Populações relatam problemas vividos com transposição do rio São Francisco, em Pernambuco

Construção de casa de alvenaria que não comporta toda a família e seus objetos. Escolas e postos de saúde erguidos fora dos padrões determinados pelos ministérios da Educação e da Saúde, respectivamente. Diminuição da produção agrícola. Esses foram alguns problemas relatados por quilombolas, indígenas, trabalhadores rurais e acadêmicos na oficina promovida na Fiocruz Pernambuco em 27/8, evento que buscou integrar e articular experiências e saberes de representantes de entidades e de grupos sociais diretamente envolvidos e afetados pelo projeto da transposição do Rio São Francisco.

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Sertânia, José Monteiro de Almeida, esteve presente no evento. Para ele, os maiores impactos da transposição em sua cidade estão sendo sentidos na área ambiental, por causa da agressão que o solo e as plantações vêm sofrendo. “Canais do rio estão sendo construídos em terras férteis, com cacimbões e várzeas”, afirma. Almeida calcula uma queda de 10% a 20% na produção agrícola de Sertânia por causa das obras. Ele relatou, ainda, o aumento de doenças respiratórias e da poluição sonora.

Membro da associação quilombola de Contendas, em Salgueiro, Francisca Souza, relatou que muitas famílias dessa comunidade estão deixando suas casas, feitas de taipa e com vários cômodos para abrigar grande número de pessoas, para morar em casas de alvenaria, nas quais não cabem todos os familiares e nem mesmos seus móveis e outros objetos. “Isso se tornou um problema. E a família só recebe a casa de alvenaria se derrubar a de taipa. Quem tem condições financeiras aumenta o imóvel (recebido). Quem não, vai morar no apertado e se desfazer de suas coisas”, contou ela. 

Coordenador do projeto Estudos Ecossistêmicos dos Territórios e Populações Vulnerabilizadas na área de Abrangência do Projeto de Integração do Rio São Francisco, que organizou a oficina, o pesquisador da Fiocruz PE André Monteiro atribui esses problemas à forma que o processo de transposição está sendo conduzido. De acordo com ele, as populações atingidas por essa ação não estão sendo ouvidas sobre suas necessidades e não há diálogo do Governo Federal com municípios e estados para evitar ou minimizar essas questões. 

Visando conhecer de perto os problemas relatados na oficina e os locais que sofreram maiores impactos causados pela transposição, cinco integrantes do projeto coordenado por Monteiro percorrerão oito cidades do estado: Sertânia, Floresta, Betânia, Custódia, Salgueiro, Cabrobó, Entremontes e Petrolândia. Com base nos dados coletados, serão definidos pontos onde serão aplicadas entrevistas com o objetivo de aprofundar as informações sobre a realidade local.

O projeto de transposição do São Francisco envolve, além de Pernambuco, os estados do Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte, envolvendo 390 municípios. O empreendimento, iniciado há sete anos, prevê a recuperação de 23 açudes e a construção de outros 27 reservatórios, que funcionarão como pulmões de água para os sistemas de abastecimento do agreste, fornecendo 6m³ por segundo.