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Fiocruz recebe rei do povo iorubá em Colóquio Brasil-Nigéria

Ooni de Ifé

21/06/2018

Fonte: COC/Fiocruz

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Com a presença do rei de Ifé, da cidade nigeriana de Osun, a Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz) realizou, na última quarta-feira (13/6), o Colóquio Brasil-Nigéria: Conhecimentos Tradicionais e Saúde, em Manguinhos (RJ). Em sua primeira visita ao Brasil, o representante cultural e espiritual do povo iorubá, acompanhado de sua comitiva, foi recepcionado pela Presidência da Fundação Oswaldo Cruz no Castelo Mourisco e participou da abertura do evento na Tenda da Ciência Virgínia Schall do Museu da Vida.

A visita de Ooni de Ifé ao Brasil integra as atividades da Década Internacional dos Afrodescendentes, estabelecida pela Unesco de 2015 a 2024, e teve como principais objetivos o intercâmbio cultural, econômico e intelectual entre o povo iorubá e a sociedade brasileira. Em seu pronunciamento, Sua Majestade Imperial agradeceu a acolhida que recebeu em Manguinhos e celebrou os laços de união entre Brasil e Nigéria, as “duas maiores nações negras do mundo”. “Queremos mostrar que os ensinamentos que recebemos dos nossos ancestrais são reais e podem ser compartilhados com todos”, afirmou o rei de Ifé.

Ao lado de uma comitiva formada por pesquisadores, empresários, intelectuais e líderes espirituais da cultura iorubá, Sua Majestade Imperial anunciou o estabelecimento de parcerias com a Fiocruz. “Nós estamos trabalhando para trazer o conhecimento da medicina tradicional iorubá não só para o Brasil, mas para a América Latina e todo o mundo. Deus criou as doenças, mas Deus criou também as soluções para essa doença. Tudo isso é dirigido pela natureza, é a combinação de forças da natureza”, afirmou. Ao fim de seu discurso, o monarca também entregou aos representantes da Fiocruz um presente que simboliza a proteção à vida humana.

Representando a presidente da Fiocruz, Nisia Trindade Lima, que estava em missão institucional em Moçambique, o vice-presidente de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde (VPAAPS), Marco Antonio Menezes, enfatizou o “momento histórico” da visita do rei de Ifé a Manguinhos. “A cultura tradicional do povo iorubá faz parte do que a Fiocruz reconhece como saúde em seu conceito mais amplo”, explicou. Na mesma linha, o diretor da Casa de Oswaldo Cruz, Paulo Elian, ressaltou o esforço da Fiocruz no desenvolvimento de ações de cooperação internacional. “Que nós possamos desenvolver uma cooperação que considere a história, a herança, as tradições e tudo o que esses povos vêm realizando ao longo da sua história”, disse.

O colóquio

Com o tema Conhecimentos Tradicionais e Saúde, o Colóquio Brasil-Nigéria contou com a participação de especialistas em saúde do povo iorubá, que revelaram como a sua cultura trata e cura doenças. Doutora em Filosofia Iorubá pela Universidade de Ibadan (Nigéria), Sophie Oluwole, da Universidade de Lagos (Nigéria), destacou a importância das ervas na medicina iorubá. “Há 35 anos eu pesquiso os segredos da medicina iorubá. É um conhecimento de valor inestimável, que precisa ser passado adiante”, frisou Sophie Oluwole. Ainda de acordo com a pesquisadora nigeriana, o seu maior desafio é superar os preconceitos que a cultura iorubá enfrenta até hoje. “A pergunta é: a África tem conhecimento? Eu digo que sim”, declarou Sophie, que afirmou ter conseguido a cura para a sua catarata a partir do tratamento com plantas medicinais. “No Ocidente, certamente eu passaria por uma cirurgia”, completou.

Doutor em Filosofia da Ciência pela London School of Economics and Political Science, Kólá Abímbólá explicou a importância das divindades na cultura iorubá, responsáveis, em última instância, por “fazerem coisas que fogem à normalidade”. “Para o povo iorubá, o natural e o sobrenatural fazem parte do mesmo processo de tratamento e de cura”, disse. Professor da Universidade Howard, nos Estados Unidos, Kólá Abímbólá disse estar honrado em compartilhar seus conhecimentos com os colegas brasileiros e comentou que as “bênçãos sempre fluem das divindades”. Com poemas cantados na língua iorubá, Kola Abimbola também falou sobre as bases de sua filosofia. “Nós sentimos a necessidade de invocar o divino em muitas situações. No caso da saúde, quando o divino está presente, sempre é possível a cura”, argumentou.

Representando o presidente da Herbal Society of Nigéria, Akintunde Ayeni, a médica herbalista Funmilayo Ogunyobi disse ser possível tratar “todo tipo de doença” com folhas e ervas medicinais. Segundo ela, esse conhecimento é antigo e reconhecido por sua eficácia em países que são referência nessa área, como China e Índia. Mesmo assim, “as pessoas não dão a devida atenção aos medicamentos tradicionais”, lamentou Funmilayo Ogunyobi. A médica e pesquisadora lembrou os críticos, que diziam serem os preparos de unguentos usados em encantamentos, visando desencorajar a adoção da medicina tradicional. “Contudo, os governos começaram a perceber que a medicina alternativa tinha importância, como complemento à medicina ortodoxa ou tradicional”, afirmou.

Ao final de sua curta conferência, Funmilayo Ogunyobi lembrou o conceito de saúde adotado pelas Nações Unidas no final da década de 1940, que vai além da mera ausência de doenças: só é possível ter saúde quando há completo bem-estar físico, mental e social. Para Funmi, a medicina tradicional está sendo praticada juntamente com a ortodoxa na Nigéria; é disseminada e reconhecida em um nível mais abrangente, também, em outros países.

Professor titular de Artes Performáticas da Universidade de Ilorin (Nigéria), Jeleel Ojuade também participou da mesa abordando a música e sua influência na saúde. Segundo ele, o povo iorubá soma cerca de 600 milhões de pessoas no planeta. “Veio do centro do mundo e se espalhou”, disse. Ao falar sobre o Bata, uma dança típica iorubá considerada de desempenho difícil, recorreu à mitologia religiosa. Segundo Jeleel, ela está associada à adoração de Xangô, deus do trovão e relâmpago. Por isso, seu desempenho é marcado por grande dispêndio de energia. A cultura iorubá utiliza instrumentos musicais de diversos tipos, alguns feitos com pele de animais. “Nosso povo não acredita em matar animais por diversão”, ressaltou. Há instrumentos como idiofones, xilofones e membranafones. O professor lembrou que a música está presente também no figurino da comitiva real. As roupas trazem acessórios que produzem sons, para instruções ou passar mensagens.

Estudioso do Bata, Jeleel Ojuade desenvolveu o estudo Secularizando o ocultismo: trajetórias religiosas e sociais do desempenho de bata no Sudoeste da Nigéria. Segundo ele, ao longo dos anos, a dança tem sido cada vez mais secularizada, desmistificando sua sacralidade. O estudo teve como objetivo aumentar a aplicação do Bata em eventos religiosos tradicionais, permitindo que estudiosos e aspirantes a dançarinos possam entender sua linguagem.

Veja mais fotos do encontro no site da Casa de Oswaldo Cruz.

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