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Dossiê aborda o impacto da pandemia nos povos indígenas


09/02/2021

Por: Ricardo Valverde (Agência Fiocruz de Notícias)

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A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), em parceria com a revista Vukápanavo e o apoio da Fiocruz, lançou o dossiê Pandemia da Covid-19 na vida dos povos indígenas. Segundo os editores do dossiê, Braulina Baniwa, Felipe Cruz Tuxá e Luiz Eloy Terena, a Covid-19 desenhou um cenário inesperado não só no campo epidêmico-biológico, mas também no que diz respeito às políticas sociais de cuidados, a prevenção e atenção à saúde dos povos indígenas. A pandemia também trouxe o desafio de compreender seus múltiplos desdobramentos considerando seus impactos econômicos, culturais, históricos e políticos nos cotidianos das comunidades indígenas. A publicação contou com o apoio da Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde da Fiocruz, por meio do projeto Aprimoramento do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena, através do desenvolvimento de estudos técnicos, pesquisas científicas e ações estratégicas, essenciais para a diversificação, ampliação e qualidade dos serviços de saúde prestados aos indígenas.

De acordo com Braulina Baniwa, Felipe Cruz Tuxá e Luiz Eloy Terena, o dossiê Pandemia da Covid-19 na vida dos povos indígenas “se insere na percepção que estamos passando por um divisor de águas na história indígena no país concernente à conquista de maior autonomia e autodeterminação, inclusive ao que se destina a produção de memórias indígenas sobre a pandemia”. Eles afirmam que “foi a partir desse pressuposto que buscamos juntar diversidade de reflexões acerca do impacto da pandemia de Covid-19 sobre os povos indígenas”.

Os editores observam que a publicação reúne análises teóricas, etnográficas e autoetnográficas que retratam questões específicas que abarcam a vida dos povos indígenas diante de uma crise repentina que assolou os territórios indígenas, os serviços de saúde, o sistema educacional, a saúde física e mental, a economia com seus modos de produção e consumo, a convivência familiar, as relações e condições de trabalho, as relações afetivas, a liberdade e o deslocamento. E, em especial, os modos de vida, de forma a ecoar por diversas gerações indígenas e outros pesquisadores.

No primeiro ensaio da coletânea, escrito por Aleixo, Aureliano & Lima, foram abordadas situações de conflitos sociais e mobilizações dos povos indígenas de Roraima, com foco no contexto pandêmico. Foi identificado um aumento de invasões em terras indígenas, bem como fortes mobilizações desses povos e um fortalecimento de suas organizações políticas. Em reflexão autoetnográficas, Rezende Sarmento buscou identificar os desafios e superações da Covid-19 na vida do povo tuyuka-utapinõponã a partir de seus ritos sagrados, elementos fundamentais aos quais as famílias da comunidade recorreram para curar a doença e proteger seus membros.

Ballerio Guajajara & Santos traçaram reflexões, por meio da interseccionalidade de gênero e etnia, acerca dos diversos cenários que se descortinam através da pandemia. Trouxeram como premissa a complexidade estrutural e formativa das sociedades indígenas, para em seguida discutir e compreender o gênero, apresentando-o a partir das percepções de como as mulheres indígenas têm resistido no contexto pandêmico.

Guimarães & Veron também realizaram um recorte de gênero ao discutir as experiências das mulheres indígenas kaiowá no contexto do Covid-19. As autoras refletiram sobre a relação entre essas mulheres e o conhecimento, bem como sobre o tempo da pandemia e sua compreensão pela temporalidade indígena. Em seu artigo, Coquillard Ayres analisou os efeitos da pandemia sobre povos indígenas em isolamento voluntário, levando em conta o risco de genocídio a que estão submetidos graças às tentativas de modificar a consolidada política de não contato e de respeito à autonomia dessas populações vulneráveis.

O dossiê traz ainda outros artigos escritos por pesquisadores e pesquisadoras indígenas, um texto de Michael Yellowbird, reitor e professor da Faculdade de Serviço Social da Universidade de Manitoba, no Canadá, e um relatório técnico. Yellowbird é membro das etnias mandan, hidatsa e arikara de Dakota do Norte e sua pesquisa investiga os efeitos de um estilo de vida ancestral, com foco no microbioma indígena, e práticas como a dieta e o jejum, além de estudar os efeitos da colonização e métodos de descolonização. O texto que encerra o dossiê é um relatório técnico sobre o risco iminente de contaminação de populações indígenas pelo novo coronavírus em razão da ação de invasores ilegais.

A Apib é uma instância de referência nacional do movimento indígena e aglutina organizações regionais. Ela foi criada com o intuito de mobilizar povos e organizações indígenas contra as ameaças e agressões aos direitos. A revista Vukápanavo é constituída por pesquisadores terena de Mato Grosso do Sul e tem periodicidade semestral. Destina-se à publicação de trabalhos acadêmicos, documentos, traduções, cadernos de imagens e registros audiovisuais relacionados aos terena e a temas como a história e a mitologia terenas, as terapêuticas tradicionais e a saúde indígena, as expressões artísticas e religiosas, os direitos originários e constitucionais, as relações estabelecidas com outros povos indígenas, com o estado e a sociedade brasileira. No idioma terena, vukápanavo significa "avante", palavra que também expressa o momento de despertar na luta pelo reconhecimento dos direitos. 

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