Sistemas de Saúde e Enfermagem: contexto nacional e internacional é o tema da revista Ciência & Saúde Coletiva de janeiro de 2020. As pesquisadoras da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), Maria Helena Machado e Mônica Carvalho de Mesquita Werner Wermelinger, entre outros pesquisadores, assinam o editorial da edição. O destaque dos artigos são os desafios e a importância da profissão no SUS, formação e gestão da educação, mercado de trabalho e relações de trabalho, sistemas de saúde e práticas da enfermagem no mundo.
Os autores do editorial consideram que a acelerada evolução no mundo do trabalho presenciou, ao final do século XX, o nascer de uma nova ordem, traduzida em rápidas e constantes mudanças na sociedade e no trabalho, a adoção de diferentes práticas de produção, comercialização e consumo de bens e serviços, maior competição e interdependência entre os sujeitos, instituições e nações. “Tais mudanças, influenciaram os sistemas de saúde e as profissões pelo determinismo tecnológico e a aquisição de novas práticas e saberes demandadas pelo mercado de trabalho, sobretudo, pela inversão epidemiológica e da pirâmide etária.”
Segundo os autores, no campo das relações de trabalho ocorrem severas repercussões no ofício das profissões: mudam a estrutura de poder, das instituições e se instala um novo modus operandis. Nesse contexto, afirmam que a saúde e seus trabalhadores vêm experimentando transformações no seu arquétipo. “Além dos ajustes oriundos das mudanças tecnológicas, esse cenário tem provocado mudanças na definição do que seja uma profissão e sua utilidade social”. A enfermagem como profissão nuclear da saúde tem vivenciado esse fenômeno no cotidiano do trabalho, impondo mudanças no seu arquétipo e no construto sociológico de sua essencialidade na prestação da assistência e do cuidado à população.
Para os pesquisadores, o Brasil, com um sistema de saúde baseado nos princípios da universalidade, da integralidade e da equidade, busca fortalecer e garantir o acesso da população às ações e serviços de saúde. Este cenário de transformações sociais, econômicas, políticas, geográficas e culturais, em que as profissões se fortalecem ou deixam transparecer suas fragilidades, reforça a relevância e o caráter estratégico de pesquisas que visem identificar e acompanhar os processos sociológicos gestados no seu interior.
Nesse complexo panorama sócio-político-econômico, a Fiocruz, em parceria com o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), realizou a pesquisa Perfil da Enfermagem no Brasil. O estudo teve por objetivo analisar e construir o seu perfil, visando conhecer sua dinâmica, condições de trabalho, emprego e formação, desde seus aspectos econômicos, sociais, até os aspectos éticos e políticos da corporação. De acordo com os pesquisadores, os resultados comprovam, por exemplo, forte desgaste dos trabalhadores, adoecimento, baixos salários e saturação do mercado de trabalho.
No artigo Sistema de Saúde e Trabalho: desafios para a enfermagem no Brasil [1], os autores debatem a importância da profissão para o Sistema Único de Saúde, considerando que ela está presente em todas as estruturas organizacionais de saúde, nas 27 unidades da Federação e em todos os municípios do país, essencial, portanto, para a prestação de uma assistência de qualidade. Apesar disso, a profissão enfrenta muitos desafios, quer no campo da formação e do mercado de trabalho, que necessitam ser enfrentados, visando a valorização desses profissionais que apesar de todas as dificuldades a que estão submetidos, são comprometidos com a saúde da população brasileira.
Mapeando a formação do enfermeiro no Brasil: desafios para atuação em cenários complexos e globalizados [2] é um artigo que discorre sobre a formação profissional, implicações da expansão das instituições de ensino superior e a distribuição dessas no Brasil. Considera os resultados da pesquisa Perfil da Enfermagem no Brasil, realizada com 35.916 profissionais em 2013. A análise que caracteriza a trajetória da graduação em enfermagem neste artigo estrutura-se em três dimensões: a expansão da formação do enfermeiro na graduação e pós-graduação; o boom de escolas de enfermagem e a relação público x privado; e a distribuição territorial do profissional. O crescimento de instituições de ensino em enfermagem implica em uma formação exponencial, com predomínio de escolas privadas na graduação e na pós-graduação. Os cursos buscam alinhar-se às mudanças na saúde e sociedade, mas urge equalizar as assimetrias territoriais entre as instituições formadoras na graduação e pós-graduação, a superconcentração e vazios assistenciais decorrentes da insuficiência de enfermeiros por habitantes, bem como qualificar o enfermeiro para o exercício profissional ante as transformações globais.
A formação do técnico em enfermagem: perfil de qualificação [3], artigo que explora três aspectos relevantes da formação profissional a partir dos resultados encontrados na pesquisa Perfil da Enfermagem no Brasil: o nível de escolaridade/qualificação; a distribuição geográfica e a participação governamental na consolidação do quadro atual. Trata-se de um estudo analítico baseado na interpretação de indicadores definidos pelo Coeficiente de Assimetria de Pearson. O estudo utiliza o banco de dados gerado pela pesquisa, além de dados do MEC/Inep e do IBGE. Os resultados alcançados estabelecem relações entre as características de formação, distribuição de A&TE em todos os estados brasileiros com o fenômeno da superqualificação, além de evidenciar um aparente descolamento da rede federal de educação com a real demanda por técnicos de enfermagem no país.
Em Mercado de trabalho e processos regulatórios – a Enfermagem no Brasil [4], os autores fazem uma análise do mercado de trabalho dos profissionais partir dos dados obtidos através da pesquisa Perfil da Enfermagem no Brasi, evidenciando que uma parcela significativa desses trabalhadores, a maioria auxiliares e técnicos de enfermagem, vivem em condições precárias de sobrevivência, com precarização, multiempregos e a insegurança no ambiente de trabalho cada vez mais frequentes, o que os impede de exercerem com dignidade suas atividades laborais. Analisa também o processo de regulação da enfermagem, tendo como referencial a sociologia das profissões a partir da criação do Sistema Conselho Federal/Conselhos Regionais de Enfermagem na década de 1970, quando a categoria passou a ter autonomia da autorregulação, sendo que na atualidade, a profissão demonstra possuir um marco legal robusto e altamente regulador, considerando o quantitativo de resoluções emitidas pelo Cofen que impactam o exercício profissional. O artigo aponta como sendo essencial que o Estado desenvolva e aprimore as políticas de gestão do trabalho e de regulação, de modo a contribuir para a superação dos problemas enfrentados pela Enfermagem.
O artigo Ética organizacional em ambientes de saúde [5] teve como objetivo reforçar a importância da ética organizacional para as organizações de saúde. Como primeiro passo, distingue-se a ética organizacional de outras áreas da ética aplicada as quais são mobilizadas por questões éticas relacionadas à saúde. Em seguida, são apresentados os objetos de estudo e de intervenção que a caracterizam. Finalmente, o artigo enfoca alguns elementos centrais de uma abordagem ética organizacional particularmente rica e relevante.
Acesse a edição! [6]