03/06/2013
Por Daniele Monteiro/Revista de Manguinhos
Devido à sua vulnerabilidade social e aos fatores relacionados à própria atividade, o grupo das mulheres profissionais do sexo é um dos segmentos populacionais sob maior risco de infecção pelo HIV. No Brasil, a taxa de prevalência de HIV nessa parcela da população, que corresponde a mais de meio milhão de mulheres, pode ser até 15 vezes mais elevada comparada à população geral feminina. Foi essa realidade que motivou a realização da tese Análise de dados coletados por Respondent-Driven Sampling (RDS): um estudo da prevalência de HIV e fatores associados entre mulheres trabalhadoras do sexo, assinada por Giseli Damacena e apresentada na Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz). Com o uso do RDS, um método de amostragem probabilística criado especialmente para populações de difícil acesso, a tese revela diferenças significativas no perfil das profissionais do sexo segundo local de trabalho, indicando maior vulnerabilidade entre as mulheres que trabalham em pontos de rua.
Baseado nas informações do Projeto Corrente da Saúde – realizado com 2.523 mulheres desse grupo populacional em Manaus, Recife, Salvador, Campo Grande, Brasília, Belo Horizonte, Santos, Rio de Janeiro, Curitiba e Itajaí – o estudo identificou prevalência de HIV duas vezes superior (7,1%) entre trabalhadoras de pontos de rua em comparação às que trabalham em locais fechados (3,6%). "No grupo de profissionais do sexo de pontos de rua estão as mulheres mais velhas, com menor grau de escolaridade e renda, e com maior tempo na profissão, fatores estes associados ao maior risco de infecção pelo HIV", explica Damacena. O percentual de profissionais do sexo
de pontos de rua detectadas com sífilis também foi mais alto (3%) em relação ao outro grupo (2,1%).
Além da maior incidência de HIV e de sífilis, as profissionais do sexo de pontos de rua têm menor acesso aos sistemas de saúde em relação às de locais fechados, conforme mostra o estudo. “A cobertura de exame preventivo de câncer de colo de útero entre as trabalhadoras do sexo de locais fechados foi de 61,8%, em nível bem inferior ao da população brasileira feminina de 18 a 69 anos de idade. Já entre as trabalhadoras de rua, a cobertura foi ainda menor, de apenas 53%”, revela a pesquisadora.
Outro fator influente foi o valor do programa, significativamente menor entre as que trabalham nas ruas. "De acordo com o preço do programa, os clientes se diferenciam pelo grau de escolaridade e nível de informação sobre os meios de transmissão da infecção pelo HIV. As mulheres profissionais do sexo, por sua vez, precisam muito do dinheiro e não conseguem negociar o sexo seguro", argumenta Damacena. Associado à necessidade de dinheiro, segundo ela, está o consumo elevado de crack pelas trabalhadoras de rua, que, muitas vezes, fazem sexo sem proteção para a obtenção de dinheiro para a compra da droga. Já em relação à frequência de consumo de bebidas alcoólicas, o consumo foi maior entre as mulheres trabalhadoras de locais fechados.
Para a pesquisadora, os resultados indicam necessidade de estudos que incluam a estratificação por local de trabalho com vistas a ações adequadas de prevenção e assistência entre as mulheres profissionais do sexo. "As estratégias devem ampliar o acesso e o uso dos serviços de saúde, com a redução das desigualdades na cobertura de exame ginecológico e do teste periódico de sífilis, além de aumentar a distribuição de camisinhas, sobretudo entre as profissionais do sexo de rua, que têm menor poder aquisitivo e compram o preservativo com menor frequência", propõe.
No grupo de profissionais do sexo de pontos de rua estão as mulheres mais velhas, com menor grau de escolaridade e renda, e com maior tempo na profissão, fatores estes associados ao maior risco de infecção pelo HIV - Giseli Damacena , autora da pesquisa