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Fiocruz é local de acolhimento para população trans

28/06/2023

Cogepe

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Desde maio de 2018, o campus de Manguinhos da Fiocruz abriga o ônibus do Programa Justiça Itinerante, iniciativa do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que atende aos moradores das comunidades da Maré e Manguinhos, população formada por cerca de 180 mil pessoas, sendo a maioria mulheres e mais de 60% pretos e pardos. As audiências acontecem nas quartas-feiras, das 9h às 15h. “Nós ganhamos em qualidade e em quantidade de atendimentos porque as pessoas têm a Fiocruz como um local seguro”, explica o juiz responsável pelo Programa na Fundação, André Brito.

No dia 21 de junho, o magistrado conversou com os trabalhadores da Coordenação-Geral de Gestão de Pessoas (Cogepe) e dos Serviços de Gestão de Pessoas das unidades em reunião realizada no prédio da Coordenação de Saúde do Trabalhador (CST/Cogepe). André focou sua apresentação no atendimento à população trans, em especial nos processos de redesignação de nome e gênero, uma demanda que, segundo o magistrado, foi solicitada pela própria Fiocruz quando do início das atividades da Justiça Itinerante no campus. A palestra está disponível no canal da Cogepe no YouTube.

A coordenadora da Cogepe, Andréa da Luz, explicou que o evento é mais um desdobramento do “compromisso de formação em diversidade” que a Cogepe desenvolve desde o início do ano com objetivo de capacitar as áreas de gestão de pessoas da Fundação. As palestras são organizadas pela Coordenação de Desenvolvimento de Pessoas (CDP/Cogepe) e Escola Corporativa Fiocruz. “É fundamental que as áreas de gestão de pessoas desta instituição, que defende valores de direitos humanos para a sociedade como um todo, possam avançar não só na questão dos registros, mas do conhecimento desse universo, da cidadania. Essa formação que estamos fazendo coletivamente é porque precisamos nos qualificar e abrir nossos horizontes. Nós somos o Estado e não podemos ser discriminadores e preconceituosos. Temos que acolher a todos”, disse Andréa.

Carência de dados em relação à população LGBT+

O ônibus da Justiça Itinerante mantém a composição de um cartório com defensor público, promotor e juiz. “A Defensoria atende a quem chega e as audiências acontecem no ônibus. Todos os processos são levados para um cartório fixo no centro da cidade”, explicou André Brito. O atendimento mais específico à população trans ganhou volume quando houve a mudança para a Fiocruz. Desde então, cerca de 3.000 ações de redesignação de nome e gênero foram realizadas pela Justiça Itinerante no campus de Manguinhos. “Nós temos esse atendimento diferenciado, de atender essas pessoas na requalificação de nome e gênero, porque a Fiocruz faz um atendimento especializado às pessoas transgênero”, explicou Brito. Além da redesignação, o Programa Justiça Itinerante também atua em ações de casamento, divórcio, alimentos, guarda, convivência, tutela e curatela.

Não existe censo sobre a identificação quantitativa e qualitativa da população trans e não binárie, nem leis específicas sobre seus direitos, realização de casamento civil e troca de nome ou gênero em documentos. Os processos são amparados na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4275 DF), do Supremo Tribunal Federal (STF), e no Provimento 78/2018 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Hoje, estima-se que cerca de 1,9% da população brasileira seja de transgêneros ou não bináries, ou seja, 4 milhões de pessoas. “Quando a gente fala em pessoas diversas é porque todo mundo é diferente. Nossa Constituição, felizmente, consagra a igualdade perante a Lei. Só que nós vivemos em uma sociedade hierarquizada. Essa igualdade é válida em cada segmento. Nós não temos igualdade se pegarmos uma pessoa preta e pobre e colocarmos ao lado de um homem branco e rico. O tratamento será desigual. Essa desigualdade será verificada nas mínimas coisas e, infelizmente, até em coisas importantes como o tratamento policial e o comportamento do Poder Público. Buscar a igualdade e aceitar a diversidade é uma obrigação de todos nós”, afirmou Brito.

O juiz falou que a todo momento novos direitos surgem e são incorporados ao dia a dia da sociedade. Um desses novos direitos, classificado como de quarta geração, é o da pessoa ser o que quiser ser. “Você deve ser respeitado nessa decisão de que é como você se vê e de como quer que a sociedade lhe veja”, pontuou o magistrado. Brito falou sobre a ampliação no reconhecimento de um novo gênero sexual: o não binárie, que é a pessoa não identificada nem como homem, nem como mulher. “Na verdade, você pode se enquadrar em qualquer público, ou mais perto de se identificar como homem, ou de se identificar como mulher, ter qualquer tipo de comportamento que se sente identificado. Atualmente, se reconhece homem, mulher ou não binárie”, disse o magistrado. No primeiro evento na Fiocruz de requalificação de não bináries, enfatizado pelo magistrado com o uso da linguagem neutra, teve a presença de quase cem pessoas. “A linguagem neutra não é para obrigar todo mundo a usar. É para reconhecer a existência de pessoas que não se consideram nem homem, nem mulher. Quando a gente for falar com alguém e tiver dúvida sobre o gênero daquela pessoa, pode perguntar. Isso não é vergonha e a pessoa não se sentirá ofendida. Pelo contrário, ela se sentirá respeitada. E se, eventualmente, errarmos, é só pedir desculpas e acertar”, esclareceu Brito.

Sobreviventes 

O magistrado apresentou dados sobre violência cometida contra a população transgênero. A expectativa de vida deste grupo no Brasil é de apenas 36 anos. Desde 2008, 1374 trans foram assassinados em 60 países. O Brasil lidera o ranking com 539 ocorrências, cerca de 40% do total. Só em 2022, o número de mortos no país foi de 131. Metade dos casos com uso de arma de fogo e em 65% com crueldade. Do total de mortos, 76% eram negros ou pardos. Ao mesmo tempo, o consumo de pornografia na categoria transgênero no país subiu em 75%. “Quando aquela pessoa transgênero está na sua frente, olhe para ela com admiração porque ela sobreviveu à família, ao colégio, à rua e ao Estado. Justamente porque ela foi expulsa de casa e a única opção que restou a esse ser é se prostituir. Hoje, nós não vemos pessoas trans ocupando lugares que consideramos normais, como professor, médico, atendente, balconista porque elas foram assassinadas ou empurradas para a prostituição”, enfatizou Brito.

 

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