real da diânamica do vento, estabelecer a velocidade de dispersão do esgoto no mar. O método seria mais eficaz do que a colimetria, usada hoje pelos institutos que medem a qualidade da água no Rio, já que esta apresenta resultado somente 24 horas depois da coleta.

Wasserman reconhece que a modelagem hidrodinâmica é uma metodologia de alto custo, mas lembrou que estamos, mais uma vez, deixando passar a oportunidade de usar grandes eventos para implementar melhoras efetivas na qualidade de vida da população. “O custo é alto, mas não tanto se pensarmos em termos de jogos olímpicos. O custo poderia ter sido incorporado às obras que estão sendo feitas. Só que vai ser um fracasso, como foi a Copa, porque não temos capacidade de nos organizar para tentar melhora a qualidade da água, o transporte etc”.

O pesquisador da Ensp Renato Feitosa, último a se apresentar no seminário, destacou em sua fala as dificuldades que advém do fato de que o Rio de Janeiro dispõe de um contingente populacional enorme, espremido numa faixa litorânea pequena. Feitosa mostrou alguns gráficos onde foi possível visualizar como a dinâmica das marés não dá conta da dispersão de todo esgoto da cidade. No caso das lagoas, por exemplo, a troca com o mar é muito lenta. Falando da lagoa de Jacarepaguá, especificamente, ela é quase nula. “A poluição ali nunca vai sair. E não estamos falando só de esgoto, mas também de poluentes lançados pelas indústrias”. 

Para o pesquisador, embora não sejam ideais, os emissários submarinos são a solução que se apresenta no momento. Feitosa mostrou mapas que indicavam as cidades do mundo que contavam com esse tipo de tecnologia, incluindo o Rio de Janeiro. “Tem essa imagem da praia do Leblon. Ao contrário do que se pensa, não é o emissário que polui a praia, mas o esgoto que vem pelo canal do Jardim de Alah, pela Visconde de Albuquerque ou da Rocinha”.

Discussões como a promovida pelo 2° DSSA ganham destaque num momento como atual. Recentemente, a imprensa voltou a dar destaque para a poluição da Baia de Guanabara, que faz dela, no momento, imprópria para receber as competições das Olimpíadas de 2016. Enquanto espera que a chegada dos velejadores olímpicos traga novos ventos para as políticas públicas de meio ambiente e saúde, a população segue desenvolvendo suas formas de conviver com a degradação das águas. Em sua fala durante o debate, Júlio César Wasserman chegou a dizer que, hoje, é mais fácil confiar no próprio olho, para medir a sujeira numa praia, do que nos números da colimetria feita pelo INEA, o Instituto Estadual do Ambiente. A julgar pelo que os olhos veem, a conclusão é a de que a despeito de tantas agressões, a natureza, sempre tão generosa com o Rio de Janeiro, resiste bravamente. A pergunta que fica no ar é: até quando?

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