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Pesquisa traz novos dados sobre saúde sexual e reprodutiva e paternidade no país


06/09/2016

Por: Irene Kalil (IFF/Fiocruz)

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Subsidiar as ações das coordenações estaduais e municipais de saúde do homem na promoção dos cuidados masculinos seguindo as diretrizes da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH) foi o objetivo geral da pesquisa Os cuidados masculinos voltados para a saúde sexual, a reprodução e a paternidade a partir da perspectiva relacional de gênero, realizada pelo Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz) com recursos do Fundo Nacional de Saúde. Divulgado em julho deste ano, o relatório final do estudo traz, entre outros resultados, um diagnóstico da situação referente à saúde sexual e reprodutiva e à paternidade no país, feito por meio de mais de três mil inquéritos telefônicos com homens e mulheres, entre 20 e 59 anos de idade, residentes do território nacional e usuários do SUS.

Nesta entrevista, o pesquisador Romeu Gomes, coordenador do estudo, aponta permanências e mudanças observadas nos padrões relativos à participação do pai no acompanhamento do pré-natal e do parto e seu envolvimento nos cuidados com filhos menores de um ano, cuidados com a saúde sexual e reprodutiva e relação do homem com os serviços de saúde.

De onde surgiu a iniciativa de fazer esse estudo e que lacuna ele vem preencher?
A iniciativa partiu da Área Técnica da Saúde do Homem do Ministério da Saúde com o objetivo de dar continuidade a projetos que vinham sendo desenvolvidos sob a nossa coordenação, há mais de cinco anos, em apoio à Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH). O projeto em questão buscou minimizar a ausência de informações sobre saúde do homem, bem como em relação a experiências consideradas exitosas na atenção à saúde dessa população.

Diversos estudos apontaram um menor envolvimento dos homens, em comparação com as mulheres, nos cuidados em saúde. A que se deve tal comportamento?
Algumas explicações vêm sendo formuladas para esse fato. Dentre elas, pelo menos, duas se destacam. A primeira relaciona-se à influência de modelos culturais que reduzem os cuidados ao ser mulher, enquanto a segunda diz respeito às diferenças entre as percepções femininas e masculinas sobre o que vem a ser cuidado em saúde. É importante assinalar que, por conta dessas explicações que circulam em nosso imaginário, muitas vezes inviabilizamos a ocorrência dos cuidados masculinos, negando ou não enxergando esses cuidados.

Os resultados da pesquisa confirmam esse quadro ou apontam mudanças em curso? Em que sentido?
Os dados obtidos por meio da pesquisa demonstram mudanças e permanências nas dinâmicas das relações de gênero quanto a sexualidade, reprodução, relação com os filhos e cuidados com a saúde. Nesse sentido, o fato de os homens terem respondido, mais do que as mulheres, possuir vida sexual ativa e também possuir mais relacionamentos não estáveis, bem como terem reportado uma idade menor para o início da vida sexual pode ser entendido como manutenção de uma dupla moral sexual que prescreve maior controle para a sexualidade feminina do que para a masculina. Por outro lado, a participação masculina no pré-natal, na puericultura e nos cuidados cotidianos com filhos menores de um ano de idade, reportada pela maioria dos entrevistados, tanto homens como mulheres, pode ser analisada como uma ruptura com papéis tradicionais, segundo os quais a mulher assumiria o papel de responsável pelos cuidados primários enquanto o homem seria o responsável por prover materialmente a família heterossexual.

Um dos objetivos do estudo foi a análise de experiências exitosas acerca da promoção dos cuidados masculinos. Que elementos diferenciam tais experiências?
Os dados da pesquisa permitem estabelecer diferenças e semelhanças entre essas três experiências. Por um lado, observou-se uma heterogeneidade, seja no seu tempo de existência, com ações e programas voltados para a saúde do homem, seja na cultura local. Por outro, ainda que fossem diferentes, nelas foram identificadas preocupações comuns, como: intervenções voltadas para o chamado pré-natal masculino, oportunizando, no pré-natal feminino, a realização de exames clínicos; ações clássicas de planejamento familiar; e busca ativa de homens para ações de prevenção. Em resumo, pode-se afirmar que as experiências selecionadas foram as que mais se destacaram na mudança do discurso de que o homem não vem ao serviço de saúde ou que o homem não cuida da saúde. Entretanto, elementos relacionados a essa mudança apareceram nos depoimentos muito mais como tópicos de agenda do que em experiências vivenciadas, no sentido de uma consolidação. Em outras palavras, temas como pré-natal masculino, acolhimento, sexualidade e ambiência foram mencionados, mas nas observações ainda foram identificadas lacunas que estão ligadas aos preconceitos e às deficiências da formação profissional. Mesmo assim, é importante destacar que o desejo de mudança pode ser o primeiro passo para que as práticas se tornem diferentes dos modelos tradicionais de pensar a saúde do homem.

De que forma os resultados proporcionados pela pesquisa poderão subsidiar as ações das coordenações estaduais e municipais dedicadas à saúde do homem?
A pesquisa trouxe um vasto acervo de informações que podem subsidiar essas ações, tanto em termos de planejamento quanto no que se refere a desenvolvimento de estratégias voltadas para a atenção a essa população. Em termos objetivos, junto a esse acervo, a pesquisa formatou princípios para os cuidados masculinos voltados para a saúde sexual, a reprodução e a paternidade, bem como apresentou um fluxo para o envolvimento de homens no pré-natal. Essas propostas, baseadas na literatura e nos dados da pesquisa, foram validadas por especialistas brasileiros no assunto. Esse é um legado que pode servir de ponto de partida para que as coordenações estaduais e municipais possam repensar suas ações relacionadas à atenção à saúde do homem.

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