04/09/2024
Ariene Rodrigues (Icict/Fiocruz)
Mesa de abertura / Fotos: Raquel Portugal (Multimeios/Icict/Fiocruz)
Informação, comunicação e cooperação. Estas foram algumas das palavras mais repetidas ao longo do seminário que marcou os 15 anos do Observatório de Clima e Saúde do Instituto de Comunicação e Informação em Saúde da Fiocruz (Icict/Fiocruz), ocorrido na quarta-feira (28/8), no Rio de Janeiro. Diante de um cenário em que as mudanças climáticas são consideradas uma das maiores ameaças à saúde humana, o trabalho do Observatório foi celebrado por parceiros nacionais e internacionais no evento, que teve como tema "Clima e Saúde: olhares no presente em direção ao futuro".
“O Observatório é um sucesso, não só pelo que ele contribui para o debate nacional e internacional, mas também porque ajuda a organizar dentro da Fiocruz esse debate”, lembrou o presidente da Fundação, Mario Moreira, durante a mesa de abertura do evento.
Para o diretor do Icict, Rodrigo Murtinho, o trabalho que o Observatório tem desenvolvido na comunicação de dados em momentos cruciais para a saúde pública, como diante das enchentes no Rio Grande do Sul e durante a pandemia de COVID-19, mostra a potência e a razão de inspirar e colaborar com ações semelhantes. “O Observatório tem se desenvolvido como um projeto de excelência nessa área. Sua importância é nacional e internacional, e ele consegue espelhar esse trabalho e colaborar com outros estados e países”, disse.
O consultor da Organização Mundial da Saúde (OMS), Carlos Corvalán; a representante da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas/OMS), Priscila Bueno; e o vice-presidente de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde (VPAAPS/Fiocruz), Hermano de Castro, completaram a mesa de abertura e ressaltaram a importância histórica e social do trabalho realizado pelo Observatório.
Assista ao vídeo institucional que celebra os 15 anos do Observatório de Clima e Saúde.
Panorama histórico e atuação em rede
Christovam Barcellos, pesquisador do Icict e um dos coordenadores do Observatório, e Guilherme Franco Netto, coordenador de Saúde e Ambiente da VPAAPS/Fiocruz, abriram os painéis com uma retrospectiva dos 15 anos do projeto.
Netto afirmou que o crescente número de desastres que vêm acontecendo no Brasil demonstra a necessidade de trabalhos como o que o Observatório realiza. Para o pesquisador, as soluções apontadas ao longo do período mostram que "não tem como fazer SUS sem debater a mudança do clima", e que será necessário que o tema ganhe mais espaço nos próximos anos. É preciso “informação adequada, em tempo adequado para que possamos decidir de forma adequada”.
Barcellos lembrou que a sistematização de dados no início do Observatório, em 2009, não foi fácil. A internet discada ainda era uma realidade em boa parte do Brasil. Cruzar e transformar uma grande quantidade de dados em informações plausíveis, levava um tempo considerável. Hoje, o site do Observatório oferece, diretamente aos usuários, consultas de diferentes indicadores a partir dos quatro grandes temas trabalhados pela iniciativa, com respostas que levam segundos.
Para disponibilizar as informações da melhor forma possível para os diferentes públicos que buscam o Observatório, a tecnologia é um fator importante. No painel voltado para o tema, a equipe de tecnologia do Observatório mostrou os avanços nos sistemas de aplicações desenvolvidos internamente e apresentou a aplicação mapas.climaesaude.icict.fiocruz.br, que gera gráficos em tempo real a partir da inserção de dados. “Priorizamos sistemas com usabilidade, porque não fazemos sistema só para academia, mas também para gestores e sociedade civil”, explicou o analista de sistemas do Observatório, Heglaucio Barros, que dividiu a mesa com Vanderlei Matos e Raphael Saldanha, também da equipe de tecnologia do Observatório.
Para eles, aplicações como a que foi apresentada são formas de democratização de acesso à informação, e a manutenção e atualização exige grande esforço e acompanhamento ativo das mudanças de tecnologia. De olho no futuro, como sugere o tema do seminário, a inteligência artificial passou a fazer parte do trabalho no Observatório. “Estamos entendendo melhor como essa tecnologia funciona e quais são as possibilidades de uso para análise de dados em saúde”, explica Raphael Saldanha.
Cenário de preocupação
Os dados gerados pelos sistemas de informação são essenciais para mostrar as condições da saúde e pensar em potenciais saídas para os problemas. Desde que foi criado, o Observatório trabalha a partir de quatro grandes temas: água, ar, vetores e eventos extremos (desastres). Esses mesmos temas pautaram as mesas sobre Aspectos Conceituais e Análise das Informações de Situação de Saúde.
Assunto central no debate público nas últimas semanas, as queimadas e suas consequências para a saúde foram abordadas em diferentes momentos. Sandra Hacon, pesquisadora da ENSP falou sobre a poluição do ar, e destacou o efeito das queimadas na saúde da população, em especial para idosos e crianças. Diante das situações que estão acontecendo nos últimos dias pelo país, ela indicou que temos uma emergência climática que está posta em que os direitos humanos não estão sendo respeitados. “A situação do fogo se torna muito mais grave exatamente por conta da vulnerabilidade social” e apontou: “não controlamos a emergência climática, mas o fogo podemos controlar e diminuir”.
Ainda falando sobre as consequências do aumento das queimadas, a pesquisadora da Fiocruz Piauí, Beatriz Oliveira, mostrou como elas vêm se intercalando com inundações e estão cada vez mais frequentes. Situações que sobrecarregam o serviço de saúde porque acabam se sobrepondo, a exemplo do que vem acontecendo em Manaus.
Em 2023, ano com a pior seca dos rios da região, houve diminuição da disponibilidade e acesso à água potável, além do registro de queimadas com altos valores de material fino no ar. “Dois componentes fundamentais para a vida: ar para respirar e água para beber. São situações e exposições extremamente insalubres”, explicou Beatriz. Questões que se tornam ainda mais preocupantes quando consideradas outras variantes, como o desmatamento e as mudanças climáticas, e tendo ciência de que isso não ocorre apenas localmente.
Encerrando o dia, o seminário discutiu o papel da comunicação e da divulgação científica na promoção do debate sobre clima e saúde. Foram lembradas iniciativas como o Painel Unificador Covid-19 nas Favelas, em parceria com a Com-Cat, que acabou influenciando na elaboração de políticas públicas durante a pandemia, e o premiado projeto Engolindo Fumaça, feito em parceria entre InfoAmazonia, Observatório de Clima e Saúde e a Universidade Federal do Acre. A coordenadora da VideoSaúde Distribuidora da Fiocruz, Daniela Muzi, destacou a importância dos dados produzidos pelo Observatório na execução do documentário “Xawara e Saúde”, que registrou as ações de assistência à saúde em resposta à crise humanitária na terra indígena Yanomami, ocorrida em 2023. A comunicação e a ciência, diante de cenários como o vivido ali, tornam-se uma arma de luta e resistência para as lideranças indígenas. “Sem dados não há políticas públicas. Comunicar isso significa produzir essas histórias da melhor forma possível, combinando esses saberes tradicionais e científicos. E, depois, investir para fazer essa comunicação circular”, descreveu Muzi.
Mais em outros sítios da Fiocruz