01/11/2024
Jamile Chequer (CAS/VPAAPS)
A Fiocruz e a Escola Nacional de Saúde Pública de Cuba (Ensap) reforçaram seu compromisso com a cooperação internacional durante o “Seminário Experiência Brasil-Cuba na Atenção Primária à Saúde”, realizado nos dias 21 e 22 de outubro de 2024, no auditório da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), Organizado pela Coordenação de Atenção à Saúde (CAS) da Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde (VPAAPS), o encontro visou ao compartilhamento de boas práticas, à proposição de ajustes para aprimorar o intercâmbio e ao compartilhamento da vivência dos residentes Fiocruz no estágio na Ensap.
Com a presença de residentes, professores e coordenadores, o evento abordou os impactos dessa parceria na formação de profissionais, os desafios enfrentados por ambos os países na gestão da saúde pública e os ganhos proporcionados pelo intercâmbio.
Patricia Canto Ribeiro, coordenadora da CAS, sublinhou que o intercâmbio é uma oportunidade para fortalecer a formação dos profissionais e promover o diálogo entre os dois países. Essa troca não apenas enriquece a formação dos nossos profissionais, mas também cria um espaço para refletirmos juntos e buscarmos soluções inovadoras para desafios comuns”, afirmou.
Ela frisou que a ampliação recente dos termos desta cooperação foi fundamental para ir além da experiência dos residentes e ações educativas. “Essa expansão traz novas oportunidades de diálogo e intercâmbio para Fiocruz e Cuba”, destacou Ribeiro, indicando que está sendo desenvolvido um plano de trabalho para consolidar mais ações entre as duas instituições.
O modelo cubano de APS e a parceria estratégica
Carlos Raul Cruz, diretor-adjunto da Ensap, explicou que o modelo cubano de Atenção Primária à Saúde (APS) se consolidou ao longo das décadas por meio da regionalização e da promoção da medicina familiar, aproximando os cuidados à comunidade. Ele enfatizou que o programa do médico e da enfermeira da família é a espinha dorsal desse modelo, reduzindo a sobrecarga dos serviços mais complexos. “O intercâmbio com o Brasil nos permite conhecer novas abordagens multiprofissionais, enquanto compartilhamos nossa experiência na centralidade da medicina familiar”, ressaltou Cruz.
Cruz também falou sobre a admiração mútua entre as instituições e a importância de aproveitar experiências de sucesso. “A Fiocruz é referência no que diz respeito ao Banco de Leite Materno. Estamos desenvolvendo um programa internacional nesta área e cortamos caminho quando aproveitamos e aprendemos da experiência de países amigos que colaboram entre si”, afirmou.
O diretor da Ensap ressaltou que, para desenvolver um sistema de saúde robusto, é fundamental a participação da sociedade. “A saúde pública é um processo de construção social. Não se pode desenvolver um programa de saúde pública sem as pessoas porque ele é desenvolvido para as pessoas. O primeiro passo é alcançar que a população conheça, aceite e confie no sistema de saúde e em seus profissionais. A outra parte é técnica e referente aos recursos”, explicou.
Desafios e conquistas do Brasil no SUS
O Sistema Único de Saúde (SUS) brasileiro foi reconhecido como um exemplo de saúde pública universal e inclusiva e, apesar de suas diferenças em relação a Cuba, também enfrenta desafios significativos, como a sustentabilidade financeira e a necessidade de garantir a continuidade de ações em meio às crises econômicas e políticas.
Marco Menezes, diretor da Ensp, ressaltou que, apesar dos desafios econômicos e sociais, o SUS continua sendo um pilar na resposta a crises, como a pandemia de COVID-19. Ele destacou que a parceria de longa data com a Ensap é fundamental para construir um sistema de saúde mais equitativo. “Essa troca de saberes é essencial para enfrentarmos juntos os desafios do nosso tempo, como as emergências climáticas e as desigualdades crescentes”, afirmou Menezes.
