03/06/2016
Por: André Costa (Agência Fiocruz de Notícias)
O segundo dia do seminário A sustentabilidade do direito à saúde e do Sistema Único de Saúde, que encerrou o Curso de aperfeiçoamento em política e gestão da saúde pública para o Ministério Público foi marcado por declarações em apoio ao SUS por parte do presidente da Associação de Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Gastão Wagner de Sousa Campos, de promotores de justiça recém-formados pelo curso e de juristas convidados.
Gastão Wagner fez uma enfática defesa do Estado como agente promotor da saúde, observando que índices de saúde em sistemas públicos são melhores do que em sistemas privados. Segundo ele, isso acontece porque, quando a lógica do mercado é aplicada à saúde, diversos exames e internações desnecessários acontecem, por exemplo. “Sistemas públicos na saúde são mais eficientes do que sistemas privados. O sistema inglês gasta metade do modelo americano, com resultados melhores. No sistema privado no Brasil, temos quatro vezes mais médicos por habitante do que na rede pública. No entanto, a expectativa de vida dos diabéticos que se acompanham no SUS é melhor do que os que são acompanhados no sistema privado”, afirmou.
O presidente da Abrasco disse ainda que críticas ao SUS desconsideram que o sistema na realidade é subfinanciado, em contraste com modelos internacionais. “O SUS pode ser considerado uma reforma incompleta, porque ele vai sendo implantado aos soluços. Na Europa, a implantação aconteceu em quatro anos. Em Portugal, o sistema público de saúde começou em 1976 e, em 1980, a cobertura de atenção básica chegava a 80%”.
O conferencista afirmou que os atuais 3,9% do orçamento dedicados à saúde em 2015 são insignificantes, quando comparados ao pagamento da dívida pública, que consumiu 42% do orçamento no mesmo ano. Segundo ele, seria necessário dobrar os recursos para que 80% da população tivesse atendimento na cobertura básica, como recomenda a Organização Mundial de Saúde.
Em sua conclusão, o sanitarista fez duas sugestões para a melhora do SUS: incrementos na transparência, de modo a possibilitar uma melhor compreensão do alocamento de recursos, e uma melhora do financiamento, com uma mudança do uso dos recursos públicos. ”Não precisamos de mais impostos para ter equilíbrio fiscal. Mas é preciso ter dinheiro, de qualquer forma. Políticas públicas são feitas com impostos. Campanhas as anti-impostos vão nos levar à barbárie”, colocou.
Promotores de Justiça
O encerramento do seminário foi marcado por promotores de justiça afirmando sua disposição para lutar por uma rede saúde pública e capaz de atender às necessidades da população.
O Presidente da Associação Nacional do Ministério Público de Defesa da Saúde (Ampasa), Gilmar de Assis, fez um informe sobre uma ação que pretende levar a cabo no Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasem), que acontece desde quinta-feira até amanhã (de 1º a 4 de junho). Segundo Assis, o MP pretende levar à justiça ações contra a desvinculação de receitas relacionadas à saúde.
Em seguida, a promotora de justiça de Rondônia Priscila Matzenbacher, representante de uma das nove turmas formadas, afirmou que o curso foi fundamental para conscientizar o Ministério Público sobre o que é SUS. “Diante dos riscos atuais ao SUS, dos pensamentos que estão sendo colocados por nossos governantes, penso que precisamos estar alertas. O SUS é uma construção coletiva, e tem uma necessidade de manutenção. A corrupção é um grande problema e devemos enfrentá-la, mas sem com isso agir com um mote futurista, cortando ações e programas pensando que pode haver corrupção. Nosso papel é de desafio, e o resultado do curso foi muito satisfatório”.
Outro aluno, Gabriel Rodrigues, do Ministério Público do Mato Grosso do Sul, fez um emocionado discurso em louvor do Sistema Único de Saúde. “Descobrimos que o SUS é sustentável. Temos não só um dever, mas uma exigência de fortalecer esse sistema. Nasci em uma família de classe média e cheguei sem esperança, para entender como eu poderia remediar um sistema de pobre. Hoje saio desse período de aprendizado querendo me integrar a esse sistema como pessoa, e não apenas como autoridade”.
Na mesa de considerações finais, formada por convidados do Ministério Público com vasta experiência no campo da saúde, o destaque foi a participação de Marco Antônio Teixeira, do MP do Paraná e membro do Conselho Nacional do Ministério Público. Com palavras fortes, o promotor de justiça encorajou os colegas a pôr o conteúdo do curso em prática. ”Temos um estado fora da lei, que pilha os recursos público e subfinancia o SUS desde o começo do sistema. O Estado brasileiro jamais quis o sistema único. Essa foi uma conquista da sociedade. É disso que estamos tratando”.
Confira a cobertura do primeiro dia de evento.
Políticas públicas são feitas com impostos. Campanhas anti-impostos vão nos levar à barbárie (Gastão Wagner, presidente da Abrasco)