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Desafios e perspectivas para o SUS em Doença de Chagas

Foto da equipe que participou do encontro Fio-Chagas nas escadas do Palácio Itaboraí

30/05/2018

Kath Lousada | VPPCB

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15º Encontro Fio-Chagas aprofunda o debate sobre o controle e agravos da doença

Em 1909, Carlos Chagas descreveu o ciclo completo da tripanosomíase americana, feito ímpar na história da medicina. A Doença de Chagas, como ficou conhecida, despertou a atenção do pesquisador enquanto em missão no combate à malária no norte de Minas Gerais. Passados mais de um século do mapeamento da doença e do início às medidas de vigilância e controle da enfermidade, dados recentes da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que, atualmente, são estimados entre 6 e 7 milhões de pessoas afetadas pela doença de Chagas no mundo, somente no Brasil, o número de pessoas infectadas pelo protozoário Trypanosoma cruzi chega a 2 milhões.

Considerada uma doença negligenciada pela OMS, sua principal forma de transmissão ocorre por via vetorial, por meio do inseto popularmente conhecido como barbeiro ou bicudo que suga o sangue enquanto defeca na pele. Outras formas de transmissão são a de mãe-filho, se a mulher tiver a doença; por transfusão de sangue ou transplante de órgãos infectados; e pela ingestão de alimentos infectados com as fezes do inseto. A transmissão oral da doença tem sido evidenciada nos últimos 15 anos no Brasil especialmente na região da Amazônia Legal (Amazonas, Pará, Acre, Amapá, Roraima, Rondônia, Tocantins, e parte dos Estados do Maranhão (Nordeste) e Mato Grosso (Centro-Oeste).

Frente a este cenário de desafios para a saúde pública, somada às perspectivas para o alcance da meta de controle de doenças tropicais da Agenda 2030 e dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, o XV Encontro do Programa de Pesquisa Translacional em doença de Chagas (Fio-Chagas) reuniu representantes dos laboratórios das unidades Fiocruz - com pesquisa nesta temática e participantes da rede - para debaterem questões pertinentes à doença na atualidade ao longo de três dias (16 a 18/5) no Palácio Itaboraí, em Petrópolis (RJ). 

Como objetivo, a composição de iniciativas que integrem equipes de diferentes instituições, unidade e laboratórios, nas áreas biomédica, clínica, desenvolvimento tecnológico e saúde coletiva,  para o desenvolvimento de propostas voltadas para as necessidades do Sistema Único de Saúde (SUS), em especial às questões críticas para o alcance do controle de doenças e agravos em doença Chagas.  

A abertura do encontro contou a presença da presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima, que destacou o trabalho de referência realizado na instituição e, para além da questão histórica, a contribuição em vários campos do conhecimento. “O trabalho de saúde pública em Doença de Chagas sintetiza muito bem a multiplicidade de perspectivas, e mais do que isso, a necessária complementariedade. É uma pesquisa voltada à resolução de um problema de saúde, cuja descoberta foi possível, porque o campo da ciência e saúde no Brasil nunca foi restrito ao laboratório, ele sempre se articulou com questões ambientais, trabalho de campo e pesquisa clínica.” 


Abertura do encontro contou a presença da presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima (Foto: VPPCB)

Por videoconferência, Pedro Albajar-Viñas representando a OMS (Innovative & Intensified Disease Management Control of Neglected Tropical Diseases) disse que a Fiocruz “é uma instituição única no mundo pela sua diversidade. E é única, também, pelas extraordinárias possibilidades que ela oferece a quem nela trabalha e a quem com ela trabalha. A iniciativa Fio-Chagas tem sempre um potencial extraordinário de convocar para o encontro a comunicação, o diálogo, a consecução de consensos sobre caminhos a serem andados num questionamento onde a cooperação será a última palavra em contraposição a competições estéreis.”

Como exemplo de afirmação da agenda propositiva da Fio-Chagas, Albajar disse que se questionado sobre qual o maior desafio atual para a conquista dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, a resposta seria detecção e diagnósticos dos casos, que, segundo ele são “muitas vezes silenciosos e tantas vezes silenciados”. Também considerou uma tônica do encontro a abordagem “biomédica e psicossocial por igual, dialogando para desenhar, desenvolver e implementar projetos, ações, para quebrar barreiras de acesso, para informar, educar e comunicar.” 

Pauta e ações de trabalho Fio-Chagas 2018

De acordo com os coordenadores da rede Fio-Chagas, Andréa Silvestre de Sousa (Instituto de Infectologia Evando Chagas),  Ângela Junqueira e Otacílio da Cruz Moreira (ambos do Instituto Oswaldo Cruz), ao longo da programação do XV Encontro Fio-Chagas foram discutidos diversos assuntos da atualidade, como a mobilidade urbana na América Latina, responsável por uma crescente demanda de ações de vigilância clínica e epidemiológica entre a população de refugiados, os quais vivem em iguais condições de risco e vulnerabilidade social. 

“O modelo exitoso de acolhimento aos bolivianos em São Paulo foi apresentado pela Prof. Maria Aparecida Shikanai Yasuda, da Universidade de São Paulo (USP), seguido de uma discussão de cidadania e necessidade de novas ações diante da crise humanitária da Venezuela, o que impulsionou o desenvolvimento de futuros projetos semelhantes de apoio a esses migrantes, com participação de pesquisadores da Fiocruz.”

O grupo aprofundou ainda o debate da doença de Chagas aguda com o relato da experiência de profissionais que atuam na Amazônia brasileira. Também foi apresentado o projeto de ensino e pesquisa elaborado por pesquisadores do Fio-Chagas, com apoio das Vice-Presidências de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde (VPAAPS) e de Pesquisa e Coleções Biológicas (VPPCB), que visa fortalecer a atuação dos profissionais locais, com treinamentos de protocolos nacionais de vigilância e assistência, segundo os pressupostos do II Consenso Brasileiro de doença de Chagas. 

Ao discutirem sobre os sistemas de notificação e vigilância da doença de Chagas atualmente vigentes, foram pontuadas as limitações existentes entre as bases de dados que atuam na vigilância da população humana, sendo ratificada a necessidade da implementação da notificação dos casos crônicos da doença de Chagas, pleiteada desde o último encontro Fio-Chagas, e acolhida de forma efetiva pelos representantes do Ministério da Saúde presentes em 2018. Além disso, foi firmado um compromisso entre Ministério da Saúde e pesquisadores da Fiocruz, com apoio da VPPCB, a fim de reativar o sistema de informação em saúde voltado para a vigilância entomológica, fundamental para o controle da transmissão de novos casos da doença.

Por fim, foram reiteradas as necessidades de criação e organização das redes de referência entre os pesquisadores do Fio-Chagas, com apoio da VPPCB, além da maior participação efetiva das regionais ao longo da estruturação dos futuros programas do Fio-Chagas. 

O Fio-Chagas integra o Programa de Pesquisa Translacional da Vice-Presidência de Pesquisa e Coleções Biológicas. A coordenação das atividades da rede em doença de Chagas é realizada por profissionais de expertises diferentes, resultando em uma linha de ação com visão holística e sistêmica, que integra a pesquisa básica, a assistência, o trabalho de campo e o ensino.   
 

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