Uma análise ecológica de base populacional utilizando dados obtidos no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), do Ministério da Saúde, foi realizada com o objetivo de identificar um perfil epidemiológico da transmissão da doença de Chagas aguda, no Brasil. A doença de Chagas é causada pelo parasito Trypanosoma cruzi, transmitido por um inseto conhecido como barbeiro e está presente em 21 países da América Latina. A enfermidade, que atinge coração e órgãos do sistema digestivo, tem duas fases: aguda, que é logo após a infecção e pode durar até quatro meses; e crônica, fase após a aguda e de longa duração. No Brasil, apenas os casos agudos são obrigatoriamente notificados ao Sinan.
O estudo analisou as características epidemiológicas e tendências espaço-temporais das notificações, incluindo todos os casos de doença de Chagas aguda notificados entre 2001 e 2018 (5.184 casos). O trabalho coordenado pelo pesquisador da Fiocruz Bahia, Fred Luciano Neves Santos, foi descrito em artigo publicado no periódico PLOS Neglected Tropical Diseases [1]. Os achados podem contribuir para ações de vigilância voltadas à prevenção de novos casos da enfermidade.
Os autores da pesquisa afirmaram que a distribuição espaço-temporal da doença nesse período foi heterogênea no país. Também relataram que a taxa de incidência anual foi de 0,16 por 100 mil habitantes e identificaram um rápido aumento de notificações antes de 2005, uma queda estável de 2005 a 2009, seguida por aumento após 2009. As frequências mais altas de infecção foram observadas em crianças, adolescentes e idosos na região Norte, em todo período observado, e nas mulheres e em indivíduos de 20 a 64 anos no Nordeste, entre 2001 e 2009.
A transmissão vetorial foi a principal via relatada até 2005, enquanto a transmissão oral aumentou significativamente no Norte durante os outros períodos. O estudo também apontou que o estado do Pará é responsável por 81% dos casos decorrentes de transmissão oral na região Norte, com maiores proporções de casos ocorrendo após a safra de açaí e bacaba, com o consumo de alimentos derivados dessas frutas contaminadas pelas fezes do inseto.
Com esses resultados, os autores concluíram que, embora tenha diminuído a ocorrência da doença de Chagas em todo Brasil, a enfermidade continua sendo uma ameaça à saúde pública, evidenciada pela ocorrência de casos agudos em mais de 50% das microrregiões brasileiras. Também ressaltaram a necessidade de ações entomológicas e a adoção de medidas higiênico-sanitárias para reduzir a transmissão oral. Notificar casos crônicos no Brasil, inclusive em bancos de sangue, deve ser uma medida a ser fortemente considerada, de acordo com os cientistas.
Leia o estudo na íntegra [2].