José Barroso, coordenador-geral da Coordenador-Geral de Saúde da Família e Comunidade, do Ministério da Saúde (SAPS/MS), abordou a reorganização da Atenção Primária como um passo essencial para garantir que ela continue sendo a porta de entrada do SUS. Ele destacou a importância das equipes especializadas, voltadas para populações específicas como ribeirinhas e quilombolas, e da integração de inovações como a telemedicina. “Precisamos garantir que a cobertura seja adequada, mesmo nos centros urbanos com maiores vazios”, afirmou Barroso.
Hermano Castro, vice-presidente da VPAAPS, complementou a fala de Barroso e observou que a cooperação com Cuba é estratégica para fortalecer o SUS e enfrentar crises de forma mais eficaz. “Essa troca de experiências é fundamental para construirmos um sistema de saúde mais justo, resiliente e inclusivo, capaz de responder às emergências e de atender às populações mais vulneráveis”, destacou Castro, reforçando a importância de uma colaboração global pautada na solidariedade.
Educação prática e enfoque em tecnologia
Os representantes da Ensap destacaram o conceito de "educação no trabalho", que integra ensino e assistência prática, como um dos pilares do modelo cubano de formação. Lázaro Hernández, subdiretor da Ensap, reforçou que essa abordagem garante a qualidade dos serviços. No Brasil, Barroso mencionou a importância de inovações como a telemedicina e práticas de cuidado orientadas ao território, fortalecendo a atenção básica e aproximando os cuidados das comunidades.
Adriana Coser, cordenadora-adjunta das Residências em Saúde da Vice-Presidência de Educação, Informação e Comunicação (VPEIC), complementou destacando a importância de criar estratégias que fomentem a inovação e a troca de experiências entre os profissionais. "Nosso objetivo é garantir que as inovações tecnológicas e metodológicas sejam disseminadas e implementadas de forma inclusiva, fortalecendo a formação dos residentes e ampliando o impacto na assistência à saúde," afirmou Adriana, reforçando a necessidade de integrar novas ferramentas no cotidiano das equipes de saúde.
Experiências transformadoras dos residentes brasileiros
Os residentes brasileiros compartilharam experiências transformadoras nas visitas a Cuba, destacando a integração entre ensino e assistência como um ponto forte da Ensap. Durante todo o seminário foi possível ouvir diversas falas de residentes e preceptores descrevendo as vivências como enriquecedoras e imersivas, proporcionando uma compreensão profunda do sistema de saúde cubano e suas particularidades.
Para o enfermeiro Diego Lima de Oliveira, residente da Fiocruz Brasília, o impacto dessa experiência é coletivo: “O maior impacto é a rede construída. Este auditório e este seminário são a expressão dessa rede”, afirmou, evidenciando a importância do intercâmbio como forma de fortalecer laços e expandir o conhecimento entre profissionais dos dois países.
Planos futuros e fortalecimento da cooperação
A Ensap e a Fiocruz têm planos ambiciosos para expandir suas ações conjuntas nos próximos anos. As iniciativas incluem a consolidação de programas de intercâmbio de estudantes e profissionais de saúde, a formação de formadores e o desenvolvimento de publicações sobre temas prioritários, como atenção primária, saúde coletiva e medicina familiar.
Um dos objetivos é ampliar a participação dos residentes em eventos internacionais, como a convenção 'Cuba Salud', prevista para maio de 2025, que reunirá mais de cinco mil profissionais de diferentes países. “Estamos planejando estender o período de estágio dos residentes para que possam acompanhar o evento e aprofundar ainda mais seu aprendizado sobre o sistema de saúde cubano” mencionou Ribeiro Além disso, as instituições buscam fortalecer as colaborações em pesquisas conjuntas e promover o desenvolvimento de novas metodologias de ensino para a atenção primária.
Hernández, ressaltou sua expectativa para a celebração do centenário da Ensap, em 2027, e afirmou ser uma oportunidade para aprofundar ainda mais a colaboração entre os dois países. “Queremos elevar nossa cooperação a planos superiores e aprender com o Sistema Único de Saúde (SUS) brasileiro, enquanto compartilhamos nossa experiência na medicina familiar”, disse Hernández.
O seminário destacou não apenas o compromisso da Fiocruz e da Ensap com a cooperação internacional, mas também a capacidade de ambos os países de aprenderem e inovarem em conjunto para a construção de sistemas de saúde mais resilientes e inclusivos.