06/03/2025
Yuri Neri (IOC/Fiocruz)
Capacitação envolveu aulas práticas no campus da Fiocruz em Manguinhos. Foto: Max Gomes
O Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), que atua como referência nacional para esquistossomose e malacologia junto ao Ministério da Saúde, formou, em fevereiro, uma nova turma de alunos do curso ‘Capacitação em malacologia médica e aplicada’.
A iniciativa, realizada pelo Laboratório de Malacologia do IOC em parceria com o Laboratório Central de Saúde Pública do Rio de Janeiro (Lacen-RJ), prepara profissionais das secretarias municipais de saúde do estado para trabalhar na vigilância de caramujos e outros moluscos envolvidos na transmissão de doenças.
Durante a capacitação, os alunos conheceram o ciclo de vida de moluscos e aprenderam a identificar espécies que participam do ciclo da esquistossomose, da meningite eosinofílica e de outras doenças. Os procedimentos adequados para coletar e transportar esses animais para análises em Laboratório também foram pauta.
Profissionais de secretarias de saúde do estado do RJ aprenderam a identificar espécies de caramujos. Foto: Max Gomes
O Instituto oferece o treinamento para profissionais fluminenses desde 2008. Na turma de 2025, cujo treinamento aconteceu entre 17 e 21 de fevereiro no campus da Fiocruz, em Manguinhos, dez profissionais de diferentes municípios do Rio de Janeiro foram capacitados. Participaram representantes de Niterói, Iguaba Grande, Nova Friburgo, Paracambi, Petrópolis, Piraí e São José do Vale do Rio Preto, além da capital.
“Selecionamos os alunos de acordo com a demanda dos municípios e também priorizamos as secretarias de saúde que ainda não haviam participado da capacitação”, explica a coordenadora do Laboratório de Referência Nacional para Esquistossomose-Malacologia, vinculado ao Laboratório de Malacologia do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), Elizangela Feitosa. Existem, ainda, os casos de recomposição da formação diante de aposentadorias e do deslocamento de profissionais para atuação na resposta a outros agravos.
Elizangela explica procedimentos da coleta de caramujos. Foto: Max Gomes
Segundo Elizangela, a importância da capacitação em vigilância malacológica ultrapassa o compartilhamento de saberes e gera frutos na criação de pontes entre as secretarias de saúde e a população.
“É frequente que os alunos do curso venham de territórios onde existe grande vulnerabilidade no saneamento ou seja, ambientes propícios para a proliferação de algumas espécies de moluscos. Os profissionais capacitados se tornam mais preparados para atuar na coleta do material e na identificação de caramujos, mas também ganham bagagem para agir na educação e orientação da população. Essas pessoas, mantêm ativa a vigilância malacológica dos municípios”, comenta a pesquisadora.
Em 2024, um caso de meningite eosinofílica transmitida por caramujo em Nova Iguaçu foi identificado graças à capacitação do IOC e à atuação atenta da secretaria de saúde daquele município. Elizangela explica que a pessoa responsável pela vigilância malacológica no município havia participado da capacitação, o que, mais tarde, ainda abriu interesse para cursar especialização e mestrado profissional na área.
Após identificar o caso, a Secretaria Municipal de Saúde de Nova Iguaçu acionou o Instituto, que, por meio de um trabalho de investigação epidemiológica, confirmou a presença do Angiostrongylus cantonensis, o verme responsável pela meningite eosinofílica, em caramujos da cidade.
Parte da turma e instrutores da capacitação. Foto: Max Gomes
Sobre esquistossomose e meningite eosinofílica
Popularmente conhecida como barriga d’água, xistose e doença do caramujo, a esquistossomose é causada pelo verme Schistosoma mansoni.
A doença está ligada a condições de saneamento básico inadequadas. Pessoas infectadas liberam ovos do parasito nas fezes. Se os dejetos são lançados em rios ou em outros cursos d’água, os ovos eclodem, liberando larvas, que infectam caramujos Biomphalaria, encontrados na água doce.
Dentro dos caramujos, as larvas adquirem a forma de cercárias, que são liberadas na água e podem infectar os seres humanos, penetrando através da pele.
Mal-estar, febre, dor na região do fígado e do intestino, diarreia e fraqueza podem ser sintomas da doença. Emagrecimento e aumento do volume do fígado, do baço e da barriga ocorrem nos casos graves. A doença também pode afetar o sistema nervoso. Sem tratamento, a esquistossomose pode levar à morte.
O diagnóstico da infecção é feito por exame de fezes. O medicamento para tratar a doença é oferecido gratuitamente pelo SUS.
A meningite eosinofílica é causada pelo verme Angiostrongylus cantonensis. As formas adultas desse parasito são encontradas em roedores, como ratos.
As larvas do verme são eliminadas nas fezes dos ratos e podem ser ingeridas pelo molusco gigante africano e outras espécies de caracóis e lesmas. O parasito se desenvolve dentro do molusco, adquirindo a forma capaz de infectar animais vertebrados.
O homem é um hospedeiro acidental. A infecção humana pode ocorrer quando há a ingestão das larvas do verme presente no molusco ou nas frutas e verduras contaminadas com a baba (muco) liberada por ele.
Cada caracol africano pode colocar centenas de ovos. É indicado catar os animais e os ovos em quintais e jardins para interromper sua reprodução.
Caramujos coletados nas atividades práticas da capacitação. Foto: Max Gomes
Para evitar infecção, é fundamental usar luvas ou um saco plástico para proteger as mãos ao catar os caracóis. Os animais catados devem ser colocados em recipiente com água fervendo por cinco minutos.
Outro cuidado importante é quebrar as conchas antes de enterrá-las ou jogá-las no lixo, para evitar que acumulem água e se tornem criadouros do mosquito Aedes aegypti, transmissor da dengue, Zika e chikungunya.
Evitar que crianças brinquem com os moluscos e lavar bem frutas e verduras, deixando de molho por 30 minutos numa mistura de um litro de água e uma colher de sopa de água sanitária, também são medidas importantes para prevenir infecções.
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