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Doenças raras ainda representam desafio para saúde pública


02/03/2015

Por: Isabela Pimentel (Bio-Manguinhos/Fiocruz)

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No dia 28 de fevereiro, é relembrado o Dia Mundial de Doenças Raras, para alertar a população sobre a incidência destas enfermidades e as dificuldades que seus portadores enfrentam no cotidiano. De acordo com dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), cerca de 400 milhões de pessoas no mundo sofrem com doenças raras (DR). O desafio torna-se ainda maior considerando que 95% delas não possuem tratamento específico e dependem de uma rede de cuidados paliativos bem estruturada, que assegure uma melhor qualidade de vida aos pacientes atendidos. Mas, a questão reside também no significado do termo, não havendo unanimidade em torno do conceito “doença rara”.

A maioria dos especialistas afirma que DR é aquela que afeta apenas uma pequena parcela da população. Por outro lado, algumas já se tornaram mais incidentes e o termo “rara” passou a ser questionado.

Analisando os conceitos adotados em diversos países, é possível situar as doenças raras na faixa das que possuem prevalência máxima variável de 0,5 a 7 por 10.000 habitantes. Apesar da denominação geral, algumas doenças podem ser consideradas “menos” raras em uma população do que na outra, como por exemplo a mucoviscidose, mais frequente nas populações caucasianas, explica a professora titular do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), Magda Carneiro Sampaio. “Por outro lado, a doença falciforme (também conhecida como anemia falciforme) não é uma doença rara na nossa população, porque é mais comum em descendentes de africanos como somos a maior parte dos brasileiros”, pondera.

 De acordo com Sampaio, as distrofias musculares, hemofilias, neurofibromatose, angioedema hereditário, erros Inatos do metabolismo e imunodeficiências primárias já configuram como doenças nem tão “raras” no Brasil.

Histórico

Até o início dos anos 80, havia poucas iniciativas no sentido de encarar as doenças raras como uma questão de saúde pública. Graças à atuação das organizações de pacientes e movimentos sociais, alguns avanços podem ser citados, como a criação, em janeiro de 2014, da Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).

De acordo com médica geneticista e coordenadora clínica do Centro de Genética Médica do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF), Dafne Horovitz, existem mais de 7 mil doenças raras, sendo que 80% delas são de origem genética: as demais podem ser ocasionadas por infecções bacterianas, virais ou causas degenerativas.

Elas afetam, sobretudo, crianças de 0 a 5 anos, contribuindo para a morbimortalidade nos primeiros 18 anos de vida. “Lidamos com estas doenças no dia-a-dia. Algumas já são tão frequentes que não mais podem ser consideradas raras, como a Síndrome de Down”, pondera.

 A especialista explica que para ser considerada rara, uma doença deve atingir 1,3 pessoas a cada duas mil.  De acordo com dados da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma), há 13 milhões de pessoas com doenças raras no Brasil.

 A geneticista do IFF conta que as discussões a respeito do tema se fortaleceram em 2012, quando foi criado um Grupo de Trabalho (GT) para elaborar a Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com doenças raras, envolvendo técnicos que trabalham com doenças raras, usuários do SUS, profissionais do Ministério da Saúde e da Coordenação  Geral de Média e Alta Complexidade (CGMAC). “Esta portaria tem importância estratégica ao reconhecer os pacientes com doenças raras com um grupo importante, prevendo atenção integral e instituindo a necessidade da presença de um geneticista nos centros que tratam estas enfermidades, além do aconeselhamento genético”, acrescenta.

 Avanços e perspectivas

Madga Sampaio destaca que os grandes progressos da genética molecular têm permitido a identificação das mutações gênicas que causam muitas dessas enfermidades. “Com isso, o aconselhamento genético, fundamental para a prevenção do aparecimento de novos casos, pode ser feito de forma mais segura”, afirma.

A professora, que também é presidente do Conselho Diretor do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC FMUSP), aponta que, em determinadas doenças, a identificação de portadores de mutações pode ser importante.

 Por outro lado, em algumas doenças, o avanço da genética já tem permitido a terapia gênica, na qual se insere o gene "sadio" no DNA do paciente portador de determinadas mutações, em especial quando se trata de doenças ligadas ao cromossoma X. “Algumas imunodeficiências primárias constituem exemplo de boas perspectivas de terapia gênica, com resultados bem sucedidos para algumas formas de imunodeficiência combinada grave”, conclui.

 O diagnóstico precoce e preciso, a qualificação de profissionais, a existência de infraestrutura adequada e o acesso garantido a medicamentos e tratamentos seguros são alguns dos caminhos que podem contribuir para a melhoria da qualidade de vida dos pacientes com doenças que, em alguns casos, não são mais tão raras e demandam políticas específicas de atenção, prevenção e promoção da saúde.

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