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Quintais Produtivos, agroecologia e saúde na Zona Oeste do Rio de Janeiro


05/05/2022

SAS/VPAAPS

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Encontro realizado na Fiocruz Mata Atlântica reúne parceiros do Projeto Ará

Grupo participante da visita sociotécnica à Fiocruz Mata Atlântica (Foto: Valdirene Militão)

Agricultora de um dos quintais socioprodutivos da Colônia, Fátima Leandro conta sobre a satisfação ao adquirir, através do cultivo no entorno de sua casa, o conhecimento que une agroecologia e saúde. “Eu tomava remédio pra pressão, hoje tomo erva-cidreira e erva-doce. São coisas que você aprende para você e ainda passa para os outros. Dinheiro é bom, mas melhor ainda é a gente saber que teve pessoas que foram curadas através das plantas, dos remédios feitos da terra, vindos da terra”, diz ela.
 
O depoimento de Fátima integrou a abertura do primeiro dia do evento realizado como parte das ações de integração do Projeto Ará entre os dias 11 e 13 de abril, no campus Fiocruz Mata Atlântica (FMA). Com o objetivo de conhecer e fortalecer iniciativas como a de Fátima, e promover a interação entre integrantes da FMA; da Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde (VPAAPS); da Embrapa Agrobiologia e das organizações parceiras locais: AS-PTA Agricultura Familiar e Agroecologia, Cooperação e Apoio a Projetos de Inspiração Alternativa (Capina)) e Rede Carioca de Agricultura Urbana (Rede CAU). A atividade que ocorreu  ao longo de três dias de visitas sociotécnicas no território do Maciço da Pedra Branca, envolveu agricultoras/es da Colônia e representantes dos quilombos, do Rio da Prata e de Vargem Grande.
 
As ações do projeto Ará,  no território do Maciço, tem como objetivo mobilizar diretamente comunidades das sete vertentes do entorno (Colônia, Camorim, Vargem Grande, Guaratiba, Campo Grande, Rio da Prata e Pau da Fome), fortalecendo a produção agroecológica, incluindo a organização e o acesso a casas comunitárias de sementes, e a manipulação, armazenagem, divulgação e comercialização de alimentos saudáveis , além de estimular processos de gestão de empreendimentos coletivos. A partir de uma escuta ativa das comunidades, as equipes das organizações vêm colhendo subsídios para a construção de planos de trabalho para ações em rede, avançando na construção coletiva de ações articuladas às demandas específicas do território.
 
O grupo recebeu as boas-vindas do coordenador da FMA, Gilson Antunes da Silva. Na sequência, o coordenador do projeto territorial, Robson Patrocínio, contextualizou a extensa abrangência territorial das ações de agroecologia na região da Zona Oeste  e reforçou a importância da atualização do número de agricultoras/es parceiros do projeto, para impulsionar demandas históricas em cada uma das sete vertentes onde o projeto atuará até setembro de 2023. . Robson celebrou a presença de jovens das comunidades no projeto, que vem sendo materializada através da concessão de bolsas para fortalecer a participação das juventudes na articulação territorial e participação no Comitê Gestor local. 
 
As representantes das organizações parceiras locais, Bernadete Montesano da Rede CAU, Terezinha Pimenta da Capina, e Ingrid Pena da AS-PTA apresentaram as iniciativas das instituições em curso no território e afirmaram a importância de encontros como este para uma melhor compreensão do trabalho, com suas demandas e desafios, que possibilite o fortalecimento da articulação local, partindo-se da qualidade das relações que as pessoas estabelecem em cada lugar. 
 
A engenheira agrônoma Ana Cristina Garofolo, da Embrapa Agrobiologia, ressaltou a centralidade do papel das instituições públicas na defesa de uma agricultura que alimente a população com qualidade. Destacou a importância da identificação e o fortalecimento das iniciativas como as desenvolvidas no território do Maciço. “Ter essas experiências identificadas, fortalecidas, para que a gente possa promover uma comunicação ampla de que existe agroecologia no Rio de Janeiro e uma agricultura que alimenta a população, o trabalhador e a trabalhadora, é muito importante pra gente”, declarou Garofolo.

 
Quintal produtivo: fonte da segurança alimentar e econômica da/do agricultora/o.
 
No quintal da Fátima, a agrobiodiversidade brota de cada canto: alfazema do mato, merthiolate, pé de jambo carregado, assa-peixe, biri-biri, açafrão, taioba, urucum, taioba, ora-pro-nobis, vinagreira, banana, chaia, cidreira, amora. A produção no quintal é associada à tecnologia social da compostagem utilizando cilindro de telas de arame, que tem sido um importante método para a diminuição da umidade e consequente controle do caramujo, além de possibilitar o aproveitamento adequado da varrição do quintal, pois é comum que as pessoas queimem as folhas e galhos.  Além disso, a compostagem fornece o adubo necessário para o cultivo da horta. Com ajuda de dona Rita, amiga e agricultora vizinha experiente, e o apoio das organizações parceiras como a FMA, Fátima vê crescer sua produção junto à rede de colaboração que a cerca. “Aprendi com esses companheiros da rede que é unido que a gente vence”, afirma ela.  

