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Webinário debate problemas e desafios da população em situação de rua


03/09/2021

Tatiane Vargas / ENSP

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O Programa de Políticas Públicas e Modelos de Atenção e Gestão à Saúde (PMA), ligado à Vice-presidência de Pesquisa e Coleções Biológicas (VPPCB), apoiou por meio da Rede PMA sobre a Atenção Primária à Saúde o Webinário “Estar na rua e Covid-19 - velhos problemas e novos desafios”. O evento virtual foi organizado pelo grupo de pesquisa Marcador social de raça, acesso e cuidado à população negra em situação de rua, coordenado pelos pesquisadores da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz), Roberta Gondim e Paulo Bruno, abordou os diálogos acerca do fenômeno da população em situação de rua diante da questão racial, além dos desafios, estratégias e iniciativas de enfrentamento no contexto da pandemia. 

A pandemia da Covid-19 elevou ainda mais a vulnerabilidade das pessoas que vivem em situação de rua, ampliando o contingente populacional e mudando o perfil dessa parcela da população. Conforme dados de pesquisa realizada pela Prefeitura do Rio de Janeiro, 31% das pessoas estão na rua há menos de um ano. Dessas, 64% estão nessa condição por perda de trabalho, moradia ou renda. 

Entre os entrevistados, 42,8% afirmaram que sairiam das ruas se tivessem um emprego. Os novos integrantes da população em situação de rua agora são também trabalhadores que perderam seus empregos e casas devido à atual conjuntura, explicou a coordenadora da Rede Rio Criança e integrante da Comissão Especial dos Direitos da População em Situação de Rua do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), Marcia Gatto, participante do webinário, na matéria “Pandemia muda perfil de população em situação de rua e alerta para necessidade de políticas públicas”.

Webinário Estar na rua e Covid-19

A atividade foi realizada no dia 26 de agosto, pela manhã e durante a tarde. As pesquisadoras da ENSP, Roberta Gondim e Isabela Santos, participaram da abertura do evento. Além do coordenador da Cooperação Social da Fiocruz, Leonídio Madureira, e da também coordenadora da pesquisa “Marcador social de raça, acesso e cuidado à população negra em situação de rua”, Mayra Honorato, que coordenou a mesa “O estar na rua - diálogos acerca do fenômeno população em situação de rua em face da questão racial”, que iniciou o webinário. 

Participaram da mesa, Dario de Sousa e Silva, pesquisador da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ); Márcia Gatto, integrante da Comissão Permanente dos Direitos da População em Situação de Rua do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH); Magali da Silva, coordenadora do Observatório de Racialidade e Interseccionalidade; e Jaçanã Bouças, coordenadora Municipal do Movimento Negro Unificado de Niterói. 

Durante a tarde foi realizada a mesa “Lições da rua: Resistência, re-existência e sobrevivência - desafios, estratégias e iniciativas de enfrentamento no contexto da pandemia”, que contou com a participação de Vânia Rosa, coordenadora do Fórum Permanente sobre População Adulta em Situação de Rua do Estado do Rio; Inez Ignez, ex-moradora em situação de rua e voluntária no Coletivo Rua Solidária; Paulo Celso, representante do Movimento Nacional da População em Situação de Rua e ex-morador em situação de rua; Daniel de Souza, articulador do Consultório na Rua (Equipe Manguinhos); e Joilda Nery, integrante do Projeto Nós Nas Ruas.

O Estar na Rua

Dário de Souza Silva abordou em sua fala a necessidade das instituições públicas estarem envolvidas não apenas no debate, mas também na atuação e intervenção das questões sociais e raciais. O sociólogo fez um panorama da questão do ‘Estar na Rua’ (título do webinário), no contexto do momento de pandemia, destacando que todas as questões ligadas à desigualdade e ao padrão de responsabilidade que se necessita da sociedade, são questões indissociáveis da questão racial. “Estamos em uma sociedade fundada na desigualdade, essa desigualdade, entre as muitas estratégias coloniais, se fundou no extermínio e no uso/abuso dos corpos negros e indígenas”, analisou Silva.

Márcia Gatto destacou em sua fala a dificuldade da pesquisa com a população em situação de rua, dando como exemplo os dados. Segundo ela, não se sabe exatamente o contingente da população em situação de rua atualmente. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) de 2020, apontam aproximadamente 220 mil pessoas em situação de rua no Brasil. “Isto se agravou ainda mais com a pandemia. Os novos integrantes da população em situação de rua agora são também trabalhadores que perderam seus empregos e casas devido à atual conjuntura. Sem condições de continuar pagando por suas casas, essas pessoas foram para as ruas. Vemos famílias inteiras nas ruas: pais, mães e filhos. O número aumentou significativamente modificando o perfil”, alertou ela.

Magali da Silva defendeu que momentos como o webinário são necessários para o fortalecimento de laços e estratégias em defesa da democracia no Brasil, das políticas públicas e da ciência brasileira. Em seguida, destacou que o debate, pensado em uma perspectiva de totalidade – que busca compreender a condição humana a partir da sua inserção no trabalho – traz uma série de desafios para trabalhadores, mulheres, negros e populações dissidentes sexualmente. “Todos os marcadores de diferenças que citei potencializam o corpo negro que vive na rua”, afirmou ela.

Jaçanã Bouças expôs que diante de tanta falta de acesso e de oportunidade, as pessoas buscam as ruas como sobrevivência. “Muitas das vezes a rua significa para aquela pessoa um lugar mais seguro, o que é uma contradição, pois na teoria ninguém deveria viver nas ruas”, ponderou. Ao final das falas foi aberto o debate com os participantes do webinário.

Lições da rua

Dando continuidade ao evento foi realizada a mesa “Lições da rua: Resistência, re-existência e sobrevivência – desafios, estratégias e iniciativas de enfrentamento no contexto da pandemia”, coordenada por Lidiane Bravo, do PMA. Vania Rosa abriu o debate falando sobre sua vivencia como ex-pessoa em situação de rua, reforçando que estrou na luta pela sua experiência. “Estou aqui para mostrar como é possível sair dessa situação. A humanidade não está perdida”, comemorou. Em seguida, Inez Ignez destacou que são necessários mais debates como o webinário. 

“É preciso pensar na população em situação de rua, pois somos seres humanos. Os moradores de rua têm dificuldades nas coisas simples do dia a dia. Se está difícil para você, imagina para uma pessoa que não tem condições de entrar em um ônibus? São muitas coisas que levam a pessoa a essa situação de morar na rua. A maioria não se importa, por isso, eu agradeço imensamente a todos que se preocupam conosco”, destacou Inez. 

Daniel de Souza apresentou alguns dados do perfil socioeconômico da população em situação de rua. Em sua maioria composta de homens negros, entre 20 e 49 anos. Ele destacou que estar na rua sendo mulher (em sua maioria negra) expõe uma vulnerabilidade dobrada. Souza também abordou em sua fala que pessoas em situação de rua sofrem barreiras de acesso muitas vezes pelo estigma.

Joilda Nery encerrou o webinário apresentando o projeto “Nós nas Ruas: saúde coletiva enfrentando a pandemia da covid-19 na população em situação de rua”. Ela descreveu as ações desenvolvidas de março a setembro de 2020 e alguns desdobramentos do projeto. Ao final das falas foi aberto o debate com os participantes do webinário.

Assista no canal da Asfoc no YouTube, a mesa na íntegra:

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