Fátima apresenta seu quintal ao grupo (Foto: Livia Abdalla)

 A visita seguinte ao terreno de Severino Ramos, mais conhecido como “Seu Severino”, não foi diferente. O investimento em conhecimento e manejo garante a sustentabilidade e o crescimento da sua produção. “Antes eu queimava dinheiro, agora guardo no bolso”, diz ele. A afirmação se refere ao processo de de adubação antes praticado, na qual queimava-se a cobertura vegetal que depois era espalhada, atividade que, segundo ele, além de despender grande esforço era, por vezes, perigosa. Junto aos técnicos da FMA, o agricultor conheceu o processo de compostagem e o primeiro teste foi feito com paletes, demarcando na propriedade um espaço específico para a atividade. Atualmente, Severino combina a produção de adubos por meio de seis cilindros de tela de arame, no qual construiu um sistema de captação, escoamento e armazenamento para o biofertilizante, que é utilizado como adubo foliar. Após o processo de compostagem, o adubo é peneirado, a parte fina é comercializada e integrada ao sistema produtivo, enquanto a parte mais grossa retorna para os cilindros, acelerando o processo de compostagem.

Severino e um dos cilindros do processo de compostagem (Foto: Livia Abdalla)

 
Ancestralidade e juventude: intercâmbio dos saberes para a continuidade da agroecologia

Roda de conversa na AMAVAG (Foto: Livia Abdalla)

Criada em 1982, a Associação de Moradores de Vargem Grande defende e estimula ações comunitárias do bairro, apoiando e fortalecendo diretamente as/os agricultoras/es locais. O espaço sediou a roda de conversa no segundo dia do encontro, iniciada com música, canto e poesia, que foi seguida por depoimentos de colaboradoras/es e produtoras/es ligadas/os à Associação. Os participantes contaram sobre as potencialidades e dificuldades que encontram no seu cotidiano de trabalho com a terra. Ao longo da prosa, muito se falou sobre a importância da atuação das/os jovens no planejamento e execução das atividades da agroecologia, estratégia de trabalho que vem sendo desenvolvida e priorizada pela FMA. 
 
Se por um lado, a força da juventude se destacou neste momento do encontro, por outro, a presença ancestral nos recordou o aprendizado que se pode ter com quem está há anos plantando e colhendo, trazendo-nos a importância da troca dos saberes para o crescimento da agroecologia. Um dos momentos mais marcantes foi o longo abraço das agricultoras, Dona Maria do Céu e Dona Joana Marota, que comoveu quem ali estava. As amigas emocionaram-se celebrando a parceria de tantos anos e o reencontro com saúde após o longo tempo de isolamento social imposto pela pandemia. Na sequência, o segundo território visitado foi o Quilombo Cafundá Astrogilda, situado a alguns quilômetros dali. Lá, junto ao marido Paulo José, Catarina Mesquita apresentou a variedade de ervas medicinais que possui em seu quintal, como carqueja, chapéu de couro e erva-cidreira. “Tenho 61 anos e não tomo nenhum remédio”, contou ela.

Abraço entre as agricultoras Dona Maria do Céu e Dona Joana Marota (Foto: Natália Almeida)
 
 Para além das ervas medicinais, as famílias agricultoras desenvolvem o cultivo experimental de lúpulo, em parceria com a Embrapa Solos e a produção agroflorestal de caqui e banana, produtos historicamente cultivados no território do Maciço da Pedra Branca. A busca por novas variedades de plantio, representa a possibilidade de renovar a esperança e semear maior interesse da juventude local na prática da agricultura, que em conjunto com a manutenção e enriquecimento dos cultivos de caqui e banana apresentam possibilidades concretas para a continuidade da agroecologia no território.

Grupo em visita ao Quilombo Cafundá Astrogilda (Foto: Natália Almeida)
 
 Fiocruz Mata Atlântica catalisando ações entre a floresta, os quintais e a cidade
 
Nos 506 hectares, ocupados pelo Campus Fiocruz da Mata Atlântica no bairro de Jacarepaguá, visitamos também os espaços que compõem o Horto-Escola. Para a Fiocruz, a unidade da Mata Atlântica é uma referência no desenvolvimento de práticas agroecológicas construídas em diálogo com as comunidades. Com o trabalho de mais de 11 anos em torno da agroecologia e das dinâmicas cooperativas, o campus se tornou um espaço de encontro, formação e fortalecimento das redes que atuam regionalmente, com destaque para a Rede Carioca de Agricultura Urbana.
 
Sob uma paineira florida, uma bonita roda de conversa sobre sementes, conduzida pela coordenadora da área Andréa Vanini, coloriu ainda mais o espaço que conta com um viveiro florestal para produção de mudas de espécies regionais. A equipe atuante nessas ações realiza, entre outras iniciativas, a marcação de matrizes nativas regionais para o fornecimento de sementes, realização de cursos de capacitação sobre a produção de mudas de espécies nativas, além de técnicas de recuperação e restauração e mapeamento das árvores. Diálogos diretos com a Embrapa Agrobiologia também estão previstos nessa direção e ganham relevância pelas demais parcerias e iniciativas que a unidade vem desenvolvendo sobre sementes crioulas. 

Roda de conversa sobre sementes no Horto-Escola (Foto: Livia Abdalla)

Próximos passos
 
A próxima atividade da equipe da VPAAPS no Projeto Ará será a visita sociotécnica às comunidades quilombolas em Petrópolis e Areal, com membros do Fórum Itaboraí. O projeto na região serrana ainda prevê ações em parceria com sistemas participativos de certificação em outras comunidades rurais. A partir do diagnóstico construído com os territórios, serão elaborados e executados os planos de trabalhos locais, que contará também com a parceria da Embrapa, da Cooperativa Cedro e do Comitê Piabanha, dentre outros parceiros. 

 

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